quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

No mundo da epilepsia: enfrentando (pre)conceitos (parte 2)

Neste artigo destacam-se duas das formas de epilepsia mais frequentes na infância: a epilepsia de ausências e a epilepsia rolândica ("benigna").

A epilepsia de ausências é uma forma de epilepsia "generalizada" (por envolver os dois hemisférios cerebrais) que surge mais frequentemente no sexo feminino (70%) e tipicamente entre os 4 e os 12 anos de idade, com um pico entre os 5 e os 7 anos de idade - início da idade escolar. Por este motivo, a história típica que leva à sua descoberta é a da criança com um desenvolvimento normal que começa a apresentar diminuição súbita no rendimento escolar e em que os professores se começam a queixar do seu défice de atenção e concentração. De facto, esta epilepsia caracteriza-se pela interrupção súbita da atividade e da consciência, durante períodos de 5-20 segundos (em média: 8-10 segundos), em que a criança fica com o olhar parado, por vezes com pestanejo e/ou automatismos periorais/faciais (movimentos da boca, por exemplo). Tudo isto surge e desaparece espontaneamente, sem que a criança se aperceba dessas "pausas" na sua atividade e tendem a ocorrer várias vezes ao dia. Apesar de ocorrerem de forma espontânea, são conhecidos fatores precipitantes como a hiperventilação voluntária (que também se utiliza como prova diagnóstica durante a avaliação da criança na consulta médica). O prognóstico é excelente, sendo um tipo de epilepsia que normalmente responde muito bem ao tratamento e tende a desaparecer na adolescência.

A epilepsia rolândia ou de pontas centrotemporais (antigamente designada como epilepsia benigna) é, também, como já foi referido, uma das epilepsias mais frequentes da infância, com início entre os 3-12 anos (com um pico entre os 7 e os 9 anos) e, em muitos casos, existe história familiar deste tipo de epilepsia. Tipicamente, estas crises surgem em crianças com um desenvolvimento normal, manifestando-se durante o sono ou ao acordar como "crises focais motoras" com origem na área cerebral designada rolândica (daí o nome da epilepsia) que é responsável pela componente sensitivomotora da face e orofaringe. Como tal, a criança apresenta movimentos da região da boca, parte da face e, eventualmente, membro superior associados a sensação de formigueiro da língua, o que a impossibilita de falar ou apenas consegue emitir sons guturais rítmicos, mantendo-se inicialmente com a consciência preservada (daí ser considerada uma crise "focal"), embora se possa "generalizar" posteriormente. Cerca de 15% das crianças só têm uma crise e 60% terão 2-5 crises. O prognóstico é excelente, mesmo sem tratamento, com duração média de dois anos. Normalmente institui-se tratamento, com boa resposta, pelo incómodo que estas crises provocam na criança e nos pais.

Em ambos os casos apresentados, a história clínica típica associada ao eletroencefalograma é suficiente para estabelecer o diagnóstico.

Uma nota final apenas para as convulsões febris dada a prevalência e receio que inspiram. Como já referido, apesar destas crises se poderem repetir perante contextos de febre, tipicamente não são consideradas epilepsia. Trata-se de convulsões que surgem geralmente entre os 3 meses e 5 anos de idade, associadas à febre e de carácter benigno. E será que poderão ser o primeiro sinal de que a criança virá a ter epilepsia? De modo geral, a maioria das crianças com convulsões febris apresenta apenas um único episódio durante a vida (cerca de 70% dos casos; mas 20% terão 2 e 10% várias). A probabilidade de virem a desenvolver epilepsia embora possa ser ligeiramente superior à das crianças sem CF permanece em valores baixos, rondando os 2% e 7%, segundo alguns estudos, dependendo da complexidade da convulsão, história familiar de epilepsia e alterações no desenvolvimento e no exame neurológico da criança. Em alguns estudos, chega-se à conclusão de que o número de crianças com epilepsia que previamente tinha tido convulsões febris era muito discreto, existindo pouca relação entre estas convulsões e a epilepsia. 

Por: Isabel Maria Santos, com a colaboração da Dr.ª Célia Barbosa, neuropediatra no Hospital de Braga

In: Educare

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Seminário "Nós e os Laços" - Viseu

Bem-vindo ao Seminário“Nós e os Laços” promovido pela Associação Nacional de Docentes de Educação Especial e pela Universidade Católica Portuguesa - Viseu. 

O evento irá realizar-se no dia 9 de março de 2013, na Universidade Católica Portuguesa - Viseu.

Neste Seminário contaremos com a presença, entre outros, do Prof. Doutor David Rodrigues, Prof. Doutor Afonso Baptista, Dr. Joaquim Colôa, Dr.ª Ana Rosa Trindade e Dr.ª Sofia Ferreira, que nas conferências e diferentes mesas abordarão as seguintes temáticas: “Temas e problemas da Educação Inclusiva” e “Transição para a Vida Pós Escolar: Que Realidade? Que Perspetivas?”.


Pode consultar aqui o PROGRAMA

Foi preocupação da Comissão Organizadora promover um evento que fosse ao encontro dos interesses e motivações de todos aqueles, que por uma razão ou outra, se encontram ligados à Educação Especial e Inclusiva, sejam docentes, famílias ou profissionais na área. 

Esperamos que se junte a nós para tornar este evento memorável. 

Contamos consigo!

O Preço das inscrições é o seguinte:

5 euros Sócios da PIN - ANDEE / Estudantes e 10 euros não sócios da PIN-ANDEE;

Data Limite de inscrição: 2 de março de 2013


Para se inscrever basta carregar neste link: Ficha de Inscrição

AÇÕES DE INTERVENÇÃO PRECOCE, REABILITAÇÃO E INTEGRAÇÃO ESCOLAR E SOCIAL DE CRIANÇAS E JOVENS COM NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS

Educação Especial

AÇÕES DE INTERVENÇÃO PRECOCE, REABILITAÇÃO E INTEGRAÇÃO ESCOLAR E SOCIAL DE CRIANÇAS E JOVENS COM NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS

Estão abertas, de 28 de janeiro a 28 de fevereiro, as candidaturas de apoio a atividades e ações destinadas a promover a educação, designadamente no âmbito da intervenção precoce, reabilitação e integração escolar e social de crianças e jovens com necessidades educativas especiais, contemplando, especialmente, as seguintes iniciativas:

a) Ações de formação para professores, educadores e outros profissionais ligados à educação;

b) Ações de formação para pais e encarregados de educação de crianças e jovens com necessidades educativas especiais, promovidas por Associações de Pais, ou outras instituições, preferencialmente ligadas a instituições de ensino.

c) Aquisição de equipamentos para melhoria da qualidade do atendimento e da aprendizagem do público-alvo;

d) Intervenções inovadoras promotoras de inclusão escolar e social. 

As candidaturas devem ser apresentadas por instituições públicas ou privadas, individualmente ou em associação, considerando-se Entidade Beneficiária do financiamento, a instituição que apresenta a candidatura e que fica responsável pela execução do projeto.

Apenas são admitidas a concurso, as candidaturas apresentadas em formulário próprio, devidamente preenchido, que reúnam os requisitos exigidos no Regulamento do concurso.

Só são aceites candidaturas on line.

A Entidade Beneficiária deverá:
preencher o formulário abaixo disponível on line, correspondente ao concurso aberto,
registar e guardar o número de processo que lhe foi atribuído.
Para completar a sua candidatura deverá, de seguida, aceder a my-file e
proceder à anexação dos documentos obrigatórios ou necessários e, se tiver dúvidas, fazer um pedido de informação.

Os documentos a anexar ao formulário da candidatura deverão ter o formato PDF ou JPG (o tamanho máximo recomendável é de 2MB). De forma a prevenir dificuldades no envio dos processos, solicita-se que seevite a sua apresentação nos últimos dias do prazo.

As candidaturas ao presente concurso devem ser enviadas para a Fundação Calouste Gulbenkian, até ao dia 28 de fevereiro de 2013.




terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Aviso de abertura do concurso extraordinário

Foi publicado, ontem o Aviso n.º 1340-A/2013, referente ao concurso externo extraordinário de seleção e recrutamento de pessoal docente nos estabelecimentos públicos da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário.

Do aviso de abertura, destaco alguns aspetos mais direcionados para os candidatos às vagas de educação especial.

As candidaturas decorrem entre 29 de janeiro a 5 de fevereiro, até às 18 horas.

Constituem requisitos de admissão ao concurso externo extraordinário: 

a) Exercício efetivo de funções docentes com qualificação profissional, em pelo menos 365 dias, nos 3 anos letivos imediatamente anteriores ao da data de abertura do presente concurso, em regime de contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo;

b) Possuir as habilitações profissionais legalmente exigidas para a docência no nível de ensino e grupo de recrutamento a que se candidatam;

f) Ter obtido avaliação de desempenho com menção qualitativa não inferior a “Bom”, nos anos a que se refere a alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 7/2013, de 17 de Janeiro, desde que o tempo de serviço devesse ser obrigatoriamente avaliado nos termos da legislação ao tempo aplicável.

A habilitação para a educação especial é conferida por uma qualificação profissional para a docência acrescida de uma formação na área da Educação Especial titulada pelos cursos constantes na Portaria n.º 212/2009, de 23 de fevereiro.

O tempo de serviço declarado no formulário de candidatura é contado até 31 de agosto de 2012.

O tempo de serviço prestado pelos docentes nos grupos de recrutamento 910, 920 e 930, releva também para graduação no grupo de recrutamento ao qual os docentes se candidatam.

São excluídos os candidatos que preencham incorretamente os elementos necessários à formalização da candidatura, nomeadamente:

2.16 — A data de conclusão da formação especializada;
2.17 — A classificação da formação especializada;
2.18 — A designação da formação especializada;
2.19 — O domínio de especialização;

São também excluídos do concurso os candidatos que não apresentem documentação comprovativa dos elementos constantes da candidatura, nomeadamente:

3.19 — A data de conclusão da formação especializada;
3.20 — A classificação da formação especializada;
3.21 — A designação da formação especializada;
3.22 — O curso de formação especializada em educação especial devidamente acreditado pelo Conselho Científico-Pedagógico da Formação Contínua, nos termos da Portaria n.º 212/2009, de 23 de fevereiro;
3.23 — O domínio abrangido pelo estabelecido na Portaria n.º 212/2009, de 23 de fevereiro;

Via: Incluso

O que se ensina quando se avalia?

O processo de avaliação em Educação é um dos dossiers mais controversos e difíceis. Há muitos anos que numerosos professores dizem que é a parte mais desagradável e difícil do seu trabalho; “gosto de ensinar mas não gosto de avaliar”. Desagradável sim mas igualmente necessária. Seria absurdo que tivéssemos de repousar exclusivamente em opiniões fossem elas dos professores, dos alunos, da gestão da escola, dos pais, etc. para aquilatar da qualidade do ensino e da Educação. A necessidade de avaliação é inquestionável e penso que nunca os profissionais e os estudiosos de Educação a puseram em causa. A questão não é tanto se é precisa a avaliação mas sim que avaliação é precisa para poder ser útil para o progresso do sistema educativo. 

Certamente que uma das componentes mais significativas da dificuldade que os professores sentem em avaliar os alunos deve-se a uma separação entre o que é o ensino (o que o professor ensina) e a aprendizagem (o que o aluno aprende). Raramente a avaliação consegue, se for exclusivamente centrada no ensino, captar toda a extensão do processo de aprendizagem. E por isso os professores ficam frequentemente desiludidos e mesmo com algum sentimento de injustiça ao aplicar as regras que lhes são indicadas ou que eles mesmo indicam a si próprios. Uma avaliação que só avalie o que foi ensinado corre o risco de não avaliar o que foi e sobretudo como foi aprendido. 

Assim, precisamos de processos de avaliação que incidam sobre as oportunidades de aprendizagem que foram proporcionadas aos alunos e para isso é necessário que o processo seja holístico. Queremos dizer com holístico, um processo que permita identificar objetivamente todas as aquisições que o aluno fez no contexto da escola e isso inclui não só os conteúdos que foram aprendidos, mas também as competências, as estratégias de abordagem aos problemas e as capacidades de cooperação. É evidente que a avaliação faz parte do processo educativo. Seria um erro grave separar um do outro: o que avalio e a forma como avalio está intimamente ligada ao que se ensina e como se ensina. É pois legítimo, considerando esta continuidade de objetivos e processos entre o ensino e a avaliação perguntar o que é que se ensina quando se avalia. Imaginemos que o processo de avaliação incide sobre situações e competências estranhas àquilo que foi aprendido. Por exemplo: foi ensinado aos alunos como resolver problemas equacionando-os, foi-lhes ainda por exemplo ensinado que pode haver diferentes possibilidades de solução para um projeto. Posto isto, a avaliação incide sobre a aplicação de uma solução padronizada e única. Bom, o que se ensina quando se faz esta avaliação? Ensina-se que a única coisa que interessa é reproduzir o que esperam de nós e que o resto são fantasias inúteis e até prejudiciais. 

Avaliar significa “dar, atribuir valor”. A avaliação significa assim que se vai dar valor àquilo que o estudante aprendeu e, por isso, é antes de mais um processo de reflexão sobre o caminho, sobre os resultados, sobre os sucessos e os insucessos do processo de ensinar e de aprender. Também sobre o empenhamento e a forma como se rentabilizaram as capacidades e as motivações dos estudantes e as estratégias de ensino. Numa altura em que tanto se valorizam as avaliações com a criação de exames suplementares na carreira do aluno cabe então perguntar se estas avaliações não têm uma mensagem implícita que pode significar o reforço e a valorização de uma pedagogia que nem parte do aluno e muitas vezes nem tem a sincera e comprometida intenção de a ele chegar. O aumento dos momentos de avaliação da forma como está a ser feita atualmente, ignora o processo de aprendizagem. A mensagem é capciosa mas clara: para se atingir fins importam pouco os meios. 

Por: David Rodrigues 
Presidente da Pró-Inclusão- ANDEE

In: Editorial da newsletter da Pró-Inclusão: Associação Nacional de Docentes de Educação Especial (2ª quinzena de janeiro)

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Ciclo de Sábados


A Associação Nacional de Docentes de Educação Especial vai dar início ao novo ciclo de sábados "Falando com quem faz" já no próximo sábado dia 2 de fevereiro.

"Este ciclo já está acreditado pelo CCPFC com 0,6 créditos e conta com a presença de um elemento da Direção Geral de Educação para melhor nos elucidar sobre as medidas educativas. Pretendemos ainda realizar no ultimo sábado do ciclo (18 de maio) um simpósio sobre Educação Especial e Inclusiva em Portugal para o qual foram convidados Seamus Hegarty (Reino Unido), Mª Emília Brederode(CNE), Pedro Cunha(DGE), Margarida Almeida (AR).

Faça já a sua inscrição para o e-mail proandee@gmail.com.

Para os associados com quotas regularizadas é gratuito o ciclo e para os não associados o valor é de 10€."


Local: Escola Básica S. Vicente de Telheiras 
Rua Fernando Namora   (mesmo em frente ao Parque dos Príncipes)
1600 - 454 Lisboa
Universidade Católica
Travessa Palma  1600 Lisboa

O frio da infância

Felizmente, como se diz cá em casa a pensar nos campos do Meu Alentejo, vai um Inverno como os de antigamente, com chuva e frio.

A propósito do frio mas também por outras razões tenho-me lembrado com muita frequência do frio da infância, uma expressão retirada da narrativa de Juan José Millás em O Mundo quando enuncia, “Quem teve frio em pequeno, terá frio para o resto da vida, porque o frio da infância nunca desaparece”.

Na verdade, no Inverno ou no Verão existem muitos miúdos que passam frio, às vezes muito frio, e nem sempre conseguimos dar por isso. Acontece até que alguns deles sentem frio em ambientes muito aquecidos ou mesmo no Verão, como disse. Não se trata do frio que vem de fora, daquele de que falam os alertas coloridos que nos fazem por esta época de Inverno, é o frio que está à beira, um bloco de gelo disfarçado de família ou de instituição de acolhimento, é o frio que vem de dentro e deixa a alma congelada. Do frio que vem de fora, apesar de incomodar, acho que, quase sempre, nos conseguimos proteger e proteger os miúdos, mas dos frios que estão à beira e dos que vêm de dentro nem sempre o conseguimos fazer porque também nem sempre os entendemos ou estamos atentos ao frio que tolhe muitas crianças e adolescentes.

É também o frio que se percebe em milhares de miúdos que estão a passar mal, como fala a gente, miúdos que chegam à escola com fome. Miúdos para os quais a escola já tem que também alimentar o corpo. Muitos destes miúdos têm pequeno-almoço quando chegam à escola e alguns outros, como em Elvas, recebem ainda o jantar quando saem da escola. Miúdos para os quais as escolas mantêm abertas no período de férias as cantinas escolares que lhes assegura o aconchego do sustento. Miúdos de famílias que batem à porta das cantinas sociais e dependem da resposta das instituições de solidariedade social para assegurar a sobrevivência.

A pobreza que ameaça os miúdos é gelada. Há algum tempo, um estudo do ISEG apontava para que cerca de 40% das crianças e adolescentes vivessem em risco de pobreza, sendo que esse quadro de privação afecta sobretudo os padrões e a qualidade da alimentação. O estudo sublinhava também, entre outros indicadores, que o grupo etário 0-17 anos é o mais vulnerável ao risco de pobreza tendo ultrapassado o dos mais velhos.

As perspectivas para o futuro próximo não parecem particularmente animadoras. Sabemos que estamos num período económico recessivo, sem criação de riqueza e que devido aos baixos salários, continuamos um dos países mais assimétricos da Europa pelo que ter trabalho nem sempre é suficiente para fugir ao risco de pobreza. Recordo um trabalho de Agostinho Silvestre apresentado no VII Congresso Português de Sociologia referindo que o facto de se ter trabalho já não constituir factor de protecção contra a pobreza. Em 2010, 12% dos trabalhadores portugueses viviam abaixo do limiar de pobreza e 16% das pessoas que em 2011 usufruíram do Rendimento Social de Inserção (35.015), acumularam esse apoio com rendimentos do trabalho, o que significa aumento da pobreza entre pessoas com trabalho.

Os indicadores sobre as dificuldades que afectam a população mais nova são algo de preocupante. Esta realidade não pode deixar de colocar um fortíssimo risco no que respeita ao desenvolvimento e sucesso educativo destes miúdos e adolescentes e portanto, à construção de projectos de vida bem sucedidos. Como é óbvio, em situações limite como a carência alimentar, estaremos certamente em presença de outras dimensões de vulnerabilidade que concorrerão para futuros ameaçados.

É também por questões desta natureza que a discussão aberta sobre as funções do estado e o seu financiamento deve ser informada.

Relembro a história que vivi há uns anos em Inhambane, Moçambique, quando ao passar por uma escola para gaiatos pequenos o Velho Carlos Bata me dizer que se mandasse traria um camião de batata-doce para aquela escola. Perante a minha estranheza explicou que aqueles miúdos haveriam de comer até se rir, “só aprende quem se ri”, rematou o Velho Bata.

Pois é Velho, miúdos com fome, não riem, não aprendem e vão continuar pobres.

Apesar de sentir confiança na resiliência dos miúdos, expressa em muitíssimas situações de gente que sofreu e resistiu a experiências dramáticas, uns mais que outros naturalmente, parece-me fundamental que estejamos atentos aos frios da infância.

Muitas vezes, como diz Millás, quem teve frio em pequeno terá mesmo frio no resto da vida. Quando olhamos para muitos adultos à nossa volta parece também claro o frio que terão passado na infância.

Artigo de Opinião: José Morgado

O autor é professor e investigador do Instituto Superior de Psicologia Aplicada - Instituto Universitário

Teste deteta trissomias fetais com 99% de eficácia

A partir da próxima segunda-feira, as grávidas portuguesas vão passar a poder realizar um teste pré-natal inovador capaz de detetar trissomias fetais com 99% de certezas e sem a necessidade de procedimentos invasivos como a amniocentese, anunciou o laboratório Labco.

O método avançado, que chega agora a Portugal, baseia-se na análise do ADN fetal presente no sangue materno e deteta trissomias fetais em gravidezes com mais de 10 semanas de gestação, sem risco para a grávida ou para o feto, e com uma taxa de eficácia de até 99%, segundo explicou à Lusa a diretora-geral do Labco Diagnostics, Laura Brum.

De acordo com a responsável, o teste reduz até "cinco vezes" os resultados falsos positivos em comparação com outros testes, permitindo uma avaliação precisa do risco das trissomias responsáveis pela maioria das anomalias cromossómicas no diagnóstico pré-natal.

Laura Brum acredita que, com esta alternativa de diagnóstico, vai ser possível reduzir o número de amniocenteses, técnica que consiste na colheita pré-natal de fluido amniótico com o objetivo de detetar eventuais anomalias do feto, em Portugal.

O custo do teste será de 670 euros (um valor relativamente próximo do da amniocentese, que pode chegar aos 500 euros) e, apesar de ainda não ser comparticipado, a diretora-geral do Labco garante que o próximo passo é começar a "propor às seguradoras a sua comparticipação" e, talvez mais tarde, ao próprio "Serviço Nacional de Saúde".

Este exames estará disponível, numa primeira fase, em apenas quatro hospitais privados portugueses, adianta a Lusa. São eles o Hospital da Luz (Lisboa), o Hospital dos Lusíadas (Lisboa), o Hospital da Boavista (Porto), o Hospital de Santiago (Setúbal) e o Hospital Stª Maria (Faro).

O diagóstico pré-natal que chega a Portugal a 28 de Janeiro foi criado nos EUA. O método foi, posteriormente, introduzido no Reino Unido e em Espanha durante o ano passado.

[Notícia sugerida por Diana Rodrigues]

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Vagas para o concurso externo extraordinário

A Portaria n.º 22-A/2013 fixa o número de vagas atribuído a cada um dos quadros de zona pedagógica, a preencher no concurso externo extraordinário regulado pelo Decreto-Lei n.º 7/2013, de 17 de janeiro.

Para o grupo de recrutamento 910 existem 156 vagas distribuídas por todos os quadros de zona pedagógica.

Nos restantes grupos de recrutamento de educação especial, 920 e 930, existem 3 vagas declaradas para cada um.

Trata-se de vagas determinadas por quadro de zona pedagógica a concretizarem-se em vagas de quadro de agrupamento de escolas e escolas não agrupadas, no primeiro concurso interno a ocorrer imediatamente após a publicação da presente portaria e que se extinguirão quando vagarem.

Via: Incluso

Português descobriu o que acontece no cérebro antes de fazermos um movimento

Rui Costa e colegas descobriram que a decisão para fazer um movimento simples como levantar o braço depende de dois circuitos neuronais diferentes e não de um só. Descoberta pode ter implicações no tratamento de sintomas de doenças como a de Parkinson.

Luzes, neurónios, acção: foi através da observação desta sequência de acontecimentos que uma equipa de cientistas, com participação portuguesa, conseguiu mostrar que são necessárias duas rotas diferentes de células nervosas para se gerar movimento.

Utilizando uma nova técnica, Rui Costa, neurocientista que trabalha na Fundação Champalimaud, em Lisboa, e colegas, puseram em causa o que se pensava ser a função de cada uma das rotas – defendia-se que uma servia para accionar um determinado movimento, outra para inibir o mesmo movimento. Mas, afina,l o comando para começar uma acção é mais complexo, mostra um estudo publicado nesta quarta-feira na edição online da revista Nature.

O que é uma acção: levantar o braço, caminhar até à casa de banho ou saltar de uma ponte? As três, mas a terceira necessita de um processo mental mais complexo para a tomada de decisão. O tipo de acção que Rui Costa e os colegas do Instituto Nacional do Abuso de Álcool e do Alcoolismo, nos Estados Unidos, estudaram prende-se mais com as duas primeiras. São esses movimentos mais simples que são afectados por doenças do sistema nervoso como a de Parkinson ou a coreia de Huntington.

Essas doenças afectam os gânglios de base, estruturas bem definidas no cérebro compostas por células nervosas que estão abaixo do córtex. Uma das actividades que são levadas a cabo pelos neurónios destas estruturas conduz à tomada de decisão para a iniciação ou não de movimentos mais simples.

Sabia-se que dois circuitos diferentes que partem destes gânglios afectavam esta decisão. Um dos circuitos é directo e o outro tem mais intermediários e, por isso, chama-se indirecto. A doença de Parkinson, que é inibidora desses movimentos, e a coreia de Huntington, que provoca movimentos musculares descontrolados, afectam estes dois circuitos. Por isso, teorizou-se que o circuito directo servia para activar o movimento e o indirecto servia para o inibir.

Mas faltava uma observação experimental. “Nunca se conseguiu medir directamente a actividade destes neurónios”, diz Rui Costa ao PÚBLICO. O trabalho, que começou quando Rui Costa ainda estava nos Estados Unidos, ultrapassou esta dificuldade experimental e mostrou que aquela hipótese parece estar errada.

As células nervosas de cada circuito têm identidades diferentes e produzem proteínas únicas. A equipa criou ratinhos que produziam proteínas fluorescentes em cada um dos circuitos. Estas proteínas emitiam mais luminosidade quando os neurónios se activavam. Com uma pequeníssima fibra óptica instalada no cérebro dos ratinhos e ligada a um contador de fotões, os cientistas conseguiram medir a actividade dos dois circuitos neuronais separadamente.

Depois, puseram os ratinhos a iniciar um movimento e mediram a actividade do circuito directo e do indirecto. “Menos de um segundo antes de iniciar o movimento, os dois circuitos ficavam mais activos, depois iniciava-se o movimento”, conta Rui Costa. “Para iniciar um movimento consciente, é necessário os dois circuitos estarem activos”, conclui.

Os cientistas não fizeram nenhuma experiência que testasse a actividade dos circuitos quando uma acção era inibida. Só se verificou que, quando os ratinhos se mantinham parados, os dois circuitos estavam menos activos.

Não se sabe qual a função de cada um dos circuitos. Uma das possibilidades é que, enquanto um circuito está a activar uma acção, o outro acaba por inibir todas as outras, explica Rui Costa.

Mas estes resultados podem ajudar “a melhorar o tratamento dos sintomas das doenças neuronais”, diz o investigador. “O próximo passo é tentar manipular a actividade destes circuitos, de forma a controlar o movimento.”


quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Universidade do Minho cria plataforma web para prevenir doenças neurocognitivas

Investigadores da Escola de Psicologia da Universidade do Minho criaram uma plataforma na internet com perto de um milhar de exercícios, capaz de estimular o cérebro de forma a evitar o aparecimento ou a progressão de doenças neurocognitivas.

Segundo fonte da Universidade do Minho (UMinho), aquela plataforma, "grátis e pioneira em Portugal", já foi testada por meia centena de pessoas com défices neuropsicológicos associados a uma variedade de doenças neurológicas e psiquiátricas, que registaram "melhorias em termos cognitivos e cerebrais" em apenas três meses.

A utilização da plataforma obedece a recomendação de um especialista, após o que são criados o nome de utilizador e a respetiva "password" (palavra-chave) para o paciente, devidamente associado a uma instituição clínica.

O problema diagnosticado determinará o tipo de exercício a desenvolver, como treinos de memória, lógica, concentração e funções executivas, entre outros, com o objetivo de exercitar o cérebro, como se de um músculo se tratasse.

"São cerca de mil exercícios cognitivos capazes de estimular as zonas do cérebro associadas ao surgimento do AVC, da esclerose múltipla ou do Alzheimer, doenças neurológicas que atingem milhões de pessoas em todo o mundo", acrescentou a fonte.

Além disso, a plataforma está também direcionada para a intervenção em perturbações do neurodesenvovimento, como o Síndrome de Williams.

O doente é avaliado consoante o tempo despendido por sessão e o número de erros, acertos e tentativas de realização.

Quando a performance é tida como satisfatória, aumenta-se o nível de dificuldade.

Os exercícios, geridos pelo clínico, poderão ser realizados em contexto de terapia, em casa com a ajuda de familiares ou, até, a sós.

Para já, o instrumento está a ser aplicado em pacientes do Laboratório de Neuropsicofisiologia e dos hospitais de Braga, Covões (Coimbra) e Magalhães Lemos (Matosinhos).

A longo prazo, a plataforma pode também ser encarada "como estratégia de prevenção para um envelhecimento mais saudável ou, então, ser implementada em contexto escolar para colmatar o défice de atenção, considerado como uma das principais causas de insucesso escolar".

In: JN

Os cortes na Educação e a Educação Especial

Partilho o texto que é da autoria do Prof. Doutor David Rodrigues e que foi publicado ontem, no jornal Público, no formato de papel.


quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Ação de Formação “Os Porquês e o Como da Comunicação Aumentativa”

Ação de Formação

“Os Porquês e o Como da Comunicação Aumentativa”

Formador: Joaquim Colôa

Local: Agrupamento de Escolas Padre Bartolomeu de Gusmão (Escola Josefa de Óbitos) - Lisboa

Destinatários: Educadores de Infância, Professores dos Ensinos Básico e Secundário e Professores de Educação Especial

Modalidade: Curso de Formação

Calendarização: 6 mar. 2013 (16h.30 – 19h.30); 7 mar. 2013 (16h.30 – 19h.30); 13mar. 2013 (16h.30 – 19h.30); 14 mar. 2013 (16h.30 – 19h.30); 3 abr. 2013 (16h.30 – 19h.30); 4abr. 2013 (16h30 – 13h.30); 10 abr. 2013 (16h30 – 13h.30); 11 abr. 2013 (16h30 – 13h.30); 17 abr. 2013 (16h30 – 17h.30)

Nº de Horas: 25h

Unidades de Créditos: 1

Registo de Acreditação: CCPFC/ACC – 72554/12

Conteúdos:

1. Posicionamentos e funcionalidade tendo em conta a utilização de Suportes de apoio para a comunicação e a autonomia (princípios gerais):

a. As competências básicas a desenvolver de modo a evitar determinadas incapacidades e limitações na perspetiva da utilização de Suportes de Apoio para a comunicação;

b. Os posicionamentos de controlo base para uma utilização com qualidade de Suportes de Apoio para Informação e Comunicação;

c. Condições gerais (motoras, sensoriais e cognitivas) para a introdução dos símbolos;

d. Como interagir com indivíduos que utilizam Suportes de Apoio para a Sinalização, Informação e Comunicação de forma a tornar o processo de comunicação mais eficiente;


2. Comunicação / linguagem / fala:

a. Aspetos gerais sobre o processo de comunicação 

b. Destrinça entre comunicação, linguagem e fala 

c. Alterações na aquisição e desenvolvimento da linguagem e fala

d. Tipos de Comunicação Expressiva

e. Aspetos gerais de avaliação e intervenção.


3. Sistemas Aumentativos ou alternativos de Comunicação (SAAC)

a. Aspetos gerais ao nível do Hardware e do Software

b. Sistemas com e sem ajuda e sistemas mistos

c. Diversos tipos de seleção

d. A chave de Fitzgerald.

e. Os diversos sistemas (Bliss, Rebus, Makaton, PIC, SPC e PEC) e os seus vários suportes (manuais e informáticos)

f. Princípios gerais a ter em conta na seleção e introdução dos primeiros símbolos e aspetos específicos da introdução de alguns sistemas (Makaton e PEC).

g. A utilização de objetos na construção de Suportes de Apoio para a comunicação (os sistemas tangíveis).


4. Modelos de avaliação com vista à utilização de um Suporte de Apoio para a comunicação em contextos pedagógicos:

a. Processo de avaliação: o modelo sistémico

b. A importância de avaliar capacidades e competências específicas (motoras, sensoriais e cognitivas)

c. Processo de tomada de decisão


Valor a pagar: 50€ (associados) e 70€ (não associados)


Inscrição para proandee@gmail.com ou para o link


segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

IRREQUIETOS, CANSADOS, INSTÁVEIS OU ... COM SONO

A propósito da realização em Lisboa de um Simpósio Internacional sobre o impacto das novas tecnologias no desenvolvimento de crianças e adolescentes, um trabalho do Público sublinha o risco de alterações nos hábitos e saúde do sono motivado por uso desajustado das novas tecnologias e das consequências que daí poderão advir. Sobre esta matéria umas notas.

Um estudo recente realizado nos EUA acompanhando durante seis anos 11 000 crianças encontrou fortes indícios de relação entre perturbações do sono e o desenvolvimento de problemas de natureza diferenciada no comportamento e funcionamento das crianças.

Esta questão, os padrões e hábitos de sono das crianças, é algo de importante que nem sempre parece devidamente considerada. Também entre nós, vários estudos sobre os hábitos e padrões de sono em crianças e adolescentes têm sido desenvolvidos, designadamente pela Professora Teresa Paiva. Citando alguns desses estudos é de referir que mais de metade dos adolescentes inquiridos apresentam quadros de sonolência excessiva e evidenciam hábitos de sono pouco saudáveis. Esta constatação vai no mesmo sentido de outros trabalhos com crianças mais novas. A falta de qualidade do sono e do tempo necessário acaba, naturalmente, por comprometer a qualidade de vida das crianças e adolescentes.

Várias investigações sugerem que parte das alterações verificadas nos padrões e hábito relativos ao sono remetem para questões ligadas a stress familiar e sublinham o aumento das queixas relativas a sonolência e alterações comportamentais durante o dia.

É certo que as situações de stress familiar serão importantes mas parece-me necessário não esquecer alguns aspectos relacionados com os estilos de vida. Durante o dia, as crianças e adolescentes passam boa parte do seu tempo saltitando de actividade para actividade, passam tempos infindos na escola e, muitos deles, são pressionados para resultados de excelência. Segundo alguns estudos, perto de 50% das crianças até aos 15 anos terão computador ou televisor no quarto, além do telemóvel.

Acontece que durante o período de sono e sem regulação familiar muitas crianças e adolescentes estarão diante de um ecrã, pc, tv ou telemóvel. Com é óbvio, este comportamento não pode deixar de implicar consequências nos comportamentos durante o dia, sonolência e distracção, ansiedade e, naturalmente, o risco de falta de rendimento escolar num quadro geral de pior qualidade de vida.

Creio que, com alguma frequência, os comportamentos dos miúdos, sobretudo nos mais novos, que são de uma forma aligeirada remetidos para o saco sem fundo da hiperactividade e problemas de atenção, estarão associados aos seus hábitos e padrões de sono como, aliás, os estudos parecem sugerir.

Estas matérias, a presença das novas tecnologias na vida dos mais novos, são problemas novos para muitos pais, eles próprios com níveis baixos de alfabetização informática. Considerando as implicações sérias na vida diária importa que se reflicta sobre a atenção e ajuda destinada aos pais para que a utilização imprescindível e útil seja regulada e protectora da qualidade de vida das crianças e adolescentes.

A experiência mostra-me que muitos pais desejam e mostram necessidade de alguma ajuda ou orientação nestas matérias.

Texto de Zé Morgado

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Estudo sugere que autismo pode desaparecer

Algumas crianças com diagnóstico de autismo deixaram de ter os sintomas que caracterizam a doença. As conclusões de um estudo americano põem em causa a ideia de que se trata de uma condição incurável e para toda a vida, mas os especialistas reagem com cautela.

O estudo do Instituto Nacional de Saúde dos EUA, publicado no "Journal of Child Psychology and Psychiatry", sugere que o autismo pode desaparecer nalgumas crianças, mas não é conclusivo. São necessárias mais pesquisas para explicar estes resultados.

Deborah Fein, investigadora da Universidade de Connecticut, citada pela BBC, explica que estudou 34 crianças a quem foi diagnosticada a perturbação de autismo nos primeiros anos de vida, bem como outras 34 sem qualquer problema da mesma turma.

Os resultados da avaliação cognitiva e comportamental foram idênticos em todos os alunos. Ou seja, não foram detetados quaisquer problemas de linguagem, reconhecimento facial, comunicação ou interação - sintomas característicos do autismo.

Foram também avaliadas outras 44 crianças da mesma idade, sexo e com quoficiente de inteligência não verbal idênticos e que tinham sido sinalizadas com autismo de elevado funcionamento (também designado de síndrome de Asperger), uma perturbação que se integra no espectro do autismo, mas sem afetação de inteligência e com sintomatologia menos grave. Da comparação das crianças que revelaram já não ter sintomatologia autística com os de elevado funcionamento ficou claro que os défices sociais dos primeiros eram mais ligeiros, ainda que acompanhados de problemas graves de comunicação e comportamentos repetitivos.

Os investigadores analisaram os processos clínicos para determinar se os diagnósticos teriam sido bem estabelecidos e não foram encontrados motivos para colocar em causa a sua exatidão.

O diretor do Instituto Nacional de Saúde Mental dos EUA, Thomas Insel, considera que, embora o diagnóstico de autismo geralmente não mude com a idade, este estudo sugere que há um leque variado de possíveis resultados e que é preciso aprofundar o impacto da terapia e de outros fatores no desenvolvimento a longo prazo da doença.

O reduzido número de crianças estudadas é uma das críticas apontadas à controversa investigação. "É preciso não tirar conclusões apressadas acerca da natureza e complexidade do autismo", adverte a diretora da Sociedade Nacional do Autismo do Reino Unido. E acrescenta que "com terapia e apoio intensivos, é possível que um pequeno grupo de indivíduos com autismo altamente funcional aprendam estratégias que podem mascarar a condição e alterar os resultados dos testes". Realça, porém, que até os autores da investigação reconhecem que o autismo é condição que não se perde ao longo da vida e que é fundamental não deixar de apoiar os portadores e suas famílias.

A Associação Americana de Psiquiatria está atualmente a rever o Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais, a "bíblia" que médicos e psicólogos usam para classificar as doenças de foro psicológico. A nova versão deverá optar pela designação de "perturbação do espectro do autismo" para as diversas formas de autismo.

O autismo é uma perturbação do desenvolvimento que se manifesta por dificuldades sociais e de comunicação e padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses e atividades.

In: JN online

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

No mundo da epilepsia: enfrentando (pre)conceitos (parte 1)

A epilepsia é uma das doenças neurológicas mais frequentes no Mundo e com maior prevalência na infância e adolescência.

Quando se fala de epilepsia, fala-se de uma doença neurológica caracterizada pela ocorrência de crises (crises epiléticas) recorrentes e espontâneas, ou seja, crises que surgem subitamente e que tendem a repetir-se. Apesar de se tratar de um problema crónico, em alguns casos verifica-se remissão espontânea. É das doenças neurológicas mais frequentes no Mundo e com maior prevalência na infância e adolescência.

Antes de se prosseguir mais a fundo nesta temática, convém esclarecer o que é uma crise: a crise é um sintoma e não um diagnóstico e, como tal, pode ser a manifestação clínica de várias situações. Trata-se de uma manifestação de uma atividade cerebral súbita, inapropriada e excessiva e, assim, dependendo da área do cérebro onde ocorre essa atividade súbita (área motora, área sensitiva...), essa crise poderá manifestar-se como um distúrbio motor (por exemplo, as convulsões), sensitivo, sensorial, psíquico e/ou da consciência. 
Classicamente, para se afirmar o diagnóstico de epilepsia, são necessárias pelo menos duas crises em momentos diferentes. Convém também esclarecer que há situações em que ocorrem mais do que duas crises e que não se definem como epilepsia, como o caso das convulsões febris. 

Para dar um exemplo de uma crise motora, destaco a convulsão - episódio de contrações musculares involuntárias associadas ou não a perda de consciência. Estas contrações podem ser mantidas (tipo tónico) ou interrompidas por momentos de relaxamento de duração variável (tipo clónico). 

As crises, por sua vez, podem ser divididas em "focais" e "generalizadas". As primeiras dizem respeito a crises com origem num foco cerebral específico e apenas num dos hemisférios cerebrais e, como tal, terão uma manifestação mais concreta embora, a seguir, se possam generalizar. Já as crises "generalizadas" traduzem desde o início um envolvimento difuso e simultâneo de ambos os hemisférios cerebrais, com perda de consciência. 

Saliento, mais uma vez, que muitas vezes e provavelmente na sua maioria, as crises não têm uma base epilética (ou seja, não resultam de alteração estrutural ou funcional cerebral), mas podem ser resultado de febre (convulsão febril), infeção, enxaquecas, síncope ("desmaio" em contexto do susto/medo/stress/calor), traumatismo craniano, distúrbios do sono, espasmos de choro, "distrações" frequentes (pseudoausências), arritmias cardíacas, entre outros.

A história da crise é fundamental na avaliação da criança/jovem. Assim, é importante tentar perceber:
• em que contexto é que a crise surgiu - o que a criança/jovem estava a fazer antes da crise, se foi durante o sono ou estando acordado, se havia estímulos luminosos ou outros possíveis precipitantes; 
• O início da crise: se houve sintomas iniciais (que "anunciaram" a crise em si); 
• Como foi a crise: se se iniciou em alguma parte do corpo, se foi generalizada e nesse caso se foi desde o início ou só no fim, se a criança estava consciente, como estavam os seus olhos e se havia movimentos, quanto tempo durou; 
• Após a crise: como reagiu a criança/jovem.

A partir destas informações e após a realização do exame físico da criança/jovem decide-se se há necessidade de realizar exames e, nesse caso, quais os indicados. Perante a suspeita de epilepsia, normalmente um eletroencefalograma (EEG) é o exame indicado e, por norma, suficiente. Este exame regista a atividade cerebral e tenta detetar se há alguma área mais ativa que possa estar a causar esta crise.

Grande parte das epilepsias iniciadas na infância têm evolução favorável, com controlo satisfatório das crises ainda dentro do primeiro ano de tratamento. 

Por: Isabel Maria Santos, com a colaboração da Dr.ª Célia Barbosa, Neuropediatra no Hospital de Braga

In: Educare

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Ação de Formação Arte na Educação Especial


Ação de Formação

Arte na Educação Especial

Formador: Helena Abreu Neves/Daniela Gomes

Local: CERCICA

Destinatários: Educadores de Infância, Professores dos Ensinos Básico e Secundário e Professores de Educação Especial

Modalidade: Oficina de Formação

Calendarização: 25 fev. 2013 (17h.00 – 20h.00); 27 fev. 2013 (17h.00 – 20h.30); 2 mar. 2013 (9h.00 – 13h.30); 4 mar 2013 (17h.00 – 20h.00); 6 mar 2013 (17h.00 – 20h.00); 14 mar. 2013 (17h.00h.00 – 20h.30); 16 mar. 2013 (9h.00 – 13h.30);

Nº de Horas: 50h (25h presenciais)

Unidades de Créditos: 2

Registo de Acreditação: CCPFC/ACC –71490/12

Conteúdos:

1.Abordar e distinguir conceitos e metodologias inerentes à prática da Educação Artística, Educação pela Arte e Arte-terapia:

o Arte-terapia: Utilização da Arte como mediador, em contexto individual e grupal, promovendo a socialização, a expressão de sentimentos e a gestão de conflitos e ansiedades;

o Educação artística: Estimular, num contexto oficinal, o potencial criativo e artístico dos alunos, através da experimentação de diferentes materiais e criando uma dinâmica de trabalho centrada nos processos criativos e não no resultado final.

o Educação pela Arte: Com recurso a exemplos da História de Arte explorar os seguintes conceitos: Humanização, Transparência, Rebatimento, Cor, Figura Humana, Desproporção, Ideografismo, Perspetiva Afetiva;. 2. Relação entre conceitos de arte, pedagogia e psicologia. 3. O papel da arte em geral, e da expressão plástica, em particular no desenvolvimento de crianças com NEE 4. Apresentação de exemplos e boas práticas artísticas no contexto da Educação Especial

Valor a pagar: 50€ (associados) e 70€ (não associados)



O aluno com Dislexia

Um sofrimento muitas vezes solitário e silencioso

São cada vez mais os casos de pais que acorrem até mim para fazer uma avaliação compreensiva de dislexia do seu filho(a).

Chegam a maior parte das vezes com o coração demasiado apertado dizendo que já não sabem mais o que fazer. É o acompanhamento dos trabalhos de casa por eles mesmos, são as explicações, são os apoios escolares e nada parece resultar.

- "O meu filho não aprende como os outros. Tem imensas dificuldades na leitura e a escrita... é só erros!

Estas perguntas antes de serem feitas pelos pais ou pelos professores já há muito habitam na cabecinha da criança. Ela é a primeira a constatar que é diferente dos seus pares, ela é a primeira a perguntar-se: "Se os meus amigos conseguem ler e escrever corretamente, porque é que eu não sou capaz?"

É a partir desta constatação sofrida que a autoestima do aluno começa a baixar significativamente ao ponto de se julgar "burro", menos capaz, menos inteligente... Tudo "menos".

Confirmado o diagnóstico de dislexia urge desmistificar o termo junto dos pais e sobretudo junto do aluno. Ser disléxico nada tem a ver com inteligência, aliás estes alunos apresentam um Q.I. igual ou superior ao esperado para a sua faixa etária.

Quando lhes digo isto, eles suspiram sempre "quase" de alívio, como se uma tonelada de problemas se esbatesse ali mesmo! Digo-lhes, ainda, que a nossa "missão" para além de uma reeducação especializada é descobrir a sua área forte (normalmente, ligada às artes, música, desporto...). E eles ficam muito surpreendidos pela possibilidade de descobrir essa "tal área forte"! E de facto esta "descoberta" é muito importante, será uma forma de eles recuperarem a sua autoestima, o seu autoconceito e de voltarem a gostar de ir à escola.

O diagnóstico, a desmistificação, a reeducação nos processos da leitura e da escrita acrescida à descoberta e otimização da área forte de cada um, diz-me a experiência, são fatores-chave para ultrapassar o sofrimento solitário e silencioso de que estas crianças e jovens são "vítimas" durante muitos anos, quando não diagnosticadas.

O aluno com dislexia devidamente intervencionado pode fazer tudo o que os outros fazem, com o dobro do esforço é certo, mas com a firmeza na crença de que nada o impede intelectualmente. 

Estes alunos devem ser referenciados nas escolas pelos pais ou professores ou técnicos de saúde, terapeutas... o mais precocemente possível, para que seja elaborado um relatório técnico-pedagógico para poderem usufruir de algumas medidas educativas consagradas no Decreto-Lei 3/2008, nomeadamente: apoio personalizado (fundamental); adequações no processo de avaliação (não cotação dos erros tipo, por exemplo, a leitura dos enunciados, provas escritas mais curtas e frequentes...) e em última estância dependendo caso a caso, as adequações curriculares. Estas medidas farão parte do programa educativo individual do aluno e protegê-lo-ão legalmente, incluindo nos exames nacionais.

Por: Manuela Cunha Pereira

In: EDUCARE

terça-feira, 15 de janeiro de 2013

José Pacheco: “A crise é, também, da educação!”

Professor, educador, alfabetizador, cronista. A Escola da Ponte ficará para sempre associada ao seu nome. "Exilado", como gosta de gracejar, há doze anos no Brasil, mas aproveitando uma visita ao Porto, José Pacheco partilhou com o EDUCARE.PT a sua visão da educação e do mundo.

Deu muitas aulas e trabalhou em muitas escolas antes de, juntamente com duas colegas, conceber em 1976 o projeto Escola da Ponte, na Vila das Aves. José Pacheco foi professor no 1.º e 2.º ciclos do ensino básico e também na universidade. Porém, o seu fascínio está no ensino das primeiras letras. "Gosto mesmo é da fase da alfabetização como um mistério. É uma coisa maravilhosa!" 

A viver no Brasil há dez anos, José Pacheco levou a experiência da Escola da Ponte até Cotia, uma cidade perto de São Paulo. Há um ano e meio, nasceu lá uma outra escola para 200 crianças entre os 12 e os 14 anos, oriundas da favela e "atiradas fora das outras escolas". "Criámos um espaço onde o centro é uma tenda de circo e há volta há oficinas de mosaico, música, horta, matemática, ciências, língua portuguesa,skate, kart, biblioteca..." 

O EDUCARE.PT entrevistou José Pacheco durante uma das suas visitas ao Porto, cidade onde nasceu. Numa conversa autobiográfica, fica o registo de uma vida repleta de desafios nunca rejeitados. Ou a história de como um eletricista de profissão, quase engenheiro sem vocação se transformou num professor por provocação. 

EDUCARE.PT (E): Do seu longo currículo como educador, professor, que experiências destaca de uma vida dedicada à educação?
José Pacheco (JP): As experiências mais decisivas foram as que tive na infância. Nasci num meio degradado, pobre... não foi fácil. E aprendi algo que desejo nenhuma criança aprenda: a odiar o professor. Aprendi o que era a humilhação, a exclusão, porque era pobre, porque era estrábico, enfim... Essa foi uma experiência tremenda. Depois a experiência do desvio daquilo que eu desejava. Ninguém naquela região do Porto aspirava a ir para o liceu, ia para o curso profissional. Eu sou eletricista de profissão. E o que eu tenho a ver com isso? Nada. 

Seguindo esse caminho, entrei no Instituto Superior de Engenharia. Iria ser engenheiro eletromecânico, aliás quase todos os meus amigos são engenheiros... Aconteceu que, tendo irmãos mais novos, eu os levava à escola e aí tive uma experiência terminal. Um dia a professora do meu irmão Rui convidou-me a ir a uma palestra de um professor, chamado Lobo, de que ninguém fala, e talvez fosse dos maiores professores que Portugal já teve. Quando comecei a escutar esse professor, fiquei desorientado. Nada daquilo que ele dizia tinha a ver com a ideia que eu pensava ser uma escola. Ele nunca soube a importância que teve para mim. Nessa semana abandonei o curso de Engenharia e fui-me matricular para fazer exame na escola do Magistério do Porto. As experiências escolares foram diversas, mas a maior de todas foi-me dada na Escola da Ponte. 


"As experiências mais decisivas foram as que tive na infância (...) aprendi algo que desejo nenhuma criança aprenda: a odiar o professor."





E: Foi o idealizador do projeto educativo da Escola da Ponte, na Vila das Aves, que se mantém desde 1976 em funcionamento. Como é que tudo começou?
JP: A resposta tem um pouco de história autobiográfica, e eu peço desculpa de falar em termos pessoais, porque o projeto da Ponte é coletivo, de uma equipa, e não meu. Quando vamos para a educação, vamos por uma de duas razões: por amor ou por vingança. Eu confesso que fui por vingança. Jurei a mim mesmo que nenhum aluno meu passaria pelas situações de humilhação e exclusão por que eu passei. Para mim seria inadmissível que um aluno não aprendesse. Estávamos no tempo da ditadura e eu dava aulas muito bem dadas. Era o que me diziam... Ainda assim, no fim de cada ano havia sempre uma parcela de alunos que não aprendia, que reprovava. Eu questionava-me: Se eu dou aulas tão bem dadas, por que razão eles não aprendem? Não me conseguia vingar!... [risos] Comecei a pensar que havia qualquer coisa de errado. 

Quando cheguei à Ponte, aceitei lecionar uma turma a que chamavam "turma do lixo", uma turma composta de jovens de 14 e 15 anos que não sabiam ler nem escrever, que batiam nos professores. Perguntei àqueles jovens: Porque não sabeis ler? E eles responderam: "Porque as professoras todos os anos nos falam do a, e, i, o, u, do pa, pe pi, pó, pu, do saltinho do pardal, da ondinha do mar. E, depois de darmos a primeira e a segunda página do livro, não entendemos mais nada." Olhei para eles e pensei: Mas é assim que eu ensino, se continuar a ensinar assim eles vão continuar a não aprender.

"Compreendi que não havia dificuldades de aprendizagem neles, mas de "ensinagem" em mim. Eles não aprendiam porque a escola não lhes contemplava a diversidade."

E: Pôs em causa a forma como lecionava?
JP: Nesse momento senti a primeira iluminação. Compreendi que não havia dificuldades de aprendizagem neles, mas de "ensinagem" em mim. Eles não aprendiam porque a escola não lhes contemplava a diversidade. Cada um era um ser único, dotado de um ritmo e modo de pensar próprios. Se fosse hoje, falar-se-ia de estilos de inteligência. Mas nós ensinávamos a todos da mesma maneira, no mesmo lugar e no mesmo horário. Interroguei-me, novamente: Será que tem de ser assim? Porque há aula? Porque dou aula? Quando percebi que dar aula é inútil e prejudicial, o chão fugiu-me debaixo dos pés - eu só sabia dar aula. O que iria fazer da minha vida? Mudar de profissão? 

Senti vontade de voltar para a engenharia. Entretanto, conheci professores tão desorientados quanto eu e duas professoras da Escola da Ponte, e tudo mudou. Elas sentiam o mesmo desconforto que eu sentia. Quando lhes falei sobre isso, com elas iniciei um caminho de reflexão-ação, que continua... buscamos compreender porque dávamos aulas, por que razão uma aula durava 50 minutos, porque aplicávamos testes, porque organizávamos as escolas em classes ou anos de escolaridade... Lendo teoria e modificando a nossa práxis, concluímos que nada disso tinha fundamento científico. Que teríamos de procurar alternativas para esses arcaísmos pedagógicos 

E: Está a dizer que o modo como a escola se estrutura não tem razão de ser?
JP: Nem lógica, nem bom senso... De científica não tem nada! Desde o século XIX, ninguém se atreve a conceder suporte teórico à existência de aula, à divisão cartesiana em turmas e anos... Nada disso tem fundamento. Caberia perguntar: se não tem fundamento porque está na lei? 

Quando começamos a estudar diferentes propostas teóricas, diversos pedagogos e referências para melhoria da nossa prática pedagógica, agimos praxeologicamente, reelaboramos a nossa cultura pessoal e profissional e melhoramos as aprendizagens dos nossos alunos. A Escola da Ponte não é um modelo, nem adotou uma só linha teórica. Nela converge uma multirreferencialidade de tendências, do Freinet ao Piaget, de Freire a Ferrer, de Morin a Deleuze... 

E: Por tudo isso, a Escola da Ponte tem subsistido a várias políticas educativas. Que desafios enfrenta atualmente?
JP: A Ponte é um ato de resiliência. Mas atualmente o projeto está em risco de acabar. Eu não queria que a Escola da Ponte fosse tratada de modo privilegiado, mas ao menos que fosse objeto de estudo de escolas e do Ministério da Educação e Ciência. Ela é estudada por muitos estrangeiros, mas, como toda a gente sabe, santos da casa não fazem milagres.

"A Escola da Ponte não é um modelo, nem adotou uma só linha teórica. Nela converge uma multirreferencialidade de tendências, do Freinet ao Piaget, de Freire a Ferrer, de Morin a Deleuze..."

E: Os alunos da Ponte são avaliados e têm bons resultados?
JP: Dos melhores. Os nossos antigos alunos, alguns com mais de 50 anos, são exemplos de pessoas de bem, que reivindicam e fazem valer os seus direitos. Mas talvez isso não convenha a um Portugal cativo de uma democracia virtual. 

Périplo pelo Brasil 
E: Deixou Portugal e atualmente vive no Brasil. O que aproxima e distancia o sistema educativo português e brasileiro?
JP: O que aproxima é o modelo que ainda hoje é hegemónico, tanto num lado como no outro do oceano, as escolas funcionam do mesmo modo. O que distancia é a característica brasileira da contradição, ou seja, temos no Brasil as escolas piores e melhores que se possam imaginar, algo que em Portugal não existe. Aqui existe o meio termo, lá é uma coisa ou outra. E nem faço a distinção entre o privado e o público. Conheço escolas privadas muito mazinhas e escolas públicas de excelência. 

Mas aquilo que mais diverge em relação a Portugal é que os professores portugueses estão imersos numa profunda crise de desânimo, no imobilismo, coisa que no Brasil não se sente. Os educadores brasileiros estão a despertar para algo que tem a ver com isto: o Brasil neste momento é a sétima potência económica mundial, mas também é dos países menos bem colocados no ranking do PISA. Os educadores brasileiros começam a tomar consciência de que, para além do progresso económico, tem de haver oportunidades de igualdade social, justiça social, e que isso pode ser alcançado através de outra educação. 

E: O sistema educativo português poderia ir beber alguma coisa ao brasileiro, nós vivemos a aspirar pelos modelos dos países nórdicos, finlandeses, e os da América Latina, será que não seriam mais próximos da nossa cultura, mais próximos das nossas mundividências?
JP: Sem dúvida. Eu aprendo muito no Brasil. Portugal também poderia aprender. Mas poderia aprender muito ainda com os portugueses. É preciso compreender que os colonizadores hoje poderão vir a ser colonizados. Acredito que os BRIC [sigla criada por Jim O'Neill para agrupar Brasil, Rússia, Índia e China] serão o eixo futuro da educação e não apenas do comércio. O Brasil ainda tem de resolver alguns problemas estruturais e libertar-se de uma administração burocratizada. Mas sinto que se aproxima uma revolução educacional. Portugal poderia não agir como um país que pensa que o centro da inovação educacional está na Europa. O centro deslocou-se... Portugal poderia fazer uma migração de aprendizagem no Sul.

"Os educadores brasileiros começam a tomar consciência de que, para além do progresso económico, tem de haver oportunidades de igualdade social, justiça social, e que isso pode ser alcançado através de outra educação."

E: O Brasil pode ser um destino para os professores escaparem à crise?
JP: Eu lamento que esteja a acontecer esta necessidade de os professores terem de emigrar. No último ano, entraram milhares de engenheiros no Brasil. A crise está aí e as pessoas não conseguem organizar as suas vidas. Vale a pena considerar o Brasil como destino, até para se fazer algum intercâmbio de ideias e projetos. Mas a crise é, também, da educação. É preciso compreender que o modelo epistemológico, que ainda hoje orienta as políticas, está errado. 

Escola 3.0
E: A escola tem vindo a perder o seu papel exclusivo na estruturação do conhecimento. Como vê a concorrência que outros agentes educacionais, como os novos media, fazem à escola?
JP: O Pierre Lévy dizia que as escolas perderam o monopólio do saber, só mantêm o da acreditação. Daqui por algum tempo, nem isso. Em vários condados dos EUA as escolas estão a fechar, porque o homeschooling, o unschooling e outros schoolingsacabaram com as escolas de aula com professor-papagaio. A Kan Academy foi criada por um americano, quando percebeu que o sobrinho quase nada aprendia na escola. Preparou pequenas apresentações em suporte digital, enviou-as ao sobrinho... e o sobrinho de Kan aprendeu. Então, um senhor chamado Bill Gates decidiu financiar a iniciativa. Essa academia, que visitei há cerca de um mês atrás, sugere a competição entre a web 2.0 e a 3.0 e o atual modelo de escola. 

E: A escola perde...
JP: Perde! O que o aluno vai fazer à escola se pode aprender com o computador? O problema é que estamos a gerar, paralelamente à escola, monstrinhos de computador que não olham para os lados e não percebem a existência do outro. Há algum tempo atrás, presenciei dois irmãos nos seus quartos, um ao lado do outro, a falar pelo Twitter. Isto é o cúmulo. Nunca houve tantos instrumentos de comunicação e nunca tão sozinhos estivemos. A escola desenvolve a solidão, tal como com as novas tecnologias mal aproveitadas. O que se faz hoje na escola? Espaços chamados laboratórios de informática e redes digitais para quê? Hoje com um aparelhinho de mão já tenho acesso à Internet. Para quê colocar computadores nas escolas? Para gastar dinheiro e gerar lixo digital a curto prazo? 

O elemento humano é necessário, o professor é indispensável. Mas, se os professores se mantiverem ancorados em práticas tradicionais, com ou sem suporte virtual, as escolas deixarão de existir. Acompanho um projeto designado por "comunidades de aprendizagem". O conceito tem sido trabalhado na Universidade de Leeds. Para surpresa minha, já há cinquenta anos, um brasileiro de nome Lauro de Oliveira Lima escrevia sobre o assunto. Sugeria uma escola-espaço de convivencialidade, onde jovens e adultos vão para partilhar o que aprendem em projetos de desenvolvimento local. Pessoas que têm acesso livre à Internet e aprendem matemática, português, ciências, através de projetos, num projeto de sociedade sustentável. Os alunos aprendem a transformar a informação em conhecimento e a partilhá-lo. Para tal, não precisam de ir à escola, ouvir aulas todo o dia.

"O elemento humano é necessário, o professor é indispensável. Mas, se os professores se mantiverem ancorados em práticas tradicionais, com ou sem suporte virtual, as escolas deixarão de existir."

E: A escola pública vai subsistir à crise económica?
JP: Muitas vezes as situações de crise são oportunidades de transformação social e quero acreditar que ainda haja professores que acreditem que podem mudar o paradigma de escola que temos. Continuo esperançoso. E ativo. Quem quiser ver uma prova da possibilidade da redenção da escola poderá acessar a net e estudar o projeto Âncora...

Entrevista de Andreia Lobo

In: Educare