quinta-feira, 28 de junho de 2012

O que (se) espera (d)a escola no próximo ano?

Foi divulgado recentemente um estudo realizado por duas investigadoras do Instituto de Psicologia Aplicada (ISPA). Partindo de uma amostra de 807 professores, concluiu-se que metade dos professores portugueses sofre de síndrome de burnout, estado físico, emocional e psicológico relacionado com stress e ansiedade, que pode conduzir à depressão. Num nível elevado desta síndrome encontram-se 30% dos docentes. As causas de tão grave situação encontram-se, entre outras, na dificuldade de gestão dos problemas de indisciplina, no sentimento de desmotivação dos alunos para o estudo e na pressão para o sucesso, no desagrado com a carga letiva e com as responsabilidades não educacionais. 

Os números do desemprego crescem em muitas profissões, uma das quais a docência. 

Com a Revisão da Estrutura Curricular (26/03/2012), desapareceram as áreas curriculares não disciplinares e foi reduzida a carga letiva de várias disciplinas. Seguidamente, as Matrizes Curriculares do Ensino Básico e Secundário (cujas diferentes e sucessivas versões têm dificultado a preparação do próximo ano nas escolas) reduziram ainda mais o número semanal de aulas por grupos de disciplinas. Se associarmos estes factos ao aumento do peso dos exames na avaliação, poderemos facilmente adivinhar um ensino essencialmente virado para a aquisição de conhecimentos e treino a debitar em testes e exames. 

Para trás ficarão outras componentes essenciais na educação escolar (Ver artigo Para quando as reguadas). Obviamente, o desemprego docente crescerá. Serão esses professores verdadeiramente dispensáveis? 

Ou, pelo contrário, a falta de professores para aulas e outras atividades de apoio a alunos com dificuldades é uma realidade bem sentida por muitos estudantes e suas famílias? 

Sob o pretexto de dar maior autonomia às escolas, o MEC atribui aos diretores a responsabilidade de distribuir aos professores o tempo para desempenho de diversas funções, desde a direção de turma até à coordenação de departamentos, antes da responsabilidade do Ministério. Destaco alguns problemas:

  • Os professores que desempenharem esses cargos terão menos tempo para o fazer, embora o trabalho possa ser a dobrar. Dois exemplos:
    - os diretores de turma, agora com mais alunos por turma, terão, no entanto, menos tempo para exercer a sua função, o que levará a uma maior dificuldade de acompanhamento dos alunos e de contacto com as suas famílias.
    - os coordenadores de departamento (ex.: departamento de línguas, juntando Português, Francês, Inglês, Alemão e Espanhol), com mais professores e tarefas para coordenar, aumento resultante da junção de agrupamentos/escolas já grandes em "giga-agrupamentos", terão menos tempo do que tinham antes apesar do acréscimo de trabalho e responsabilidades.
O tempo para o exercício destes cargos, dantes determinado pelo Ministério, sendo agora menor no seu total (decisão do MEC), lança o odioso da sua distribuição por cada professor sobre os diretores dos agrupamentos, a pretexto de uma pretensa descentralização. Relembro que o exercício destes cargos foi uma das causas apontadas no estudo do ISPA para o burnout dos docentes.
  • O número de horas a que cada escola terá direito para o desempenho desses cargos e para outros fins, como os apoios educativos, vai depender de uma complicada fórmula (determinada pelo MEC) em que tem elevado peso o sucesso académico dos alunos da escola. Desta forma, escolas com sucesso receberão mais horas para esses efeitos, podendo dar melhores condições aos seus alunos; as escolas em que o insucesso for maior, receberão menos horas, e ver-se-ão a braços com falta de recursos para implementarem medidas de apoio aos alunos e de melhoria das aprendizagens. Podemos concluir que insucesso gerará escolas de 2ª e cada vez maior insucesso, enquanto que sucesso gerará escolas de 1ª e maior sucesso.
Por fim, imaginemos uma escola grande, até agora com um diretor e vários adjuntos, onde estes não têm mãos a medir para garantir o funcionamento da escola, de que destaco, apenas, a segurança dos alunos e os problemas disciplinares. Imaginemos essa mesma escola, integrada num "giga-agrupamento", tendo na sua gestão agora em permanência apenas um adjunto, que não terá os mesmos poderes de atuação que o diretor nem mesmo exercerá essa função a tempo inteiro. Como se pode esperar que as escolas funcionem com segurança e garantam condições de aprendizagem? 

É caso para dizer, "Ó, tempo, não voltes para trás!". Tanto caminho se fez para dar vida às escolas e dói ver essa vida escoar-se cada vez mais. 

Consultas feitas:
Despacho-normativo n.º13-A/2012, de 5 de junho 
Revisão da Estrutura Curricular (26/03/2012)
Matrizes do Ensino Básico e Secundário (aprovadas em 31 de maio)
Edição online do jornal Público de 11/06/2012


Por: Armanda Zenhas

In: Educare

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