No dia 10 de Abril deste ano de 2012 foi publicado pela OCDE um relatório sobre Educação. Um relatório sobretudo sobre as reprovação, vulgo “chumbos”. Antes de mais este relatório lembra-nos que Portugal, juntamente com a Espanha, a França e o Luxemburgo, são os campeões dos chumbos. Que triste record ! E triste porquê? Por três razões:
Em primeiro lugar porque o “chumbo” (que lembra a morte de animais selvagens por caçadores), não tem qualquer relação com a qualidade de ensino. Poderíamos pensar que são os professores mais exigentes os que mais chumbam. Completamente errado! Os melhores professores são os que melhor ensinam e, ensinando melhor, originarão certamente menos chumbos. Lembro um caso verídico em que um colega meu da Universidade se gabava publicamente de ter 60% de chumbos na sua cadeira. Dizia isto com ar ufano e com uma crítica implícita aos “facilitistas” que tinham taxas de reprovação residuais. Foi então que um dos presentes na reunião que tinha estudado nos Estados Unidos lhe disse: “O colega tem muita sorte em ensinar em Portugal: se fizesse isso no MIT era despedido de imediato. Lá não se admitem essas taxas de reprovação”. É preciso e urgente que não associemos a reprovação à exigência ou à qualidade educativa.
Em segundo lugar há uma perspectiva ingénua sobre o “chumbo”: ele irá, castigando o aluno, dar-lhe mais motivação para estudar mais. Esta ideia pode estar muito difundida mas é errada. O “chumbo” não melhora a motivação: piora a auto-estima, potencia o abandono escolar e, falando em tempo de crise, é um enorme desperdício de dinheiro e recursos. Os efeitos da reprovação sobre a criança (abandono do seu grupo/turma, imagem de “burro”, representação da escola como lugar de punição, etc.) são de tal forma gravosos que não se pode chamar senão triste a este record.
Em terceiro lugar, sabemos que a reprovação tem destinatários anunciados. Sabemos que as crianças oriundas de meios socioculturais desfavorecidos são os alvos preferenciais dos chumbos disparados pela escola. E o que quer isto dizer? Quer dizer que a escola se presta à triste incumbência de certificar e de justificar “objetivamente” a exclusão que estas crianças e suas famílias são vítimas há muito tempo. O chumbo cria exclusão mas, em muitos casos é uma mera certificação da exclusão já existente.
A alternativa ao chumbo não é o “fechar os olhos e passar todos”. É o contrário: “é abrir os olhos para ver” que as crianças partem de vivências diferentes, aprendem de formas diferentes e que toda a tentativa de as homogeneizar dá asneira. Asneira porque cria chumbos – que são sinónimo de falta de qualidade e de justiça social - asneira ainda porque a procura da homogeneidade impossibilita ver a diversidade. A riqueza da diversidade.
A alternativa é certamente criar nas escolas melhores estruturas de apoio à aprendizagem. Sabemos que todos os alunos, em diferentes disciplinas e em diferentes fases do seu percurso académico, podem experimentar dificuldades. É preciso responder a essas dificuldades de forma atempada, preventiva e eficaz para que elas não se instalem e possam ser ultrapassadas.
O caminho para a melhoria da qualidade do nosso sistema educativo é incompatível com a taxa de reprovações que temos atualmente. Era importante que todos nós (responsáveis ministeriais, professores, pais, etc.) soubéssemos que os sistemas educativos que têm uma efectiva qualidade são aqueles que prestam mais atenção aos alunos que, por diferentes razões, podem ter dificuldades. E atender estas dificuldades não é falar mais alto ou dizer o mesmo mais vezes: é ir ao encontro do aluno e ensiná-lo de forma diferente. Penso que esta é uma boa reflexão agora que se fala que os alunos com necessidades educativas especiais vão ser avaliados com a mesma prova de todos os outros. Será para batermos o nosso próprio record?
Por: David Rodrigues
Presidente da Pró-Inclusão – Associação Nacional de Docentes de Educação Especial
In: Newsletter da 1ª quinzena de abril da PIN-ANDEE
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