Um grupo de cientistas norte-americanos conseguiu sequenciar o genoma de um feto às 18 semanas de gestação, utilizando para isso apenas uma amostra de sangue da mãe e de saliva do pai. Consequência disso é que o novo teste pode, no futuro, ajudar a detectar cerca de 3000 doenças, antes do nascimento.
Até agora os investigadores já conseguiam ler o genoma dos fetos através do líquido amniótico. Contudo, o exame necessário, a amniocentese (uma técnica invasiva), apesar de amplamente utilizada pela medicina, acarretava alguns riscos para a gravidez.
Há dois anos um grupo conseguiu também sequenciar o genoma do bebé a partir do sangue da mãe, mas a análise revelou-se mais incompleta, uma vez que carecia de amostras paternas. A experiência ainda está confinada aos laboratórios mas, à semelhança das outras descobertas, o avanço reacende o debate sobre as questões éticas do diagnóstico pré-natal e eventuais decisões que se sucedem.
O trabalho em causa acaba de ser publicado na revista científica Science Translational Medicine e, segundo os autores, representa um grande avanço no diagnóstico pré-natal de doenças de base genética, com a grande vantagem de ser um método não invasivo. A sequenciação do genoma permite, por exemplo, detectar doenças como trissomia 21 (síndrome de Down), doença de Huntington, síndrome de Marfan, retinoblastoma, fibrose quística e uma forma da doença de Alzheimer.
O estudo foi conduzido por Jacob Kitzman e Matthew Snyder, no laboratório de Jay Shendure, da Universidade de Washington. Num comunicado, os autores adiantam que o método explorado permite uma visão mais clara do genoma, uma vez que detecta as variações mais subtis, ao incluir tanto material da mãe como do pai. Ao todo poderão ser detectadas cerca de 3000 doenças genéticas, ainda que a sua incidência média seja de apenas 1%.
Os investigadores explicam também que muitas das mutações genéticas não podem ser observadas directamente nos pais, mas sim na formação do óvulo, do esperma e na concepção, pelo que é mais útil uma leitura já durante a gestação e numa fase em que o feto já tem a sua formação avançada, como é o caso das 18 semanas.
Na mesma nota, o grupo explica que repetiu o mesmo método (análises ao sangue e saliva) num casal que já se encontrava mais perto do final da gravidez. Em ambos os casos no parto foi recolhido sangue do cordão umbilical e foi feita uma nova análise do genoma dos bebés para se comparar com a leitura feita durante a gestação, tendo os resultados sido muito satisfatórios, com uma taxa de sucesso de 98%.
Já há muito que os cientistas sabem que no sangue materno é possível encontrar amostras do ADN do feto. Apenas algumas semanas depois da concepção, cerca de 10% das células de ADN em circulação na mulher são já provenientes do bebé. Nesse sentido, vários laboratórios têm vindo a desenvolver alguns testes baseados apenas no sangue materno e que consigam, de forma segura e pouco dispendiosa, ser utilizados pelos médicos, para substituir o tradicional exame invasivo ao líquido amniótico.
A investigação agora dada a conhecer tenta ir mais longe e detectar mais doenças do que as que são comummente procuradas. “Esta solução melhorada é como ser capaz de ver que em dois livros que estão juntos num deles uma palavra numa página está mal escrita”, exemplificou Kitzman.
Durante a investigação, o grupo norte-americano conseguiu também perceber na amostra de sangue que parte da informação genética pertencia ao feto e que parte era apenas da mãe, isto é, quais eram os seus haplótipos. A molécula de ADN humano (ácido desoxirribonucleico) contém 3 mil milhões de pares de bases, sendo um par de bases um conjunto de dois nucleótidos (compostos que auxiliam os processos metabólicos) opostos e complementares na cadeia de ADN. As bases são as “letras” que compõem o ADN (Adenina, Citosina, Guanina, Timina) e ligam-se por pares.
No entanto, os investigadores alertam que a técnica ainda precisa de ser aprofundada até ser clinicamente utilizada, uma vez que é preciso trabalhar mais a interpretação de resultados, assim como os custos e autonomia do teste.
In: Público
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