Algumas das questões levantadas pela FNE sobre os resultados e recomendações elaboradas pelo Grupo de Trabalho criado envolvendo o MEC e o Ministério da Solidariedade e da Segurança Social sobre a designada Educação Especial, vão ao encontro do que aqui e no Público já escrevi e afirmei. Dado que o processo de revisão de legislação e orientações políticas neste universo está em aberto será sempre oportuno chamar a atenção para alguns aspectos.
Uma primeira importante nota para a perspectiva defendida pelo Grupo de que a avaliação compete “sempre” ao Serviço Nacional de Saúde. Se o que está em causa é a avaliação de necessidades educativas que competências terão os serviços de saúde para tal avaliação. Existem, evidentemente, situações que requerem abordagens e avaliação multidisciplinares mas estamos no universo de competências da educação, não da saúde.
O Coordenador do Grupo de Trabalho referiu na apresentação pública do Relatório que em 2007 se realizou um estudo de prevalência de Necessidades Educativas Especiais e encontrou-se 1,8%. Como? Um estudo de prevalência? Não, apenas o tratamento descritivo de dados fornecidos pelas escolas e Direcções Regionais sem controlo sobre as avaliações, os processos e os instrumentos. Qualquer pessoa minimamente conhecedora deste universo sabe que os valores de prevalência aceites internacionalmente e que servem de base, por exemplo, à gestão de recursos humanos necessários à resposta educativa estão muito longe destes valores. Claro que o Grupo assume o discurso oficial que vai fazendo escola entre nós, "a realidade está enganada, nós é que estamos certos".
Aliás, o Grupo conclui o que toda gente que conhece as escolas sabe que se passa. As crianças e jovens têm dificuldades e como não existem apoios disponíveis a não ser que passem o crivo da "elegibilidade", em muitas situações os alunos são "administrativamente" "avaliados" como apresentando NEE permanentes (que não deveria servir de critério), a única forma de lhes garantir algum apoio. Esta situação, não tem a ver com a prevalência e muito menos com uma taxa de 1,8%, tem a ver com ausência de respostas. Esta situação não pode ser esquecida.
O Secretário de Estado João Granjo informou ainda que não se tem verificado desinvestimento nesta área. Talvez fosse de sugerir ao Grupo e ao Secretário de Estado que lessem os últimos Relatórios da Inspecção-geral de Educação e Ciência, que lesse o parecer recente do Conselho Nacional de Educação, que oiça professores e pais, que atente na catástrofe que têm sido os dois últimos anos lectivos, com falta de técnicos, professores e funcionários, sendo ainda que muitos são colocados já tarde nas escolas e agrupamentos.
O Grupo insiste na definição de necessidades permanentes, como critério para educação especial, algo pouco sustentável, persistindo, assim, na manutenção de uma norma, a elegibilidade, para situações que obviamente não cabem numa norma "educativa" e prometeu ainda criar equipas para apoio a alunos com dificuldades de aprendizagem. Com que professores, com que recursos técnicos quando já se anunciou a intenção de baixar o orçamento para o Ensino Básico no Documento de Estratégia Orçamental.
Na verdade, o que é conhecido é preocupante embora não seja surpreendente. Como há dias afirmava, a propósito da sessão referente aos 20 anos da assinatura da Declaração de Salamanca que estabeleceu os princípios da educação inclusiva, julgo que estes tempos são pouco amigáveis para as crianças e jovens com necessidades educativas especiais (permanentes ou temporárias, seja lá isso o que for), para as suas famílias e para todos os que entendem que a sua educação de qualidade, tanto quanto possível junto dos seus colegas, é um direito e não um privilégio.
Texto de Zé Morgado
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