quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

ORIENTAÇÃO VOCACIONAL, QUALIFICAÇÃO E ENSINO PROFISSIONAL. Alguns equívocos

A definição dos recursos humanos da rede de Centros para a Qualificação e o Ensino Profissional, está a levantar um conjunto de inquietações designadamente no que respeita ao papel e condições de colaboração dos psicólogos, poucos, que existem nos Serviços de Psicologia e Orientação das escolas e agrupamentos. Não é este o espaço para as analisar com pormenor mas algumas das questões levantadas não me surpreendem, o MEC é coerente, se desenvolve políticas incompetentes em diferentes domínios, porque milagre ou mistério haveria de acertar agora ao "organizar" um trabalho que manifestamente não conhece e assenta em alguns equívocos que tenho referido desde a criação destes Centros. Retomo, pois, algumas notas.

A portaria instituidora dos Centros para a Qualificação e o Ensino Profissional, em substituição dos Centros Novas Oportunidades, estabelece que terão também como competência providenciar “informação, orientação e encaminhamento de jovens com idade igual ou superior a 15 anos ou, independentemente da idade, a frequentar o último ano de escolaridade do ensino básico”. Esta tarefa tem sido competência dos Serviços de Psicologia e Orientação (SPO). O MEC definiu que em escolas ou agrupamentos que em coexistam os novos Centros e os SPO, estes deveriam articular-se. Percebe-se agora como deve acontecer essa articulação. Voltemos aos equívocos.

Os CNO tinham uma população alvo maioritariamente fora da idade de escolaridade obrigatória que estava fora do alcance dos SPO. No quadro que se desenhou aos Centros para a Qualificação são-lhes atribuídas as mesmas competências que aos SPO o que parece pouco adequado, considerando o alargamento da escolaridade obrigatória para os 18 anos e o agrupamento de escolas.

Os SPO existentes e os recursos que integram, designadamente psicólogos, são manifestamente insuficientes para assegurar as suas competências genéricas, falatariam umas centenas se consierarmos os rácios internacionalmente praticados. Creio que desde 1997 não existe um concurso para os psicólogos dos SPO. Os psicólogos nos anos mais recentes são contratados para projectos de apoio ao insucesso ou contatados pelas próprias escolas não constituindo, obviamente, uma rede consistente e séria de Serviços de Psicologia e Orientação. Os Centros agora criados, sobretudo os que se situarão em escolas são direccionados fundamentalmente a intervenção no âmbito da qualificação e do ensino profissional tal como a sua própria designação sugere deixando de lado todo o conjunto importante de competências atribuídas aos SPOs, se existissem, evidentemente. Onde existem, espera-se a "articulação" agora desenhada.

Neste quadro e tal como parece ser a orientação do MEC existe ainda um enorme equívoco sobre a tarefa de orientação vocacional.

O MEC, atente-se nos discursos, parece entender por orientação vocacional a "selecção" dos alunos que frequentarão ensino profissional ou a sua versão em modo dual. Este processo de "selecção" é relativamente claro, são "seleccionados" fundamentalmente os alunos com insucesso escolar, os que "não têm jeito para escola".

Acontece que orientação vocacional, em termos muito sintéticos, é uma intervenção, por princípio destinada a todos os alunos (sendo que muitos dela não necessitarão), com ou sem insucesso, que os ajude no processo de tomada de decisão sobre o projecto de vida que querem ou podem construir.

Esta intervenção está cometida aos SPO desde que existem e quando existam. Não faz sentido criar outros serviços com as mesmas competências. O que seria ajustado e racional seria a criação de uma rede adequada de SPO com intervenção em toda a escolaridade obrigatória, com os recursos minimamente capazes de responder ao conjunto alargado das suas competências de que a orientação vocacional é apenas uma das vertentes.

Os Centros de Qualificação e Ensino Profissional deveriam ter como âmbito de intervenção os programas de formação e qualificação para as pessoas fora da escolaridade obrigatória e com histórias de abandono ou insucesso. A escolaridade obrigatória é competência da educação e dos serviços da educação onde se integram os SPOs.

A situação criada está em linha com o pensamento do actual Ministério da Examinação, a educação assenta numa forma de "neodarwinismo", os bons alunos estudam e os outros vão trabalhar.

Texto de Zé Morgado

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