quinta-feira, 13 de setembro de 2012

O peso das expectativas

Quando os outros, nomeadamente os mais novos, percebem que deixamos de acreditar neles, a probabilidade de eles desinvestirem aumenta exponencialmente.



Porque existem muitos "Calvins" nas nossas escolas, faz todo o sentido começar este ano letivo pensando nas nossas expectativas e no peso que elas têm na vida daqueles que nos rodeiam. Quando os outros, nomeadamente os mais novos, percebem que deixamos de acreditar neles, a probabilidade de eles desinvestirem aumenta exponencialmente. Ao contrário, os educadores, em geral, e os professores, em particular, podem operar autênticos prodígios nos seus educandos ou alunos, ao comunicarem-lhes expectativas positivas de realização escolar.

Em 1968, dois psicólogos, Rosenthal e Jacobson, lançaram para a discussão científica o poder das expectativas de autorrealização, numa obra clássica, "O pigmaleão nas escolas". Neste livro, os autores tentaram demonstrar que as expetactivas positivas junto de alunos ditos "fracos" poderiam ajudá-los a obter melhor rendimento escolar e que, pelo contrário, expectativas negativas comunicadas a estudantes com excelente rendimento afetavam negativamente o seu aproveitamento. Claro está (e quem trabalha nas escolas sabe ainda melhor disso) que este efeito é limitado; a investigação diz mesmo que é moderado. De qualquer forma, o importante a reter é que há mensagens que, embora sejam aparentemente inócuas ao serem captadas acabam por influenciar os outros. Passo a contar duas histórias reais de alunos problemáticos do 6º ano, que ilustram o que atrás foi mencionado.

No final do ano letivo, quando saíram os resultados dos exames de Português, cruzei-me com uma professora visivelmente satisfeita. Dizia-me ela, a propósito de um aluno seu, muito problemático, que tinha sido também acompanhado por mim: "Tu acreditas que ele teve positiva no exame de Português? Tinha-lhe dito no final do ano: "Vou dar-te positiva na pauta, mas tu terás de te esforçar para tirar positiva no exame," Sabes o que vou fazer agora mesmo?". E continuava ela: "Vou telefonar-lhe e dizer-lhe que fiquei muito satisfeita por ele ter cumprido o que me prometera." Não tenho dúvida de que este incentivo da professora e o facto de o aluno ter percebido que ela acreditava nele tiveram um efeito positivo na nota final! Claro que esta nota foi também fonte de grande satisfação para mim, dado que, ao longo do ano, reforcei continuamente a mensagem de que ele poderia terminar o 6º ano com sucesso. 

No 2º período do ano letivo anterior, reuni com um aluno cujo comportamento era desinteressado e perturbador, com a sua diretora de turma e com a mãe, sua encarregada de educação. O objetivo desta reunião era encontrar estratégias para ajudar o aluno a alterar o seu comportamento, implicando, esta alteração, a colaboração da mãe. Depois de analisada a situação e apresentadas sugestões, a mãe, para nossa surpresa, afirmou: "Eu desisto, a partir de hoje nada farei para alterar o comportamento do meu filho, estou cansada disto e ele agora que se arranje." Face a estas palavras, o aluno chorou copiosamente e manteve um comportamento desajustado até ao final do ano. Atendendo a que a mãe não voltou a comparecer na escola e não atendia os telefonemas da diretora de turma, tudo indica que cumpriu o que verbalizara naquela reunião. Quando posteriormente procurei desmontar o significado daquelas palavras junto deste aluno, ele respondeu novamente com um choro incontrolável! O ano letivo terminou com a sua retenção no 6º ano.

Com esta descrição não quero desvalorizar outros factos que ao longo do ano foram interferindo na vida destes alunos. Quero apenas mostrar que as nossas expetativas, ainda que não verbalizadas, efetivamente acabam por ter um peso na vida dos que nos rodeiam.

Como diria William Thomas, sociólogo americano, nós somos aquilo em que acreditamos. Portanto "quando os homens consideram as situações reais, elas serão reais nas suas consequências" (Teorema de Thomas- 1928).  

In: Educare

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