Na sequência dos Ciclos de Sábado “Falando com quem faz”, organizados pela PIN - Pró Inclusão: Associação Nacional de Docentes de Educação Especial, decorreu, no passado sábado dia 2 de março, a segunda sessão com a temática “Medidas Educativas”.
O anfiteatro da Escola Básica S. Vicente, em Telheiras, ficou repleto com mais de cem docentes, pais e outros técnicos que aderiram à iniciativa. A dinamizar esta sessão esteve presente a Diretora de Serviços da Educação Especial e Apoios Educativos da Direção-Geral da Educação, Dr.ª Filomena Pereira.
No início da sessão foi enfatizado o percurso histórico do que o país tem feito face à inclusão, as medidas governamentais aplicadas desde os anos 60 até à legislação atual. Preconizando a educação especial como a recuperação e a integração do individuo pleno de direitos, foi apresentado como deverá ser feito esse processo de inclusão no acesso à escola de todos os indivíduos.
Foram abordadas as políticas recentes na organização da educação especial na escola, referindo-se que esta, tendo mais recursos do que utiliza, cabe-lhe as decisões na procura de recursos que sejam significativos para a mudança. Nesse sentido foi abordado o Decreto-Lei n.º 176/2012 não específico para a educação especial mas como forma de reconhecimento e identificação de direitos face a necessidades diferentes. Foi enfatizado o preâmbulo do decreto-lei 3/2008 e a importância duma operacionalização bem-sucedida no processo de inclusão.
Foi sobejamente valorizada a importância do conhecimento da legislação e o enquadramento de medidas com transparência e contextualização não esquecendo sempre os intervenientes no processo.
A título de exemplo foram apresentadas pela Dr.ª Filomena Pereira algumas “checks list”, elaboradas por diversos Agrupamentos de Escolas, no sentido do levantamento das possíveis adequações curriculares para cada aluno.
Durante a apresentação da dinamizadora e também na segunda parte da manhã (destinada a questões e debate) constata-se que o atual decreto, (pelo qual se rege a educação especial), já com quatro anos de vida, ainda não é consensual, quer no seu âmbito global, bem como ao nível específico da aplicação das medidas educativas. Aliás, isso foi visível nos dados apresentados pela Dr.ª Filomena Pereira, através de alguns itens mais comuns elencados nos relatórios da DGE no acompanhamento às escolas: Fraca articulação entre os docentes do departamento (essencialmente quando o coordenador não é da educação especial); Falta de informação entre os intervenientes; Escolas com situações díspares, quer no processo de referenciação, quer na avaliação; Incongruência na aplicabilidade das adequações curriculares tendo em conta o currículo comum; Pouca articulação entre a Intervenção Precoce e a Educação Especial.
Situação que remete para a necessidade de interpretação igualitária da legislação por todos os que a aplicam. Se a legislação não é entendida, por todos, do mesmo modo, algo é necessário fazer de forma a que não seja o bom senso a imperar evitando-se situações redundantes na aplicação das medidas.
A elegibilidade continua a ser uma dúvida face à preconização da utilização da CIF para enquadrar os alunos na educação especial. O sistema atual de “caráter permanente” manifesta-se desajustado e provoca injustiças no atendimento. A CIF, insistentemente referida pelos docentes, apresenta-se como desajustada na sua aplicação educacional.
Foi ainda referida a necessidade de se ter acesso a dados oficiais de avaliação da educação especial de modo a existir uma capacidade cívica que possibilite a análise e a reflexão do que é premente mudar e fundamentar.
A portaria 275-A não é clara no seu entendimento por parte da generalidade dos docentes, talvez porque precisamente as medidas nela referidas são desajustadas na sua aplicabilidade bem como contrariam a conceção educativa de escola inclusiva.
Outra questão bem premente, bastante realçada e anuída pelos presentes, é a existência de legislação diversa com falta de coerência entre as várias leis, decretos e despachos. A conflitualidade entre legislação manifesta-se como uma barreira, não só porque em muitos casos é pouco explícita, como também apresenta contrariedades. Existindo uma política com a premissa de educação inclusiva, a legislação e os esclarecimentos, por exemplo para as Provas de Exame, não corroboram essa premissa. Os exames, no modo como estão concebidos, discriminam de forma negativa os alunos contrariando em muitos casos as medidas educativas preconizadas no seu PEI, aplicadas ao longo do ano letivo. Foi referida a necessidade de se criar segurança nos docentes e nas famílias por parte das estruturas ministeriais de modo a não existirem ciclicamente alterações que causam dúvidas e, em muitos casos, apresentam-se contraditórias
As acomodações/modificações necessárias realizar nos diferentes elementos do currículo, quer ao nível das estratégias, recursos, metodologias e a organização e gestão do espaço nas adequações ao currículo (ou seja, adequações curriculares), não são as situações mais prementes na aplicação do decreto, mas sim as suas diferentes perspetivas e enquadramentos.
A grande tónica deste momento de partilha foi, sem dúvida, a necessidade de medidas intermédias para alunos que, não obstante terem alguma autonomia cognitiva, não se enquadram em currículos que os afastam da frequência de um curso e, na atual exigência de metas de aprendizagem, não acedem também ao currículo comum por diversificadas situações. Foi consensual entre os presentes a necessidade de uma medida intermédia entre as adequações curriculares e os CEIs.
Em jeito de síntese, pode-se referir que a reflexão não se esgotou nesta manhã. A conceção legislativa e sua aplicação prática ainda apresentam assimetrias, suscitando dúvidas que derivam de diferentes interpretações.
Deve-se, pois, propor ao cidadão o debate, devolvendo segurança aos alunos, às famílias e às escolas na premissa de que o direito à educação inclusiva é um investimento social que tem um retorno significativo.
Por: Elvira Cristina Silva
In: Editorial da Newsletter de março de 2013 (1ª QUINZENA) da Pró-Inclusão
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