quinta-feira, 31 de julho de 2014

EDUCAÇÃO INCLUSIVA EM MODO DUPLA MENSAGEM


Não conhecendo esta notícia com profundidade e com o necessário contraditório uso-a com prudência mas, apesar disso, como mais um provável exemplo de um sistema educativo, que tende a funcionar em modo "dupla mensagem". Vou tentar clarificar.

Boa parte das peças normativas e de orientação em matéria de educação emanadas pela 5 de Outubro, bem como muitos discursos dos responsáveis a diferentes níveis, contêm referências abundantes e explícitas à educação inclusiva e à equidade de oportunidades no âmbito da educação escolar. Essas referências enxameiam os preâmbulos e justificações para orientações e decisões. Esta é a primeira das duas mensagens e radica no facto de Portugal estar vinculado pelas leis que produziu e pelas Convenções internacionais que subscreveu e num discurso "politicamente correcto" que "manda" defender a educação inclusiva.

A questão é que existe uma outra mensagem, o reverso da medalha, por assim dizer.

De facto, também abundam os exemplos noutro sentido, vejamos alguns ao correr da lembrança.

Os constrangimentos em matéria de docentes, técnicos especializados e pessoal auxiliar que impossibilitam a resposta adequada e em tempo oportuno a todos os alunos com necessidades especiais. Em nome da educação inclusiva, evidentemente.

A Portaria que regula o cumprimento da escolaridade obrigatória até aos 18 anos para os alunos com necessidades especiais e que, de forma incompreensível e inaceitável, estabelece que estes alunos "apenas" devem frequentar as escolas regulares num mínimo de 5 horas semanais. Em nome da educação inclusiva, evidentemente.

A forma como em matéria de exames muitos alunos com necessidades especiais têm sido "normalizados" desrespeitando as suas necessidades individuais. Em nome da educação inclusiva, evidentemente.

O entrave à frequência que algumas escolas colocam ou, outra variante, a sugestão feita às famílias para que tenham as crianças com necessidades especiais mais tempo em casa pois na escola não existem condições. Este tipo de procedimento radica, provavelmente, nas condições das escolas mas também na sua cultura. Em nome da educação inclusiva, evidentemente.

A definição de respostas para grupos particulares de necessidades que, em algumas circunstâncias, funcionam de forma tão "guetizada" que os alunos que as frequentam nem sequer aos intervalos contactam com os seus colegas de escola. Em nome da educação inclusiva, evidentemente.

A estruturação de um sistema educativo assente num ensino que já não é educação mas cada vez mais a "passagem" de competências instrumentais nas áreas disciplinares verdadeiramente importantes. A aquisição destas competências é certificada através de uma enxurrada de exames que vão excluindo os menos dotados, os preguiçosos, os que não querem aprender. O grupo resultante deste processo darwinista e de acordo com as suas capacidades será encaminhado para a aprendizagem nas empresas (chamam-lhe ensino dual), para formação de segunda ou, os menos dotados, para instituições. Em nome da educação inclusiva, evidentemente.

Funciona, portanto, assim a mensagem dupla em matéria de educação inclusiva produzida pelo MEC, e não só. Sempre me lembro o Mestre Almada que na extraordinária "Cena do Ódio" falava sobre "a Pátria onde Camões morreu de fome e onde todos enchem a barriga de Camões". 

Tantos discursos, normas e orientações em defesa da educação inclusiva e tantas crianças e jovens que ....

Texto de Zé Morgado

Ecrãs adaptam imagens para pessoas com dificuldades visuais

Investigadores da Universidade de Berkeley estão a criar um sistema que permite alterar o tamanho das imagens do monitor de um tablet ou computador, de forma a facilitar a vida às pessoas com problemas de visão, conta o Daily Mail.

Os ecrãs inteligentes vão passar a adaptar-se, em breve, de forma automática para as pessoas com dificuldades em ver ao perto. Desta forma, estas pessoas deixarão de ter de usar óculos enquanto utilizam um tablet ou estão ao computador no trabalho, referem investigadores da Universidade de Berkeley.

Este sistema utiliza um algoritmo que consegue alterar a imagem automaticamente consoante a necessidade do leitor.

“Vivemos num mundo onde os ecrãs estão presentes em todo o lado e ser capaz de interagir com os monitores é um dado adquirido. No entanto, as pessoas com desordens visuais mais graves possuem irregularidades na forma da córnea, e essa irregularidade faz com que seja muito difícil encontrarem uma lente de contacto que lhes encaixe, obrigando-as a usar óculos sempre que precisam de utilizar um computador”, explica um dos responsáveis pelo projeto, Brian Barsky.

A invenção consiste numa tela de ampliação de imagem que é colocada entre duas camadas de plástico transparente no visor, para aumentar a nitidez das imagens. Para qualquer outro leitor, as imagens aparecem desfocadas.

Para os investigadores, a invenção será capaz de mudar a vida destas pessoas, motive pelo qual se sentem apaixonados pelo seu potencial.

Menino carrega irmão deficiente em prova de triatlo

Um menino de oito anos realizou uma prova de triatlo com o irmão, que padece da doença de lisencefalia, que lhe impede de andar, falar, sentar e comer sozinho. Lucas empurrou o irmão ao longo de todo o percurso e, no final, confessou que não vê o irmão como uma pessoa diferente, diz o The Independent.

Lucas, um menino de seis anos, sofre de uma rara doença neurológica chamada lisencefalia que lhe afeta as suas capacidades motoras, o que significa que não se consegue sentar, andar, falar ou comer sem a ajuda de terceiros.

Isto nunca foi, no entanto, um entrave para o seu irmão que sempre achou que ambos poderiam brincar e divertir-se juntos, apesar das fragilidades do irmão.

E isso ficou provado num triatlo organizado em Idaho, nos Estados Unidos, no qual a criança de oito anos decidiu inscrever-se, juntamente com o irmão, como uma equipa.

Durante o percurso, Noah empurrou o irmão mais novo em todas as atividades de modo a que juntos conseguissem cortar a meta final. Os dois treinaram durante três meses para participar na prova, tendo Noah puxado o irmão num barco de plástico durante 200 metros na prova de natação, pedalado com o irmão como pendura durante mais 200 metros, puxando-o ainda durante o percurso de corrida. Ao todo, demoraram 54 minutos a completar a prova.

A mão confessou, no final, que a ligação entre ambos é muito especial.

“Foi um pouco stressante assistir à prova. Mas estamos muito orgulhosos. Como pais foi algo incrível de presenciar. No final, penso que o Lucas percebeu que fez parte de algo que era realmente importante”, disse.

Já o menino prova que não vê qualquer diferença no irmão. “Gosto de tudo nele. Ele é perfeito”, afirmou.

Escola recusa aluna disléxica

Segundo a lei os estudantes com necessidades educativas especiais têm prioridade. Escola tentou colocar aluna noutros estabelecimentos de ensino 

Notícia exclusiva da edição em papel

quarta-feira, 30 de julho de 2014

Deficiência mental: E quando crescem?

Depois dos 18 anos, é o vazio de apoios do Estado lamentam os pais dos deficientes mentais adultos. Descida ao mundo de quem vive atormentado com o dia em que não poderá mais ajudar os filhos

'Ó mãe, o que é ser deficiente?" A pergunta chegou um dia e Ana sentiu que lhe tiravam o tapete debaixo dos pés. Ali estava o seu filho, um miúdo ainda, a fazer-lhe a terrível pergunta. Ficou sem palavras. Mas não foi a única vez. As histórias vêm-lhe à memória, umas atrás das outras, e Ana conta-as de forma quase ininterrupta. "Outro dia, ao fim da tarde, parados no trânsito, perguntou-me: 'Ó mãe, onde mora o Sol?' Enquanto pensava no que responder, ele antecipou-se: 'Já sei, mora no pôr!'"

A vida de Ana Martins, 50 anos, e Pedro Ladeira, 24, é cheia de momentos destes e, se é verdade que hoje já se fala de autistas como não se falava antes, é também certo que é sempre dos pequeninos. "Dos crescidos, não. E eles crescem", sublinha, como início de conversa. Sempre que saem à rua, acabam por dar nas vistas. "Uma vez, tínhamos ido a um supermercado, eu trazia os sacos e ele vinha atrás. De repente, oiço um burburinho e quando me viro, apercebo-me de que tinha cuspido no vidro de um carro, com o senhor lá dentro. Na altura o Pedro tinha uns 16, 17 anos e eu desfiz-me em desculpas. Era um carro igual ao de uma professora de quem ele não gostava muito."

Pedro viveu com a mãe até aos 18 anos, enquanto teve direito a estar na escola. "No fim da escolaridade obrigatória, fiquei presa em casa", recorda Ana, que acabou por perder o emprego. O pior foi o filho ter-se tornado agressivo, pouco depois dos 16 anos, quando percebeu que nunca conseguiria tirar a carta, logo ele que é doido por carros.

"É um autista atípico, porque alia o défice cognitivo a uma grande inteligência, não entende porque não consegue fazer. Passa a vida a repetir que gostava de ser natural, como quem diz, normal", explica a mãe. A agravar a situação, durante os ataques, parte tudo. "Na cabeça dele, sou uma espécie de terceiro braço, o mais funcional. Quando algo corre mal, a culpa é minha, porque não resolvi."

Ana acabou por interná-lo durante os dias de semana, no centro da Associação Portuguesa para as Perturbações do Desenvolvimento e Autismo (APPDA), uma decisão que vinha a amadurecer, enquanto lhe crescia no peito a sensação de que ou morria um ou morria o outro. "Às vezes, atirava-me ao chão e batia com a minha cabeça na pedra. Ou dizia que se atirava pela janela. Ou olhava para mim: 'Não, vou é atirar-te a ti.'" Há mais histórias, muitas mais, todas deste género. "Tirando isso, é um miúdo encantador. Se vê que alguém precisa de ajuda, vai a correr. Só que, a qualquer momento, tudo pode mudar."

A vida complicou-se com o desemprego de Ana, em 2009, e começaram a acumular-se as dívidas à APPDA. Desesperada, por sentir que o filho melhorou muito desde que ali passa os dias de semana, lançou no Facebook, no início de abril, a campanha Vamos Ajudar Pedro e Ana, na qual conta a sua história e pede ajuda para pagar as prestações do centro. Do Estado, não recebe qualquer apoio um drama partilhado por muitas famílias com deficientes adultos a seu cargo.

Reabilitar, não depositar

"É difícil, muito difícil. Mas não podemos baixar os braços", insiste Maria Antónia Machado, 70 anos, mãe de três filhos, o mais velho com Trissomia 21. É também a presidente da CEDEMA Associação de Pais e Amigos dos Deficientes Mentais Adultos, que inaugurou, recentemente, o lar Telhadinho, em Odivelas. O espaço tem capacidade para 34 pessoas, já recebeu 20, há 300 em lista de espera. Maria Antónia confirma a experiência de Ana Martins: "As pessoas dão atenção aos deficientes mentais quando são crianças. Depois, ninguém lhes liga." A sua vocação surgiu com a síndrome do filho mais velho. "Hoje, posso dizer que foi a melhor coisa que me aconteceu." Na cabeça de Maria Antónia, o ideal é que, com técnicos e supervisão, cada um vá construindo a sua autonomia. A filosofia é simples: reabilitar, não depositar. "Isto é a casa deles não é um gueto. Não os queremos a olhar para as paredes." Além da fisioterapia, há uma série de ofi cinas, no centro e fora dele, para que a inclusão na comunidade seja o mais verdadeira possível: as carrinhas saem para os levar às aulas de natação no gimnodesportivo municipal e ao grupo de teatro de uma coletividade das redondezas. No resto do tempo, preparam o Festival dos Sentidos, que decorre, de dois em dois anos, no Centro Cultural da Malaposta, onde expõem os seus trabalhos artísticos.

"Queremos mostrar-lhes que há vida lá fora", continua Maria Antónia, enquanto nos guiapelo espaço, cumprimentando todos pelo nome. O seu filho é uma espécie de case study e a prova de que é possível: aos 47 anos, António Machado está a trabalhar numa tipografia, joga golfe e é atleta do Special Olympics, organização internacional criada para apoiar as pessoas portadoras de deficiências intelectuais, um movimento lançado por Eunice Kennedy, impulsionada pelo caso da irmã, deficiente mental. "Interná-lo? Espero que não seja necessário. O ideal para todos era que lugares como este fossem apenas de passagem."

O lar ainda dá os primeiros passos, mas a intenção está lá e isso vê-se nos sorrisos de Jacinto e Ricardo, a prepararem um espanta-espíritos com material reciclado, ou das gémeas Fernanda e Leonor, em frente dos quadros que pintaram. "Não podemos continuar a olhar para o lado", frisa Maria Antónia Machado. "Até porque 2% da população tem deficiência mental."

Pela autonomia e responsabilidade

Luísa Beltrão, 70 anos, está do mesmo lado da barricada. Quando soube que a filha mais nova tinha deficiência, isso tornou-se uma missão já era mãe de outros seis, todos com o seu projeto de vida. "A minha filha Luísa não, apesar dos seus 34 anos, por causa de um atraso global no desenvolvimento." A mãe arregaçou as mangas e, há dez anos, criou o Quinta Essência, projeto de Reabilitação para a Pessoa com Deficiência, que tem umas belas instalações em Sintra, na ideia de criar condições para que pudessem viver na sua casa e em relação com a comunidade.

A jovem Luísa foi, claro, a primeira a beneficiar do espaço, mas a aposta na autonomia nunca avançou e a fundadora acabou por tirar de lá a filha.

"O problema é que, enquanto continuar assim, estas pessoas não fazem parte do nosso mundo. Por exemplo, não se veem deficientes na rua. As crianças ainda vão à escolas mas os adultos estão fechados.

E eu não queria isso para a minha filha. Sei que vai ser sempre dependente, mas gostava que fosse o mínimo possível: um deficiente não é um doente." Luísa sabe que a legislação prevê que se possa viver na comunidade mas na prática anda-se a marcar passo.

"É tão ridículo como o Estado gastar 600 euros por deficiente se ele estiver internado em instituições mas só lhe atribuir metade dessa verba se quiser ficar em casa", aponta.

Foi a pensar nesse novo modelo que criou a associação Pais em Rede, que já tem 18 núcleos em todo o País, para formar técnicos e pais e dar corpo a essa outra visão do mundo uma prática que também já começou em casa. Desde há dois meses que a filha, com a ajuda de uma psicóloga, apanha dois autocarros e vai trabalhar, dia sim, dia não, numa empresa da área alimentar. De manhã, prepara kits de café. À tarde, distribui o correio. "O que ela evoluiu desde que veio para casa... Já constrói frases, veste-se e toma banho sozinha..." Ao vê-la entrar no autocarro, de manhã, fica bem à vista o que a fundadora da Pais em Rede quer dizer. Ou depois, quando a seguimos no local de trabalho. Teresa Silva, a psicóloga educacional que a acompanha, certifica os seus passos, repetindo-os em voz alta, e elogiando-a, sempre que Luisinha acerta. Será um processo facilitado pelo facto de a empresa ser do irmão, mas a verdade é que já lá estava empregado um outro deficiente mental. Pedro Loureiro, 44 anos, ajuda na desmontagem e lavagem dos kits, há nove anos. Rui Brás, o responsável do armazém, sente-lhe bem a motivação: "Nunca tinha trabalhado com ninguém assim."

Do desenvolvimento e autismo

É toda uma perspetiva ainda muito distante das vidas de Ana e Pedro, mãe e filho agora separados a semana toda, uma vez que o rapaz está internado, e com mais uma angústia, dada a dívida que Ana já tem na APPDA.

Paulo Ferreira, 43 anos, o diretor do centro, compreende bem o drama de famílias assim.

"Perto de 60% dos familiares de autistas deixam de trabalhar, porque precisam de uma atenção constante", assinala.

Ana revê-se bem nestas palavras porque a Ana-mãe sempre se sobrepôs às outras, mal soube que o filho tinha uma anomalia, aos oito meses de gravidez. No caso, uma agenesia do corpo caloso, uma má formação congénita que se caracteriza pela ausência dessa estrutura, que faz a ligação entre os dois hemisférios cerebrais. "Geralmente, são uma espécie de vegetais. No caso do Pedro, revelou-se só num atraso psicomotor e em ataques de epilepsia, que, entretanto, ultrapassou." Separada do pai do filho desde que este tinha onze meses, viveu à sua volta até ele fazer 10 anos. "Foi quando deixei de o tratar como um doente..." Ana conta tudo isto num tom entre o drama e a comédia.

"Costumam dizer que as mães de autistas vivem um stresse semelhante ao dos soldados na guerra. Só que estes, em algum momento acabam por voltar para casa", e o seu olhar, por mais risonho que queira parecer, não consegue esconder a mágoa.

Ana Martins diz que, no início do ano, a Segurança Social reconheceu ter perdido o processo de Pedro, que está sem apoios desde os 18 anos. Apesar de os subsídios que o deficiente adulto pode receber ficarem abaixo dos 300 euros mensais só a mensalidade da APPDA supera essa valor, seriam uma ajuda preciosa. "Até se resolver, continuamos sem direito a nada..."

Por: Teresa Campos (artigo publicado na VISÃO nº1115, de 17 de julho)

In: Visão

Via: Incluso

Outro Iluminado


Bom, se fosse professor talvez fosse mais conhecedor do que fala e não consideraria a classe docente um bando de manipuláveis, pouco inteligentes e irresponsáveis que se comportam desrespeitosamente, deixando-se manipular infantilmente pelos terroristas maquiavélicos e políticos dos dirigentes sindicais.

Assim ... resta-lhe a arrogância da ignorância, meu caro Paulo Barradas.

É verdade que no iluminado pensamento de Paulo Barradas temos, cito, "a agravante da actual criminalizacão dos castigos corporais e outros, outrora tão eficazes, quer na escola quer em casa."

Se não fosse isso poderia ser uma forma de lidar com esses delinquentes, os professores. Que pena.

Trata-se, de facto, de uma peça antológica.

Texto de Zé Morgado

In: Atenta Inquietude

terça-feira, 29 de julho de 2014

O MEC E AS COMISSÕES DE PROTECÇÃO DE CRIANÇAS E JOVENS



Segundo o Relatório da Actividades das Comissões de Protecção de Crianças e Jovens em Risco relativo a 2013, aumentou o número de casos, foram acompanhadas 71.567 crianças, mais 2560 do que em 2012. A exposição a situações de violência doméstica, a negligência e casos relativos ao direito à educação (abandono, absentismo ou insucesso escolar) são as situações com maior incidência. É ainda relevante que os casos de crianças abandonadas ou entregues a si próprias quase duplicaram.

Verificou-se ainda o aumento do número de situações de consumos, álcool e droga, bem como de indisciplina severa.

Merece registo positivo a diminuição de casos envolvendo negligência, abuso sexual, maus-tratos psicológicos, abandono, mendicidade e trabalho infantil.

Em termos globais e como habitualmente refere o Juiz Armando Leandro, presidente da Comissão Nacional de Protecção das Crianças e Jovens em Risco, importa ainda considerar que "nem todos os casos chegam às Comissões de Protecção".

Embora não possa ser estabelecida de forma ligeira nenhuma relação de causa as dificuldades severas que muitas famílias atravessam e a insuficiência de apoios sociais não serão alheias a muitas das situações de risco em que crianças e jovens estão envolvidos pois os estudos mostram que crianças e velhos constituem justamente os grupos mais vulneráveis.

Acresce que as condições de funcionamento as Comissões de Protecção de Crianças e Jovens que procuram fazer um trabalho eficaz estão longe de ser as mais eficazes e operam em circunstâncias difíceis. Na sua grande maioria as Comissões têm responsabilidades sobre um número de situações de risco ou comprovadas que transcendem a sua capacidade de resposta. A parte mais operacional das Comissões, a designada Comissão restrita, tem muitos técnicos a tempo parcial.

Alguns dados do Relatório de 2013, em 305 Comissões em actividade desempenhavam funções 2565 elementos na modalidade alargada, dos quais 2565 na modalidade restrita. O MEC tem nas 305 Comissões 272 professores a tempo inteiro ao abrigo do Protocolo com o Ministério da Solidariedade e Segurança Social. O MEC anunciou hoje que vai manter os docentes nestas funções e nas comissões que acompanhem mais que 1000 situações colocará um segundo docente com a função de mediador.

Como já referimos, o ano passado foram acompanhadas 71 567 crianças e jovens em risco, o número está em crescimento, os casos relativos ao direito à educação são dos que apresentam maior frequência e o MEC mantém para as 305 Comissões os 272 docentes a tempo inteiro colocando mais um docente apenas nas Comissões que lidam com mais de 1000 casos, uma enormidade. Não se entende e não se aceita, sobretudo quando sabemos que existem docentes sem horários lectivos e estão a ser empurrados para fora do sistema. Lamentável.

Tal dificuldade repercute-se, como é óbvio, na eficácia e qualidade do trabalho desenvolvido, independentemente do esforço e empenho dos profissionais que as integram.

Este cenário permite que ocorram situações, frequentemente com contornos dramáticos, envolvendo crianças e jovens que, sendo conhecida a sua condição de vulnerabilidade não tinham, ou não tiveram, o apoio e os procedimentos necessários. Ainda acontece que depois de alguns episódios mais graves se oiça uma expressão que me deixa particularmente incomodado, a criança estava “sinalizada” ou “referenciada” o que foi insuficiente para a adequada intervenção. Em Portugal sinalizamos e referenciamos com relativa facilidade, a grande dificuldade é minimizar ou resolver ou minimizar os problemas das crianças referenciadas ou sinalizadas.

Por isso, sendo importante registar uma aparente menor tolerância da comunidade aos maus tratos aos miúdos, também será fundamental que desenvolva a sua intolerância face à ausência de respostas.

Texto de Zé Morgado

Números-chave do sistema educativo

O ensino público continua a ser a opção para a esmagadora maioria dos alunos, do pré-escolar ao ensino secundário, diz o mais recente relatório do MEC que mostra os principais indicadores do sistema educativo.

O relatório “Estatísticas da Educação 2012/2013” do Ministério da Educação e Ciência (MEC) mostra que do pré-escolar ao ensino secundário 80,7% dos alunos estão matriculados no ensino público. O ensino privado dependente do Estado - financiado em mais de 50% dos seus fundos pela Administração Pública - acolhe 8,9% dos alunos; o ensino privado independente 10,4%. 

A educação pré-escolar apresenta menos diferenças no que toca à percentagem de matriculados nos dois setores, com 53% das crianças a frequentarem o ensino público e 46,1% no privado (30,2% no que depende do Estado e 15,9% no independente). No 1.º ciclo, a diferença é de 88,2% (387 000 alunos num total de 438 699) a frequentar o ensino público; 2,2% no privado dependente do Estado (89 783 alunos) e 9,6% (41 916 alunos) inscritos no privado independente. 

De um modo geral, no ensino básico (1.º, 2.º e 3.º ciclos), 87,9% dos alunos (num universo de 1 068 198) está no ensino público, 4,9% no privado independente e 7,2% no independente. No ensino secundário - onde se incluem os cursos gerais, tecnológicos, ensino artístico, profissionais, de aprendizagem e os CEF - a distribuição faz-se desta forma: 79,4% (num total de 361 832) no público, 5,1% e 15,5% no privado dependente e independente, respetivamente. 

O documento, disponível na página da Internet da Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (www.dgeec.mec.pt), mostra os principais indicadores do sistema educativo português, no que toca ao número de alunos matriculados por níveis de ensino e ao seu aproveitamento, tanto ao nível nacional como regional. Utiliza ainda conceitos semelhantes aos da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE).

Taxas de conclusão homogéneas
Em 2012/2013, 82% dos alunos que frequentavam o ensino básico regular, em Portugal, transitaram de ano. Os dados apresentados remetem apenas para os anos terminais referentes a cada nível de ensino, neste caso, aos 4.º, 6.º e 9.º anos. A nível regional – Norte (83,2%), Centro (84,2%), Lisboa (80,7%), Alentejo (81,1%), Algarve (80,1%), Madeira (83,5%) - não se notam variações significativas nas taxas de conclusão. Apenas a Região Autónoma dos Açores apresenta uma taxa mais baixa, de 72,1%.

Ainda no ensino básico, a taxa de conclusão dos alunos matriculados no ensino artístico especializado – que proporciona formação nas áreas da Dança, Música ou Canto Gregoriano e requer habilitações ao nível do 4.º ano – é de 97,5%; nos cursos profissionais é de 94,4%. No que toca ao ensino secundário, 64,4% dos alunos dos cursos científico-humanísticos gerais concluíram com sucesso o 12.º ano; o mesmo acontecendo com 71,7% dos alunos dos cursos tecnológicos (67% em 2011-2012), 74,5% dos do ensino artístico especializado (74,7% em 2011-2012) e 66,9% dos inscritos nos cursos profissionais (68,8% em 2011-2012). 

Considerando o território nacional, estão inscritos 108 268 alunos no ensino básico regular, 199 no artístico especializado (dos quais 100 na Região Norte, 12 no Centro e 87 em Lisboa) e 126 no profissional (92 no Norte, 27 no Centro e 7 na Madeira). No ensino secundário, 61 916 alunos frequentaram os cursos científico-humanísticos, 3555 os cursos tecnológicos, 807 o ensino artístico e 32.103 os cursos profissionais. 

O ensino privado apresenta taxas de conclusão superiores às do público no ensino básico regular (91,1% contra 81%), nos cursos científico-humanísticos (80,1% contra 62,2%), nos cursos tecnológicos (88,5% contra 66,1%) nos cursos profissionais (72,3% contra 62,7%). O inverso acontece ao nível do ensino artístico, com uma taxa de conclusão de 98,1% no ensino público contra 94,9% no privado, ao nível do básico e de 75,5% contra 56,1%, ao nível do secundário. 

Em termos de diferença entre géneros, tanto no ensino público como no privado as mulheres obtêm melhores resultados do que os homens em quase todas as modalidades de ensino. Exemplo disso é a taxa de conclusão nos cursos profissionais ao nível do secundário: 72,3%, entre as mulheres, contra 55,3% dos homens, no ensino público; 79,4% contra 66,8% no privado. 

Escolas perdem alunos
Os dados recolhidos pelo MEC confirmam que as escolas perderam 13 379 alunos face ao ano letivo de 2011-2012. No comunicado ministerial que acompanha o anúncio deste relatório lê-se que a quebra representa uma “tendência demográfica já conhecida de todos”, que “justifica uma atuação atenta e ágil dos governos em termos de gestão do parque escolar nacional”, como a que tem sido feita nos últimos anos. 

Os dados surgem numa altura em que o MEC se prepara para encerrar mais de 300 escolas públicas primárias em território nacional. Ao nível do ensino básico, a queda do número de alunos atingiu em especial o 1.º ciclo, com menos 12 794 alunos, seguido do 2.º ciclo, com menos 4369 alunos e do 3.º ciclo, com menos 3733 alunos. O mesmo se passa com a educação pré-escolar, que sofreu uma redução de 5881 alunos. 

Apenas o ensino secundário ruma contra esta “tendência”, apresentando um aumento do número de inscritos na ordem dos 13 398 relativamente ao ano letivo anterior. Ou seja, 348 434 alunos em 2011-2012 para 361 832 em 2012/2013, na sua grande maioria a frequentar os cursos científico-humanísticos públicos. No entanto, salienta o MEC, houve uma diminuição de 209 276 para 207 094 alunos nesta modalidade de ensino, acompanhada por um aumento do número de inscritos nos cursos profissionais, de 113 749 para 115 885 alunos, e dos alunos a frequentar os cursos de aprendizagem, de 21 056 para 33 366.

Mais oferta no Superior
Segundo o MEC, “é possível” que o facto de 2012/2013 ser o primeiro ano do alargamento da escolaridade obrigatória tenha contribuído “ainda que em escala reduzida” para o aumento do número de alunos no 12.º ano, o nível terminal de referência do relatório “Estatísticas da Educação 2012/2013”. Mas tal não significa que mais alunos optem por prosseguir estudos a nível superior. Entre os vários níveis de ensino, este é o segundo que mais tem perdido alunos: menos 19 273 inscritos em 2012-2013. Isto quando no ano letivo anterior o número de alunos a frequentar o ensino superior já não ultrapassava os 390 273. 

Talvez por isso, o Ministério aproveita o comunicado onde anuncia o relatório para lembrar que no próximo ano letivo o ensino politécnico vai dispor em exclusivo de uma nova oferta: os Cursos de Técnicos Superiores Profissionais, que vão ter uma duração prevista de dois anos.

“Estes cursos visam responder [à] crescente procura dos jovens por formações mais técnicas e mais rápidas, não deixando contudo de proporcionar um nível de formação superior e a possibilidade de prosseguir estudos numa licenciatura posteriormente”, adianta o MEC, em comunicado, insistindo que “a formação de nível superior continua a ser uma mais-valia em termos de procura de emprego e de remuneração”.

Por: Andreia Lobo

In: Educare

domingo, 20 de julho de 2014

Voltamos à moralidade ou à falta dela

Não é para melhorar as escolas, é para mostrar quem manda. O resultado é que, se houver sarilhos, é porque andaram a pedi-los.

Voltar a falar de moralidade é algo que só faço com imensa relutância. A palavra e a coisa são tão ambíguas e prestam-se a tantas manipulações, que a probabilidade de sair asneira ao usá-la é grande. Por regra, entre o moralismo hipócrita, tão comum no mundo católico apostólico romano, e o cinismo, eu acho que o cinismo faz menos estragos em democracia.

O ponto de vista realista, ou, se se quiser, cínico, pode ser pedagógico em política, quando esta está cheia de falsos moralismos, densa de presunção moral. Já houve alturas em que foi assim e ocasionalmente, nalguns momentos e eventos, é assim. Nessas alturas faz bem lembrar que a natureza humana é como é, e pode-se ser um carácter duvidoso a título pessoal e ser-se um bom político, que sirva a comunidade e o bem comum. Churchill serve de exemplo, ou Lincoln. Parece chocante, mas a moralidade pessoal é um terreno pantanoso em que é mais fácil entrar do que sair e o julgamento da moralidade alheia, quase sempre hipócrita, tem a notável tendência de funcionar comoboomerang. É por isso que só com pinças.

Mas no tempo em que vivemos não é o moralismo o risco, dada a natureza dos nossos governantes que cresceram numa cultura amoral e de “eficácia”. Por isso é preciso o contrário, chamar a moralidade para a praça pública, porque há coisas que são inaceitáveis numa democracia que desejamos minimamente decente. Já não digo sequer decente, mas minimamente decente. E têm a ver com a moral porque atingem a verdade, a recta intenção, o objectivo do bem comum, o respeito pela dignidade das pessoas e são actos de maldade, de mau carácter, muitas vezes disfarçados de espertezas e habilidades.

O exercício desta imoralidade activa na governação impregna toda a vida pública de maus exemplos, de salve-se quem puder, de apatia ou revolta, de depressão ou violência. Torna Portugal um país doente e um país pior, promove os habilidosos sem escrúpulos e afronta os homens comuns, insisto, minimamente decentes, que não querem o mal para ninguém, desde que os deixem sossegados e sem afronta. É isso que provoca a institucionalização do dolo, do engano, a construção de políticas destinadas a tramar portugueses, umas vezes muitos e outras vezes poucos, sem qualquer vergonha por parte dos seus executantes. E aí eu nasço redivivo como um moralista agressivo, e falo cem vezes do mesmo, sem descanso. Não gosto, mas falo.

A história mais recente e que me fez escrever este artigo foi a desfaçatez do truque que o Ministério da Educação usou para marcar os exames aos professores com três dias úteis de pré-aviso, caindo do céu da surpresa no fim de Julho, com grande estrondo. Na verdade, são teoricamente cinco dias, o mínimo exigido por lei, mas só teoricamente. O truque foi pré-assinar um despacho em segredo, no quinto dia divulgá-lo no Diário da República a contar do dia da sua assinatura, para que na prática faltassem, após o anúncio ser conhecido, apenas três dias úteis até ao exame, 17, 18, e 21 de Julho. Professores que já estavam a receber o subsídio de desemprego, que já estavam de férias, e que não sabiam que iam ter um exame para que é suposto prepararem-se, cai-lhes em cima uma data que é já praticamente amanhã. Nem o gado é suposto ser tratado assim, mesmo quando vai para o abate.

Porquê esta rapidez? A resposta é muito simples: para evitar que os sindicatos pudessem apresentar um pré-aviso de greve no prazo exigido pela lei – ou seja, o Governo faz um truque descarado e sem vergonha para contornar uma lei da República, que permite o exercício de um direito.

Pode-se ter o ponto de vista que se quiser sobre os exames exigidos a professores que já tinham as qualificações necessárias para ensinar e, nalguns casos, já ensinavam há vários anos. Esta é outra questão e sobre ela não me pronuncio. O Governo pode até ter razão em querer os exames e os professores não ter ao recusá-los. Aqui posso ser agnóstico sobre essa matéria. Não é sobre isto que escrevo, mas sobre o pequeno truque, habilidade, esperteza e os seus efeitos de dissolução social como norma de governação.

Vai haver quem encolha os ombros e ache muito bem que se pregue uma partida a Mário Nogueira e aos seus sindicalistas da Fenprof. (No entanto, todos os sindicato, mesmo os da UGT, dirigidos por membros e simpatizantes do PSD, estão de acordo em recusar o truque do Governo.) Mas, como a sociedade portuguesa está em modo de “luta de classes”, há aí muita gente agressiva a querer vingança no tempo útil que sobra até o Governo cair. A mó já é a mó de baixo e daí muita raiva pouco contida, que serve de base à indecência.

Sim, porque o que é inaceitável neste acto é que o Governo apresente face aos cidadãos um Estado cuja face é o logro e a habilidade grosseira, sem se preocupar um átomo em humilhar as pessoas, poucas que sejam, que precisam de um emprego, numa altura em que ele escasseia. É isto que é a maldade social. Não é que seja obrigatório fazer um exame, que é uma medida de política que pode ser contestada legalmente, inclusive pela greve.

O objectivo principal, sabemos nós, é impedir a greve, o que já é em si mesmo grave. Mas, para isso, usa-se discricionariamente as pessoas, atirando-as a seu bel-prazer de um lado para o outro, sem qualquer vantagem social, profissional, pedagógica. O Governo, mais do que testar os conhecimentos dos professores, o que já abandonou pelo caminho, quer discipliná-los, obrigando-os a obedecer, para poder mostrar autoridade. E, como podiam ter a vontade de fazer greve, tira-lhes essa possibilidade legal com um truque.

Não é para melhorar as escolas, é para mostrar quem manda. O resultado é que, se houver sarilhos, é porque andaram a pedi-los. Ao tratar-se as pessoas como cães, não admira que elas possam vir a morder.

Por: Público

quinta-feira, 17 de julho de 2014

Apoios aos estudantes com necessidades educativas especiais nas Instituições de Ensino Superior Público e Privado

Novidade! Informações úteis para acesso ao Ensino Superior

Neste site poderá encontrar informação sobre as condições que cada Instituição de Ensino Superior no país oferece aos estudantes com NEE que as frequentam; a mesma encontra-se disponível nesta ligação

O conteúdo deste site não dispensa a consulta da informação disponibilizada pela DGES sobre os diferentes cursos.

quarta-feira, 16 de julho de 2014

Encontro "Educação Inclusiva" - Apresentação Dr. Joaquim Colôa

Realizou-se no passado dia 10 de maio de 2014 o Encontro "Educação Inclusiva" no Fórum Cultural do Seixal.

Encontro: "Educação Inclusiva" - Apresentação da Professora Mónica Ramoa

Realizou-se no passado dia 10 de maio de 2014 o Encontro "Educação Inclusiva" no Fórum Cultural do Seixal.

O mercado municipal

A apetência do Governo por ter cada vez menos responsabilidades sociais vai de passo síncrono com a ânsia caciqueira de mais poder por parte dos autarcas.

A municipalização da educação está a ensaiar os primeiros passos em contexto estratégico favorável, prudentemente escolhido, já que os professores não pensam senão nuns dias de férias, depois de afogados em trabalhos de exames, que culminaram um ano particularmente desgastante.

Foi Poiares Maduro, que não o ministro da pasta, que anunciou, na Comissão Parlamentar de Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local da Assembleia da República, em Março passado, a intenção de o Governo entregar a gestão da educação a dez municípios-piloto. Na altura, não clarificou o que entendia por gestão da educação. Tão-só disse que a intenção do Governo era descentralizar. Mas descentralizar, verbo transitivo que significa afastar do centro, não é panaceia que traga automática melhoria ao sistema. O experimentalismo descentralizador dos últimos anos no que toca à colocação de professores e o cortejo inominável de aberrações e favoritismos que gerou é um bom exemplo de que muitas vertentes da gestão do ensino devem permanecer centralizadas. Justifica-o a pequena dimensão do país, a natureza dos compromissos, legais e éticos, assumidos pelo Estado face a um vastíssimo universo de cidadãos e as economias de escala que as rotinas informáticas permitem. Quanto aos aspectos que ganharão, e são muitos, se aproximarmos a capacidade de decidir ao local onde as coisas acontecem, não deve o poder ser entregue às câmaras, mas aos professores e às escolas. Justifica-o a circunstância de estarmos a falar da gestão pedagógica. Porque quem sabe de pedagogia são os professores.

Há um fio condutor para esta proposta, qual seja o de impor à Educação nacional o modelo de mercado, agora de mercado municipal. Trata-se de transformar o acto educativo em produto de complexidade idêntica à rotunda ou à piscina municipal. Quer-se apresentar a Educação como um simples serviço, circunscrito a objectivos utilitários e instrumentais, regulado prioritariamente por normas de eficiência. Querem exemplo mais escabroso que o convite para que as câmaras cortem professores, até ao limite máximo de 5% do número considerado necessário, a troco de 12.500 euros por docente abatido?

Este é mais um passo que concretiza a estratégia empresarial e tecnocrática que o Governo tem para a Educação, bem fixada pela elitização do ensino, que o “dual” postula para as crianças de dez anos que reprovem duas vezes, pela adopção de pedagogias de adestramento, de que a hiperinflação dos exames é exemplo, e pelo contributo generoso para a introdução de linhas de montagem no ensino, que os monstruosos mega-agrupamentos tipificam. A municipalização, com os pressupostos conhecidos de distribuição de competências, implode de vez a propalada autonomia das escolas e abre portas a iniciativas partidárias de que temos sobeja demonstração empírica, via experiência já colhida de intensa introdução de jogos políticos no funcionamento dos conselhos gerais. Cruzada com as intenções (e o financiamento cativo em sede de Orçamento do Estado) que foram anunciadas quanto ao cheque-ensino, poderá repetir no país o que se verificou na Suécia, com a criatividade activa dos grupos económicos a explorarem o “negócio” até que, anos volvidos, se reconheça a sua falência.

Diz-se que a generalização só se efectivará se uma avaliação, cujo modelo é desconhecido, a recomendar. Os exemplos, velhos e recentes, atestam o valor que a intenção tem. Veja-se o que se acabou de fazer com a avaliação dos centros de investigação. Recorde-se como a experiência do ensino dual passou, vertiginosamente, sem qualquer avaliação, de 10 para 300 escolas. E olhe-se, com um sorriso complacente, o “empreendedorismo” voluntarista que já se esboça: o presidente da Câmara de Óbidos já anunciou Filosofia para os alunos do 1.º ciclo do básico, yoga para os do jardim-de-infância e golfe e “eco design” para os do secundário.

Embora a lei não o permita e de momento apenas se fale numa autorização para os municípios recrutarem pessoal docente para projectos específicos locais (lembremo-nos da contratação de professores de Inglês a quatro euros à hora, feita por empresas intermediárias, nos tempos de José Sócrates), a eventual passagem para as autarquias da responsabilidade de gestão e pagamento aos professores traz à colação a falência técnica de muitas câmaras, os atrasos, muitos, verificados para com professores de actividades extracurriculares e o receio de novas discricionariedades ditadas pelo caciquismo e pela promiscuidade entre câmaras e órgãos unipessoais de direcção das escolas.

Os que se têm movido para desregular o sector por esta via, sem que nenhuma fundamentação empírica o justifique, dão um passo substancial. A saúde move-se já no mesmo sentido, dando razão ao pensamento de Foucault, que nos ensinou que os governos ditos liberais promovem a dissipação do Estado pulverizando mecanismos de controlo e tutela por toda a parte. Ou dito de outro modo: a apetência do Governo por ter cada vez menos responsabilidades sociais vai de passo síncrono com a ânsia caciqueira de mais poder por parte dos autarcas. Com esse engodo, os autarcas acabam promovendo políticas a que se oporiam se a iniciativa partisse do Governo central. E o Governo central subtrai-se, maquiavelicamente, aos protestos que as suas políticas originam. E há quem fale de ausência de estratégia!

Por: Santana Castilho

Professor do ensino superior (s.castilho@netcabo.pt)

terça-feira, 15 de julho de 2014

Simpósio: "Políticas Públicas de Educação Especial"

No dia 9 de julho de 2014 pelas 17 horas realizou-se, no Auditório do Instituto de Educação da Universidade de Lisboa, o simpósio: “Políticas Públicas de Educação Especial” promovido pela Pró - Inclusão - Associação Nacional de Docentes de Educação Especial e pelo Instituto de Educação (UL).

Este evento tinha como objetivo comentar a Recomendação do CNE e o Relatório do Grupo de Trabalho sobre Educação Especial criado pelo Despacho n.º 706-C/2014.

Para analisar o primeiro documento contámos com a presença do Dr. José Morgado e o segundo documento foi analisado pelo Dr. Joaquim Colôa e contámos com uma assistência, com mais de 250 pessoas, que deu um importante contributo para a análise e discussão de ambos os documentos.

Da intervenção dos dois oradores muito haveria a dizer, uma vez que ambos fizerem comunicações excelentes, com uma análise bastante cuidada aos documentos mas também deram uma perspetiva para onde deveríamos “caminhar” quando falamos de Educação Inclusiva.

A primeira chamada de atenção foi feita pelo Dr. José Morgado quando alertou para o facto de quando falamos de Educação Inclusiva continuamos a ver as discussões muito centradas na Educação Especial e nas pessoas que trabalham diretamente com pessoas com deficiência. Esta discussão tem ser em torno de uma Educação de qualidade e com mais equidade e envolver todos os agentes educativos.

De seguida o Dr. José Morgado alertou para o facto de se ter de rever a formação, seja ela inicial, contínua ou especializada. Mas antes de o fazermos tem de haver uma reflexão sobre o perfil de professor de educação especial que queremos para as nossas escolas, até porque “para servirmos e criarmos serviços de qualidade temos de saber que professores queremos”.

A última nota que vos trago da apresentação do Dr. José Morgado (embora houvesse muito mais a dizer) é a questão da elegibilidade dos alunos para a Educação Especial. Temos de ter muito cuidado com esta questão porque através dela “podemos promover exclusão em nome da inclusão”. Deve haver é seleção de respostas e não de alunos, esta deve ser a preocupação.

O Dr. Joaquim Colôa começou a sua apresentação referindo que o documento produzido pelo Grupo Interministerial se apresenta com um discurso contraditório. Verifica-se que numa primeira parte desse documento verificamos que é apresentado todo um discurso sobre a Inclusão mas depois quando se passa para aquilo que é para ser aplicável o discurso parece contraditório.

São utilizados termos ultrapassados e o conceito de NEE que nos é apresentado é muito restrito parecendo alinhado com o de deficiência. Embora saibamos que a CIF não tem tido boas críticas, por todos os intervenientes no processo educativo, sabemos que o problema vai continuar. Ou seja prevê-se que a burocracia vai aumentar atrasando a intervenção nomeadamente através dos aspetos burocráticos que preveem o controlo.

O Dr. Joaquim Colôa alerta para a necessidade de termos de “deixar de falar de nós e deles…temos de falar de nós! Nós na diferença, na comunicação e na interação.”

No seguimento da sua comunicação refere que no documento é apresentado um esquema onde de um lado temos as Adequações Curriculares direcionadas para a teoria e o CEI para a prática. O orador depois questiona-se dizendo “Será que há algum currículo que não seja prático?!”.

Verificamos ainda que neste documento é apontada a necessidade de se reverem os modelos de CRI, mas não nos é dito como isso será feito. O Dr. Joaquim Colôa a este ponto acrescenta que é importante que a Escola possa gerir os recursos que realmente necessita, até porque a necessidade das escolas por vezes é uma e os CRI não respondem a essa necessidade (por exemplo: a escola precisa de um T.O. mas o CRI diz que não tem, então dão-nos um Psicólogo).

De seguida abordou a intenção do Grupo de Trabalho implementar o “Response to Intervension” (RTI). No entanto aquilo que não é referido no relatório é para a implementação desse modelo é imprescindível que as escolas tenham determinadas condições que infelizmente não têm até porque o RTI exige a monitorização aluno a aluno, algo que faria que houvesse um aumento de recursos nas nossas escolas. Uma outra questão que não é abordada neste documento é que as avaliações que já foram realizadas ao RTI foram identificados alguns problemas.

O Dr. Joaquim Colôa termina a sua apresentação referindo que se os referenciais forem sempre os mesmos não há modelos que nos valha.

Termino este resumo utilizando uma frase do Dr. David Rodrigues “Agora utiliza-se a música da Inclusão, a letra é outra coisa. A única coisa boa é que pelo menos ninguém é contra a Inclusão”.

É certo que muitas políticas e decisores políticos têm dificultado o nosso caminho…mas esse caminho continuará a ser feito, já não há volta a dar! Com a envolvência de Todos conseguiremos uma Educação com mais qualidade e equidade!

Por: Nelson Santos

In: Newsletter n.º 74 da Pró-Inclusão - Associação Nacional de Docentes de Educação Especial

Ensinar todos os alunos

A inclusão de alunos com dificuldades - sejam elas originadas por uma condição de deficiência ou por outras razões – é reconhecidamente uma empresa difícil. Quando há pouco dizia esta frase numa escola, uma das professoras retrucou: “Mas até com alunos que não têm dificuldades a vida das escolas está cada vez mais difícil!”.

E verdade, que a tarefa de educar e de ensinar alunos nos dias de hoje é cada vez mais complexa e difícil. Talvez por três razões: a escola mudou menos – em termos de metodologias e procedimentos – do que a sociedade. Assistimos assim a um frequente “braço de ferro” entre a escola que quer que os alunos aprendam “determinados conteúdos de certa maneira” e os alunos que preferem aprender “outros conteúdos de outra maneira”…. Em segundo lugar há uma diversidade muito maior de alunos que se defronta com uma visão mais “homogénea” da escola. Certamente que há muitas exceções mas a escola continua a apostar na homogeneidade, considerando que uma turma é um grupo de alunos que parte do mesmo ponto, caminha o mesmo caminho e há-de chegar aos mesmos objetivos. Em terceiro lugar a escola teve que assumir o ensino de muitos aspetos educativos que antes estavam centrados na família. A escola teve que encarar áreas que tradicionalmente não estavam no seu reportório. A esta escola chamou António Nóvoa a “escola transbordante” porque o que há a ensinar é tão vasto que transborda os limites do razoável.

É pois uma escola já com dificuldades de responder a competentemente a todos os alunos que encara o desafio da inclusão de alunos que têm dificuldades identificadas. Portugal desenvolveu nos últimos anos políticas de inclusão de alunos com dificuldades na escola regular. 

Faz mesmo este ano precisamente 20 anos que Portugal assinou a Declaração de Salamanca proclamada pela UNESCO em Junho de 1994. Nesta declaração (que faz sempre bem voltar a ler…) diz-se explicitamente que (…) As escolas regulares, com esta orientação inclusiva, são os meios mais eficazes para combater as atitudes discriminatórias, criar comunidades acolhedoras, construir uma sociedade inclusiva e para alcançar a educação para todos”.

Dizer que as escolas são os meios mais eficazes é correto e louvável. Mas… ( a questão são os “mas”…) o que é preciso para que as escolas se tornem naquilo que devem ser, isto é, escolas com uma orientação inclusiva?

Muitas vezes concebemos as mudanças como processos altamente sofisticados e de natureza difícil. Claro que são. As pessoas e as sociedades são particularmente atraídas por uma espécie de homeostasia conservadora no que respeita à educação… Mas eu gostaria de chamar a atenção para algo que é o cerne da inclusão e que pode ser assumido como um objetivo ao nível pessoal, e de cada uma das escolas e agrupamentos. Querem ser inclusivos? Ensinem TODOS os vossos alunos. Mesmo aqueles (sobretudo aqueles) que pareçam mais difíceis de ensinar, que resistem mais à escola, que parecem menos motivados para a aprendizagem. Ensinar todos os alunos é o ponto de partida que nos pode conduzir a uma escola inclusiva. E sabem porquê? Porque se um professor quiser ensinar todos os seus alunos não pode ensiná-los como se eles fossem iguais, não pode usar os mesmos objetivos para todos, não pode promover as mesmas estratégias, tem certamente que cooperar com os colegas e com outros técnicos.

Ensinar todos os alunos é uma tarefa quase impossível. E digo quase porque há muitos milhares de professores a tentar e frequentemente a conseguir fazê-la todos os dias.

São esses os professores que, mesmo que não saibam todas as teorias sobre Educação Inclusiva, mesmo que os apoios estejam aquém do que o que seria desejável, são estes os professores que no quotidiano constroem uma escola e país mais inclusivos. São estes os professores que não querendo deixar nenhum aluno para trás, se investem como verdadeiros agentes de inclusão. Estes professores estão aí. Eu conheço muitos.

Por: David Rodrigues

Presidente da Pró-Inclusão e Professor na Universidade Técnica de Lisboa - Faculdade de Motricidade

Viseu quer reforçar imagem de destino acessível

A Câmara Municipal de Viseu quer apostar no reforço da cidade como destino acessível, uma ideia que passa pelo objetivo de dar aos visitantes cada vez mais e melhores opções de mobilidade.

Esta garantia foi dada pelo presidente da autarquia de Viseu, Almeida Henriques, que falava na conferência “Turismo acessível”, em março. O autarca defendeu que “Viseu tem preocupações de inclusão, tem soluções para a inclusão, tem uma política municipal sensível e tem, por isso, um potencial de afirmação neste segmento turístico”.

A melhoria da acessibilidade de cidadãos com deficiência aos edifícios da cidade, bem como ao centro histórico é uma das apostas do Município de Viseu.

A Câmara quer, também, apostar na melhoria da mobilidade verde na cidade, através da criação de vias cicláveis que liguem pontos importantes de residência ou atividade.

Está, aliás, em fase de adjudicação a ligação da ecopista do Dão à radial de Santiago e ao seu parque urbano. E, futuramente, esta zona pode vir a ser ligada ao Fontelo.

In: Plural e Singular (p. 7)

Via: Incluso

segunda-feira, 14 de julho de 2014

O poder simbólico dos professores

Com o lento passar do tempo e da memória colectiva, gerações após gerações os professores ajudaram a elaborar a imagem social de uma profissão de dádiva absoluta e incontestável entrega.

O poder simbólico da actividade docente leva a que os professores sintam sobre os seus ombros a utópica tarefa de mudar, para melhor, o mundo; de traçar os novos caminhos do futuro e de preparar todos e cada um para que aí, nesse desconhecido vindouro, venham a ser cidadãos de corpo inteiro e, simultaneamente, mulheres e homens felizes. É obra!

Ao mesmo tempo que a humanidade construiu uma sociedade altamente dependente de tecnologias dominadoras, transferiu da religião para a escola a ingénua crença de que o professor, por si só, pode miraculosamente desenvolver os eleitos, incluir os excluídos, saciar os insatisfeitos, motivar os desalentados e devolvê-los à sociedade, sãos e salvos, com certificação de qualidade e garantia perpétua de actualização permanente.

O emergir da sociedade do conhecimento acentuou muitas assimetrias sociais. Cada vez é maior o fosso entre os que tudo têm e os que lutam para ter algum; entre os que participam e os que são marginalizados e impedidos de cooperar; entre os que protagonizam e os que se limitam a aplaudir; entre os literatos dos múltiplos códigos e os que nem têm acesso à informação.

E é este mundo de desigualdades que exige à escola e ao professor a tarefa alquimista de homogeneizar as diferenças.

Os professores podem e estão habituados a fazer muito e bem. Têm sido os líderes das forças de sinergia que mantêm os sistemas sociais e económicos em equilíbrio dinâmico. São eles que, no silêncio de cada dia, e sem invocar méritos desnecessários, evitam que muitas famílias se disfuncionalizem, que as sociedades se desagreguem, que os estados se desestruturem, que as religiões se corroam.

Mas não podem fazer tudo. Melhor diríamos: é injusto que se lhes peça que façam ainda mais.

Particularmente quando quem o solicita sabe, melhor que ninguém, que se falseia quando se tenta culpabilizar a escola e os professores pelos mais variados incumprimentos imputáveis à sistemática incompetência dos ministros, do demissionismo e laxismo das famílias, da sociedade e do próprio Estado tutelar.

É bom que se repita: os professores, por mais que se deseje, infelizmente não têm esse poder extraordinário. Dizemos infelizmente porque, se por feitiço o tivessem, nunca tamanho domínio estaria em tão boas e competentes mãos.

E é precisamente porque nunca foram tocados por qualquer força sobrenatural que os professores, como qualquer outro profissional, também estão sujeitos à erosão das suas competências; que, como qualquer técnico altamente qualificado, eles também necessitam de actualização permanente. E é por isso mesmo que os docentes reclamam uma avaliação justa do seu esforço profissional.

Todas as escolas preparam impreparados. Até as que formam professores. Sempre foi assim e, daí, nunca veio mal ao mundo. É a sequência e a consequência da evolução dialéctica das sociedades e das mentalidades.

Por isso, centrar a discussão no excesso de escolas e de professores, como se tal fosse estigma exclusivo desta classe e justificasse as perversas iniciativas ministeriais de despedimentos colectivos, traduz uma inqualificável atitude de desprezo da tutela pela verdade e pela busca de soluções credíveis e partilhadas.

Admitir que a escola pode resolver todos os problemas e contradições da sociedade, resulta em transformá-la em vítima evidente do seu próprio progresso.

Os docentes não podem solucionar a totalidade dos problemas com que se confrontam as sociedades contemporâneas, sobretudo se não tiverem o incondicional apoio do Estado, das famílias e das instituições sociais que envolvem a comunidade escolar.

Os professores não têm o poder de operar prodígios. São profissionais, de corpo inteiro e altamente qualificados.

A nossa sociedade não se pode dar ao luxo de os deixar, parados, no desemprego, mesmo que encapotado.

No estádio de desenvolvimento de Portugal, face aos seus parceiros europeus, é preciso que se diga e repita todos os dias que não temos professores e escolas a mais.

Por tudo isso, por favor não os obriguem a ser mais do que são, ou nunca serão o que o futuro lhes exige que venham a ser.

Por: João Ruivo

'Gadget' em forma de anel ajuda invisuais a ler

O FingerReader é um pequeno ‘gadget’ que traduz para áudiopalavras escritas. O aparelho tem a forma de um anel que se coloca no dedo e faz um ‘scan’ dos textos transformando-os em som. O equipamento foi desenvolvido por uma equipa de investigadores do MIT e poderá representar uma importante ajuda para pessoas invisuais. 

Basta colocar o anel no dedo e deslizar pelas páginas. Simultaneamente, o equipamento faz a tradução do texto adicionando informações úteis que indicam quando acaba a linha ou quando começa uma linha nova. Além disso, o FingerReader alerta o leitor quando este se afasta da linha de texto, para que não afete o processo de ‘scan’.

De acordo com um comunicado de imprensa da equipa do Massachusetts Institute of Technology (MIT, nos EUA) que desenvolveu o aparelho, qualquer pessoa invisual pode usar de uma forma muito simples este ‘gadget’. “É possível ler qualquer tipo de texto - cartões de visita, menus de restaurantes – basta para isso apontar o dedo para a superfície onde as palavras estão escritas”, lê-se do site oficial do projeto.

Clique aqui para ver um vídeo que demonstra o funcionamento do FingerReader sobre diversas superfícies, desde folhas de papel a 'tablets'

quarta-feira, 9 de julho de 2014

Quanto vale meio professor?

Se a municipalização fosse para melhorar a Educação, não seria de esperar que se começasse pelos municípios com mais problemas?

Conheceram-se nos últimos dias os contornos do novo estratagema governamental para, em colaboração com diversas autarquias, levar o conceito de Educação Low Cost a novos patamares de “eficiência”.

A partir de uma proposta inicial do ministro Poiares Maduro, cerca de uma dúzia de autarquias está em negociações com o actual Governo para uma transferência de competências mais alargada na área da educação, num modelo que se apresenta como de “escolas municipais”, sejam criadas de base, sejam geridas a partir do poder local.

O argumento é o da bondade de uma gestão de proximidade que será de maior eficácia e mais fácil responsabilização por parte dos cidadãos. Em defesa dessa tese apresentam-se enunciados de fé e nenhuma fundamentação empírica. Pelo contrário, os responsáveis pela tese fogem com estrépito sempre que se pede para darem exemplos não anedóticos que demonstrem que essa solução levou, além-fronteiras, a uma melhoria do desempenho do sistema educativo no seu todo e à prestação de um melhor serviço público aos alunos. Basta acenar-se com um ou dois casos muito claros de insucesso deste tipo de reformas (a Suécia é o exemplo mais recente de inversão da localização das políticas educativas) ou de resultados pouco relevantes (a Inglaterra não revela especiais progressos, apesar da expansão das autoridades locais na área da educação) e a conversa resvala logo para a questão dos “princípios” ou da “eficácia financeira”.

Mas, neste momento, temos acesso directo aos documentos que servem de base à negociação entre o MEC e algumas autarquias, indo eu servir-me em seguida do "memorando de trabalho" do Programa Aproximar Educação destinado a alcançar um contrato de educação e formação municipal com a autarquia de Matosinhos, presidida pelo independente (ex-PS) Guilherme Pinto.

De acordo com esse memorando, pretende-se uma “descentralização, por via de delegação contratual, de competências na área da educação e formação, dos serviços centrais do Estado para os municípios”. De acordo com o texto, esta iniciativa “ baseia-se em algumas premissas potenciadoras da eficiência e eficácia: subsidiariedade, proximidade, co-responsabilização, racionalização dos recursos e democratização”. Como se não chegasse este pedaço de prosa para se perceber que estamos a entrar em terreno pantanoso e nevoento, acrescenta-se ainda que se aproximam “objetivos que se traduzem numa verdadeira articulação estratégica do ensino, pretendendo-se aprofundar a responsabilidade dos municípios no compromisso com a educação, reconhecidos não só pelos resultados escolares, pelo desenvolvimento humano, mas também pelos seus valores”.

Em bom português, isto quer dizer… nada.

Porque, no caso presente e nos restantes, o que está em causa é definir um modelo de financiamento desta transferência de competências, o qual surge com clareza num anexo 3, cheio de fórmulas de eficiência, valores médios, números esperados e tudo o que representa a redução da Educação a economias de escala. A teoria da proximidade e descentralização cai pela base quando se lê (p.3 do dito anexo) que, “uma vez que o processamento dos salários do pessoal docente passará a ser centralizado, a componente de financiamento estará ligada à boa gestão dos recursos docentes”. O que interessa é centralizar a gestão dos recursos docentes e torná-la mais eficaz.

E como se faz isso? A fórmula é simples… por “eficiência” entende-se a existência de um número real de docentes, inferior ao dos que seriam teoricamente necessários. É mesmo isso que está no dito anexo em negociação para Matosinhos, que depois concretiza com números.

De acordo com as fórmulas ideais são necessários 1473,5 (!) docentes para o concelho, estando actualmente em exercício 1674,1 (?), dos quais 63 pediram aposentação. Retirando-os do diferencial de 198, restam 135 que, ao que parece, não serão necessários. No documento é afirmado que o “MEC partilha 50% do diferencial do n.º de docentes em valor (referencial do valor docente - índice 151: 25.000€) desde que esse diferencial não ultrapasse 5% dos docentes que se estima como necessários”, o que significa que mais 70 professores poderão estar em risco de serem “desnecessários (5% dos tais 1473) e renderem 875.000 euros à autarquia.

Nuno Crato já surgiu, entretanto, com o apoio de uma reunião com a FNE, a dizer que nada disso se passará durante o seu mandato. E foi muito cuidadoso ao referir isso. E ficamos a perceber que é uma garantia de curto prazo.

Mas… pensemos que as autarquias têm técnicos superiores com habilitações para dar aulas, embora não profissionalizados. E outros técnicos… Já viram como será fácil, usando a teoria dos técnicos especializados para dar os cursos profissionais e vocacionais, colocá-los a dar umas quantas horas semanais de aulas nas escolas sob gestão municipal? Percebe-se o esquema que permitirá atingir “números reais” muito mais “eficazes”, sem que esteja em causa qualquer preocupação com a qualidade do serviço público prestado, mas apenas uma negociata entre o poder central (que desorçamenta despesa) e o poder local (que encaixa receita por cada professor a menos).

Por fim, e este é um detalhe curioso, nenhuma das autarquias que parecem mais interessadas no negócio correspondem, de acordo com o recente Atlas da Educação coordenado pelo ex-ministro David Justino, a municípios integrados nos clusters com um desempenho problemático ao nível do ensino básico. Pelo contrário, estão todos nos clusters que se distinguem pelo sucesso escolar e pela baixa retenção.

Se a municipalização fosse para melhorar a Educação, não seria de esperar que se começasse pelos municípios com mais problemas?

Por: Paulo Guinote

Professor do 2.º ciclo do ensino básico

In: Público