segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

A história verdadeira de um Paulinho gordinho

Era uma vez um Paulinho gordinho, que andava no 5.º ano e, como não gostava de se ver ao espelho, também não gostava de ir às aulas de Educação Física. E quem falta a estas, falta também às outras, acabando por reprovar por faltas, apesar das inúmeras cartas e dos muitos telefonemas da diretora de turma para a mãe, que raramente ia à escola falar com ela e que sempre se mostrou pouco firme com o filho no que se referia a obrigá-lo a ir às aulas. Achava ela, provavelmente, que, se ele não se sentia lá bem, mais valia ficar em casa.

E foi assim que o Paulo entrou numa nova turma de 5.º ano, mais gordinho, mais altinho e com uma diferença de tamanho (e largura) e idade relativamente aos colegas ainda maior do que tinha acontecido no ano anterior. O fim lógico da história parece ser que o Paulinho se sentiu cada vez pior, faltou cada vez mais e reprovou de novo. Enganam-se. A história tem um final feliz. Vamos ao que se passou.

No novo ano escolar as faltas começaram a aparecer. Diretora de turma, psicóloga escolar e professora de Educação Física definiram estratégias de intervenção articuladas, situação que, posteriormente, se alargou também ao restante Conselho de Turma (CT). Enquanto a psicóloga acompanhava o Paulo em atendimentos individuais, colaborou também com a diretora de turma e o CT no apoio à sua integração na turma, através de atividades desenvolvidas em Formação Cívica e de uma atenção particular da professora de Educação Física a ele nas suas aulas. Foi assim que o Paulo, que até já conhecia alguns alunos da turma, se sentiu bem recebido e apreciado, independentemente da sua imagem corporal. Deu-se a feliz coincidência de, a meio desse ano letivo, a médica de família o ter mandado para consultas de nutricionismo, que, com a sua força de vontade no seguimento da dieta prescrita e na prática diária do exercício físico recomendado, deram resultados rápidos e evidentes (emagrecimento), com a consequente elevação da sua autoestima, reforçada pelos elogios de professores e colegas.

Mas nem tudo correu bem nesta história. Houve ocasiões, nesse 5.º ano e no 6.º ano que se lhe seguiu, em que o Paulinho voltou a faltar às aulas e a mãe a não aparecer com facilidade às chamadas da diretora de turma. Quando vinha, mostrava-se pouco firme, como no ano em que o filho tinha reprovado. E foi assim que a diretora de turma começou a pedir comprovativos dos motivos apresentados para as justificações das faltas e a injustificá-las quando eles não eram apresentados. A esta estratégia adicionou-se a colaboração do Presidente do Conselho Executivo (CE) que se prontificou a atender a encarregada de educação e o aluno com a diretora de turma, para tentar responsabilizá-los mais pela assiduidade. Com estes altos e baixos, o Paulo lá passou para o 6.º ano.

Era uma vez um Paulinho que, no 6.º ano, já não era tão gordinho e estava cada vez mais "elegante". Apesar de já se sentir completamente bem na turma e de continuar a receber todos os apoios do ano anterior, de vez em quando lá faltava e os 'de vez em quando' começaram a aumentar. Nem a injustificação das faltas estava a parecer impedir o retrocesso. Conversas da diretora de turma e da psicóloga com ele deram a conhecer uma família desestruturada, com um pai desempregado e agressivo e uma mãe que trabalhava excessivamente, ficando os mimos do Paulo repartidos por ela (num tempo escasso) e pelos avós maternos (que viviam longe). Paulo gostava de se refugiar na casa deles e, por isso, faltava às aulas, a ponto de, mais uma vez, estar em riscos de perder o ano por faltas. Nova reunião da diretora de turma e do presidente do CE com a mãe e o aluno serviu para lhes mostrar a retenção à vista, mas também a possibilidade de passagem, se o Conselho Pedagógico o aprovasse, após um parecer favorável do CT. O sonho do Paulo era tirar um curso profissional. Ele queria ser eletricista. Nesta conversa, os problemas familiares do Paulo foram tidos em conta e foram propostas algumas possibilidades de apoio pela escola. Foi mostrado, a mãe e filho, que a passagem de ano precisava agora de ser uma conquista, que implicava a ausência de qualquer falta injustificada. Mãe e filho choraram, mas sentiram-se apoiados e perceberam que a dureza da aplicação da lei, com a injustificação das faltas, apenas visava ajudar o Paulo a alcançar o seu sonho.

E a história acabou bem. Não tem o fim tradicional dos contos de fadas, mas tem um fim adequado a uma história de um menino/adolescente, com uma vida difícil, que lutou e foi apoiado na sua luta, chegou ao fim do ano com sucesso e, no ano seguinte, conseguiu ingressar no curso profissional pretendido. Logo que o conseguiu, telefonou para a escola a dar a boa nova à diretora de turma e à psicóloga.

Moral da história:

1. Por trás dos problemas manifestados por cada aluno, há uma história de vida que é necessário conhecer para se definir uma estratégia de intervenção adequada e eficaz.

2. É importante mobilizar os recursos existentes e adequados a cada caso.

3. É fundamental tentar conseguir o apoio e a colaboração da família, que, muitas vezes, como neste caso, implica a formação dos próprios pais.

4. É importante fazer uso dos instrumentos legais existentes e adequados a cada situação, não de uma maneira cega, mas rigorosa, pedagógica e intencional.

Sabemos, por experiência, que nem todas as histórias têm este final feliz. Mas vale a pena lutar por ele e nunca desistir.

Por: Armanda Zenhas

In: Educare

1 comentário:

  1. A falta de acompanhamento, compreensão e sobretudo muita atenção e empenho de todos os intervenientes.

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