O relatório da UNESCO “Educação para todos 2000-2015: Resultados e Desafios” publicado em Londres a 9 de abril passado é um documento importantíssimo para o conhecimento e reflexão sobre a situação atual da Educação para Todos e em especial para os alunos com condições de deficiência. Neste relatório é reconhecido que “a marginalização é maior para alunos com condições de deficiência” e que “a condição de deficiência aumenta o risco de exclusão educacional.”.
Este relatório aponta também diferenças dentro das condições de deficiência ao constatar que “crianças com deficiências auditivas e visuais têm uma melhor escolarização quando comparadas com alunos com deficiência intelectual ou problemas de comunicação”.
O relatório não fica por aqui: reconhece que a Declaração de Salamanca, publicada pela UNESCO há 20 anos, a Convenção sobre os Direitos das pessoas com Deficiência, as declarações de âmbito regional facilitaram a adoção de medidas políticas e de direitos a favor da inclusão mas ainda que muitos países tenham iniciado processos de transição do “modelo médico” para o “modelo social” da deficiência, muitos países ainda se apoiam numa infraestrutura de “educação especial” e não de inclusão.
Estes relatórios têm uma extraordinária importância para fortificar as nossas crenças sobre a educação de alunos que têm condições de deficiência ou dificuldades.
Chamo a atenção pra três aspetos:
Parece muito surpreendente que alunos que têm claramente dificuldades na escolarização recebam menor atenção e usufruam de menos oportunidades educativas. É como se procurássemos curar uma planta seca com privação de água. Pelo contrário: os alunos com mais dificuldades precisam de mais e melhor educação como mostra este relatório.
Parece também muito evidente que há tipos de dificuldades que são mais desafiadoras do status da escola. As dificuldades que implicam a mudança do currículo ou de aspetos habituais e rotineiros da escola são consideradas mais difíceis do que aquelas que permitem à escola manter a sua rotina de programa e de métodos de ensino. É como se tivéssemos uma segregação adicional dentro de grupo já segregado.
Finalmente, encontramos a persistência do “modelo médico” que acha que o problema está nos alunos e pode ser resolvido como se fosse uma doença. Este modelo tem uma consequência lógica: se o problema está na pessoa e na sua cura o melhor é isolá-la. Sabemos hoje que este modelo não só é incorreto sob o ponto de vista conceptual mas também sobre a perspetiva de intervenção. Agrupar pessoas com dificuldades não é uma opção educacional: é um ato de segregação e de injustiça social.
Estes relatórios ajudam-nos a consolidar as nossas convicções sobre a necessidade e mesmo urgência de refundar a escola sobre princípios de equidade e de inclusão. É isso que “contra ventos e marés” somos chamados a fazer. Hoje, amanhã e depois de amanhã. Sempre.
Somos convocados para fazer a nossa parte sendo profissionais exigentes e competentes e não nos demitindo da defesa intransigente dos alunos que, por terem maiores dificuldades, têm ainda que arcar com a gigantesca carga de pensarem que eles precisam de menos educação ou de uma educação de menos qualidade. Estes são os alunos que nos desafiam para usar o melhor que sabemos, para usar os melhores recursos que temos, para sermos o melhor que podemos ser. Assim mesmo.
Por: David Rodrigues
Presidente da Pin-ANDEE
In: Editorial da Newsletter nº 84 da Pró-Inclusão: Associação Nacional de Docentes de Educação Especial
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