sábado, 4 de julho de 2015

REVISÃO DA PORTARIA OU DAS IDEIAS QUE A INFORMAM


Recordo o Parlamento tinha aprovado uma recomendação ao Governo para que procedesse à revisão da Portaria n.º 275-A/2012 em vigor sobre esta matéria.

É importante recordar que a recomendação surgiu na sequência da discussão na AR de uma Petição lançada pela Plataforma - Associações de Pais pela Inclusão que pretendia a revogação dessa Portaria pois, segundo os promotores, a Portaria “constitui um retrocesso nos desígnios de uma sociedade inclusiva, condicionando a aprendizagem e a profissionalização de muitos dos jovens com necessidades educativas especiais”.

Sem conhecer os conteúdos da nova portaria algumas notas breves.

Em primeiro lugar sublinhar o empenho e a persistência dos Movimentos de Pais no combate ao normativo que está em vigor e que claramente atentava contra alguns dos direitos dos seus filhos.

Em segundo lugar registar que, apesar de algumas boas experiências, a sua aplicação produziu efeitos muito negativos e o que é conhecido por quem tenha alguma proximidade com este universo seria mais do que suficiente para que tivesse sido recomendado a revogação e não "revisão" e que tivesse acontecido há mais tempo.

Assim, gostava de ser optimista relativamente à nova portaria mas não sinto por onde possa alimentar esse optimismo. Oxalá esteja mesmo enganado.

Não esqueço que quem deverá proceder à sua "revisão" será a mesma estrutura que a produziu, defendeu e alimentou pelo que a eventual "revisão" da Portaria não significará certamente a "revisão" das ideias e da visão que a informaram. Acresce a teimosia arrogante a que estamos habituados por parte do MEC.

A principal razão para isto é que, do meu ponto de vista, esta visão e ideias são estruturantes de toda a política educativa. Uma visão de "normalização" do ensino, já não vale a pena falar de educação, vai afastando os menos dotados ou "preguiçosos" das salas de aula e, melhor ainda das escolas ou, pelo menos, acantonados em espaços próprios, de "referência" ou "unidades", por exemplo.

Não esqueço também os interesses presentes que envolvem as instituições de solidariedade social ou privadas que providenciam serviços de "inclusão". Apesar de algumas boas práticas a realização de um conjunto de actividades, algumas verdadeiramente inaceitáveis ou inúteis, num espaço institucional próprio, inserido num grupo semelhante, tem pouco a ver com inclusão cujo principal critério, mais uma vez, é, justamente, a participação da forma possível nas actividades de toda a comunidade.

É como se pudéssemos afirmar, desculpem a crueza, que um indivíduo preso que realize na prisão algumas actividades que também se realizam na comunidade está incluído.

A questão central, do meu ponto de vista, não é de todo uma opção de natureza científica relativamente à educação de um grupo de alunos com necessidades especiais é, de facto, uma questão centrada numa visão de sociedade, de educação e ensino público a que os grupos mais vulneráveis são, obviamente, os mais expostos aos efeitos negativos.

O Secretário de Estado do Ensino Básico e Secundário afirmou ontem na AR que os alunos com NEE “estarão na escola em tempo semelhante ao que estarão os outros alunos” e “Garantiremos que prossigam no ensino secundário com as devidas condições e com o devido apoio”, disse. As práticas que conhecemos apesar de muitas experiências notáveis fazem-me ter alguma reserva sobre o que aí vem.

Veremos se a nova portaria que regula a frequência do ensino secundário por parte de alunos com NEE apenas procede a alguns ajustamentos que se reflictam na aparência ou se traz algo de novo ao nível da substância.

Deixem lá ver, como se diz no Alentejo.

Texto de Zé Morgado

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