sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Português descobriu o que acontece no cérebro antes de fazermos um movimento

Rui Costa e colegas descobriram que a decisão para fazer um movimento simples como levantar o braço depende de dois circuitos neuronais diferentes e não de um só. Descoberta pode ter implicações no tratamento de sintomas de doenças como a de Parkinson.

Luzes, neurónios, acção: foi através da observação desta sequência de acontecimentos que uma equipa de cientistas, com participação portuguesa, conseguiu mostrar que são necessárias duas rotas diferentes de células nervosas para se gerar movimento.

Utilizando uma nova técnica, Rui Costa, neurocientista que trabalha na Fundação Champalimaud, em Lisboa, e colegas, puseram em causa o que se pensava ser a função de cada uma das rotas – defendia-se que uma servia para accionar um determinado movimento, outra para inibir o mesmo movimento. Mas, afina,l o comando para começar uma acção é mais complexo, mostra um estudo publicado nesta quarta-feira na edição online da revista Nature.

O que é uma acção: levantar o braço, caminhar até à casa de banho ou saltar de uma ponte? As três, mas a terceira necessita de um processo mental mais complexo para a tomada de decisão. O tipo de acção que Rui Costa e os colegas do Instituto Nacional do Abuso de Álcool e do Alcoolismo, nos Estados Unidos, estudaram prende-se mais com as duas primeiras. São esses movimentos mais simples que são afectados por doenças do sistema nervoso como a de Parkinson ou a coreia de Huntington.

Essas doenças afectam os gânglios de base, estruturas bem definidas no cérebro compostas por células nervosas que estão abaixo do córtex. Uma das actividades que são levadas a cabo pelos neurónios destas estruturas conduz à tomada de decisão para a iniciação ou não de movimentos mais simples.

Sabia-se que dois circuitos diferentes que partem destes gânglios afectavam esta decisão. Um dos circuitos é directo e o outro tem mais intermediários e, por isso, chama-se indirecto. A doença de Parkinson, que é inibidora desses movimentos, e a coreia de Huntington, que provoca movimentos musculares descontrolados, afectam estes dois circuitos. Por isso, teorizou-se que o circuito directo servia para activar o movimento e o indirecto servia para o inibir.

Mas faltava uma observação experimental. “Nunca se conseguiu medir directamente a actividade destes neurónios”, diz Rui Costa ao PÚBLICO. O trabalho, que começou quando Rui Costa ainda estava nos Estados Unidos, ultrapassou esta dificuldade experimental e mostrou que aquela hipótese parece estar errada.

As células nervosas de cada circuito têm identidades diferentes e produzem proteínas únicas. A equipa criou ratinhos que produziam proteínas fluorescentes em cada um dos circuitos. Estas proteínas emitiam mais luminosidade quando os neurónios se activavam. Com uma pequeníssima fibra óptica instalada no cérebro dos ratinhos e ligada a um contador de fotões, os cientistas conseguiram medir a actividade dos dois circuitos neuronais separadamente.

Depois, puseram os ratinhos a iniciar um movimento e mediram a actividade do circuito directo e do indirecto. “Menos de um segundo antes de iniciar o movimento, os dois circuitos ficavam mais activos, depois iniciava-se o movimento”, conta Rui Costa. “Para iniciar um movimento consciente, é necessário os dois circuitos estarem activos”, conclui.

Os cientistas não fizeram nenhuma experiência que testasse a actividade dos circuitos quando uma acção era inibida. Só se verificou que, quando os ratinhos se mantinham parados, os dois circuitos estavam menos activos.

Não se sabe qual a função de cada um dos circuitos. Uma das possibilidades é que, enquanto um circuito está a activar uma acção, o outro acaba por inibir todas as outras, explica Rui Costa.

Mas estes resultados podem ajudar “a melhorar o tratamento dos sintomas das doenças neuronais”, diz o investigador. “O próximo passo é tentar manipular a actividade destes circuitos, de forma a controlar o movimento.”


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