É incompreensível e inaceitável a letargia com que olham a Educação de Adultos.
Nestes últimos anos, a escolarização dos adultos apresenta um panorama de irregularidades com altos e baixos. Descurada, desprezada e negligenciada pelos nossos políticos, os quais focalizados nas questões iminentes da escolarização obrigatória descuram as oportunidades que se impõem para aqueles que deixaram de prosseguir estudos por circunstâncias da vida, ou por não terem agarrado a oportunidade surgida no seu tempo. Contudo, muitos adultos com baixa escolaridade almejam voltar aos bancos da escola para aprender a ler e a escrever com vista a adquirir mais conhecimentos e competências, úteis à vida.
Os números divulgados na base de dados da PORDATA evidenciam um quadro consternador, pois se o analfabetismo diminui substancialmente entre 1970 (25,7%) e 2011 (5,2%), presentemente Portugal permanece em último lugar da tabela a nível europeu. Face ao exposto, cabe à tutela, através de um trabalho árduo e profícuo, implementar estratégias em vista de diminuir esta realidade. É de salientar que nestes últimos seis anos não funcionaram cursos certificados de alfabetização para adultos, daí que este quadro se mantenha sensivelmente idêntico.
A mesma fonte informa que 23,8% da população portuguesa com 15 ou mais anos concluiu apenas o 1.º Ciclo, 11,2% o 2.º Ciclo e 20,5% o 3.º Ciclo. Este último valor, a par da percentagem de indivíduos com o ensino secundário e pós-secundário ou ensino superior, evidencia um aumento, o que em si é positivo. Todavia, este processo ascensional só terá garantias de continuidade se for suportado por uma plataforma de medidas permanentes e estáveis, facilitadoras dessa meta.
Talvez preocupado com os valores acima apresentados e sob o lema “Aprender Compensa”, o XVIII governo constitucional criou os centros novas oportunidades (CNO), extintos em março de 2013, tendo dado lugar aos centros para a qualificação e o ensino profissional (CQEP) “na construção de pontes entre os mundos da educação, da formação e do emprego, numa perspetiva de aprendizagem ao longo da vida”, tutelado pelo Ministério da Educação, Ministério da Economia e do Emprego e Ministério da Solidariedade e da Segurança Social. Os objetivos dos 2 programas são idênticos, embora os CQEP admitam jovens com mais de 15 anos de idade, para além, obviamente, de adultos.
Os CNO foram abertos a inúmeras entidades que aplicaram a legislação de forma diferente, muitas vezes com interpretações distintas, de acordo com a proveniência do ministério em causa e mesmo dentro de cada um dos ministérios. Esta desarticulação tripartida conduziu igualmente a uma ausência de harmonia entre as entidades que estavam no terreno, originando relativa descredibilização, sobretudo quando o programa era acusado, quantas vezes injustamente, de facilitismo, dada a “rapidez” com que era concluído.
O sucessor dos CNO, os CQEP, começaram a funcionar plenamente (?) no ano letivo de 2013/14. No entanto, a Educação de Adultos, drasticamente reduzida, muito por culpa da falta de financiamento (fundos comunitários…) impediu a afetação de recursos físicos e humanos para o seu normal funcionamento, tendo sido por isso relativamente escassa a respetiva formação. Qual a vantagem da (aparente) mudança? Era imprescindível?
Contudo, é incompreensível e inaceitável a letargia com que olham a Educação de Adultos, mau grado o trabalho meritório exercido nesta área por escassas instituições, mas sobretudo pelas academias seniores, grandemente negligenciadas.
É incompreensível quando o quadro comunitário 2020 (2014-2020) privilegia o “investimento no capital humano” e o Programa Operacional Capital Humano “mobiliza o Objetivo Temático 10, Investir na educação, na formação e na formação profissional para a aquisição de competências e a aprendizagem ao longo da vida.” Este objetivo temático estrutura-se em 4 grandes eixos, do qual pretendo só enunciar 2: “o Eixo 1, Promoção do sucesso educativo, do combate ao abandono escolar e reforço da qualificação dos jovens para a empregabilidade”, e “o Eixo 3, Aprendizagem, qualificação ao longo da vida e reforço da empregabilidade.”
Trata-se de um investimento válido, proveitoso e proficiente. Existem fundos comunitários como tal, conclui-se que impera falta de interesse e vontade para reduzir os números que nos envergonham. Acredito que o Ministério da Educação não irá desprezar este problema, implementando rapidamente medidas que ajudem a ultrapassá-lo. Urge pôr mãos à obra!
As escolas públicas e as instituições (educativas) financiadas pelo Estado têm a responsabilidade de contribuir para dar resposta a estas pessoas mais velhas, doutores da vida, mas que não sabem ler nem escrever, ou possuem escolarização baixa (os seus percursos escolares foram curtos ou intermitentes) e pretendem elevá-la.
Por: Filinto Lima
Professor/director
In: Público
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