Não há nada melhor para sabermos se as nossas ideias são claras do que tentar transmiti-las e explicá-las a alguém que esteja fora do contexto em que habitualmente elas circulam. Há muito que costumo dizer aos meus estudantes de investigação que o tema que se procura investigar só está “maduro” quando o conseguirmos explicar a uma criança de dez anos.
Vem isto a propósito de uma pessoa conhecida que, quando lhe explicava o meu interesse pela educação inclusiva, me disse um pouco espantado: “Mas eu pensava que o papel da escola era reduzir a diversidade em lugar de a respeitar!”. Tentei argumentar que não: a ideia era que a escola reconhecesse as diferenças entre os alunos – diferenças de maturidade, de forma de aprender, de culturas familiares e comunitárias, etc. – não para acabar com as diferenças mas para, respeitando-as, contribuir para formar cidadãos mais competentes.
Este episódio convidou-me a refletir sobre este assunto do respeito pela diversidade. E desta minha reflexão compartilho três aspetos:
1. Qualquer pessoa (isto inclui obviamente as crianças…) tem uma representação sobre o mundo. Esta representação pode ser influenciada por muitos factores: o conhecimento, as emoções, a socialização, a experiência, etc. As representações são por natureza pessoais e extremamente diversas. A questão é: esta diversidade de representações é um erro? Há uma certa e outras erradas? Eu diria que em situações muito estritas (p. ex. a teoria heliocêntrica) há uma verdade aceite que se impõe a representações erradas. Mas isto só em situações muito restritas. A criança desenvolve representações únicas e estas representações estão sempre certas em função das variáveis que ela sente, conhece, experimenta, etc. Respeitar esta diversidade de representações é essencial para desenvolver projectos de aprendizagem bem sucedidos.
2. Se todos são diferentes todos têm que ser ensinados diferentemente? Claro que não. Pensar que a diferença na aprendizagem implica uma inconciliável diferença no ensino conduz-nos a um impasse irresolúvel: não é possível aprender em grupo. Os grupos humanos (tais como uma classe) sendo diferentes, podem (e devem) aprender conjuntamente. Sempre conjuntamente e sempre em grande grupo? Isso não: precisamos para respeitar a diversidade de proporcionar aos nossos alunos oportunidades de aprendizagem diversas: teóricas, práticas, verbais. não-verbais, experienciais, de observação, em pares, em pequeno grupo, em grupo de projecto em grupo de nível, etc. etc. Ensinar alunos diversos sempre da mesma maneira é um absurdo
3. A diversidade tem a ver com o respeito pelos outros. Pensar que quem não pensar de uma certa maneira pensa necessariamente mal é uma falta de respeito pelos outros (isto inclui obviamente as crianças). Respeitar os outros é procurar entender (entender mesmo) porque pensam de uma certa forma, entender quais os valores que estão subjacentes a atitudes, a (in)seguranças, a valores... Ter respeito pela diversidade não significa tomar como certo o bom tudo o que a diversidade nos traz. A ignorância, muitas tradições, a “ordem social”, o fundamentalismo e tantos outros factores constituem verdadeiros obstáculos à diversidade.
Ao fim e ao cabo, quem precisa de respeito não é a diversidade: são os percursos de cada pessoa (isto inclui obviamente as crianças) e, para respeitarmos os outros, nada melhor que assumirmos uma atitude de humildade perante as certezas que temos. Essas certezas são certamente úteis para organizarmos a nossa vida mas são certamente bem menos úteis para ajudar os outros a organizarem a vida deles.
In: Newsletter Associação Nacional de Docentes de Educação Especial, mês de janeiro
Por: David Rodrigues
Presidente da Pró-Inclusão – ANDEE
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