Uma entrevista recente da professora Teresa Paiva, reconhecida especialista em matérias relacionadas como o sono, sugeriu-me estas notas dirigidas, sobretudo, para o universo dos mais novos.
Em primeiro lugar, deve sublinhar-se, sem nada de novo, evidentemente, que a qualidade do sono, tantas vezes negligenciada, é um dos mais importantes contributos para o bem-estar geral de crianças e adolescentes, incluindo a sua vida escolar, uma fonte de preocupações para pais e educadores sempre presente.
A relação entre os estilos de vida e as rotinas, higiene e qualidade do sono de crianças e adolescentes é conhecida e estudada, mas, deve dizer-se, nem sempre parece devidamente considerada. Também entre nós, vários estudos sobre os hábitos e padrões de sono em crianças e adolescentes têm sido desenvolvidos, designadamente pela professora Teresa Paiva com resultados que deveriam ser considerados.
Neste universo, em 2013 um estudo da University College of London mostrava o impacto negativo que a ausência de rotinas como deitar com regularidade à mesma hora podem ter no bem-estar e saúde das crianças afectando, por exemplo, o processamento da aprendizagem. Na mesma linha, outras investigações referem que mais de metade dos adolescentes inquiridos apresenta quadros de sonolência excessiva e evidencia hábitos de sono pouco saudáveis.
Um estudo recente realizado nos EUA que acompanhou durante seis anos 11.000 crianças encontrou fortes indícios de relação entre perturbações do sono e o desenvolvimento de problemas de natureza diferenciada no comportamento e funcionamento das crianças.
Esta constatação vai no mesmo sentido de outros trabalhos com crianças mais novas. A falta de qualidade do sono e do tempo necessário acaba, naturalmente, por comprometer a qualidade de vida das crianças e adolescentes. Todos nos cruzamos frequentemente nos centros comerciais, por exemplo, com crianças, mais pequenas ou maiores, a horas a que deveriam estar na cama e que, penosa mas excitadamente, deambulam atreladas aos pais.
Várias investigações sugerem que parte das alterações verificadas nos padrões e hábitos relativos ao sono remetem para questões ligadas a stress familiar e sublinham o aumento das queixas relativas a sonolência e alterações comportamentais durante o dia.
É certo que as situações de stress familiar serão importantes mas parece-me necessário não esquecer alguns aspectos relacionados com os estilos de vida, quer com as rotinas, quer com a utilização mais ou menos regulada das novas tecnologias. Durante o dia, as crianças e adolescentes passam boa parte do seu tempo saltitando de actividade para actividade, passam tempos infindos na escola e, muitos deles, além de pressionados para resultados de excelência transportam ainda, frequentemente, tarefas escolares para casa.
Neste contexto, é também relevante considerar o número, alguns estudos sugerem cerca de 50%, de crianças e adolescentes até aos 15 anos que terão computador ou televisor no quarto, além do telemóvel.
Acontece que durante o período que seria dedicado ao sono, sem regulação familiar, muitas crianças e adolescentes estarão diante de um ecrã, computador, televisão ou telemóvel. Como é óbvio, este comportamento não pode deixar de implicar consequências durante o dia – sonolência e distracção, ansiedade, agitação e, naturalmente, o risco de falta de rendimento escolar num quadro geral de pior qualidade de vida frequentemente constatado e relatado por educadores e professores.
Creio que, com alguma frequência, os comportamentos dos miúdos, sobretudo nos mais novos, que são de uma forma aligeirada remetidos para o saco sem fundo da hiperactividade e problemas de atenção, estarão associados aos seus hábitos e padrões de sono como, aliás, os estudos parecem sugerir.
Estas matérias, a presença das novas tecnologias na vida dos mais pequenos, são problemas novos para muitos pais, eles próprios com níveis baixos de literacia informática. Considerando as implicações sérias na vida diária importa que se reflicta sobre a atenção e ajuda destinada aos pais para que a utilização imprescindível e útil seja regulada e protectora da qualidade de vida das crianças e adolescentes.
Aliás, a experiência mostra-me que muitos pais desejam e mostram necessidade de alguma ajuda ou orientação nestas matérias bem como, naturalmente, solicitam apoio e orientação na promoção e instalação de estilos de vida, qualidade e hábitos do sono, por exemplo, mais saudáveis para e com os seus filhos.
Por: José Morgado
In: Público
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