É da praxe. Na próxima quarta-feira, 16 de Junho, dia em que começam os exames nacionais para alunos do básico e secundário, Manuel Esperança, director da Escola Secundária José Gomes Ferreira, em Lisboa, vai passar pelas salas e levantar o polegar aos alunos. É para "desejar boa sorte" e "retirar aquela pressão", sobretudo de cima dos bons alunos que perseguem sonhos à décima. "Quem é pai, e os professores também, sabe que, sem querer, transmitimos ansiedade. Dizemos "estuda, olha que se não estudas não consegues entrar".
Os bons alunos também sofrem. É consensual entre os psicólogos. Por estes dias, os do secundário já andam a fazer contas à vida: uma décima pode pesar muito para quem quer ingressar no ensino superior público, sobretudo em cursos como Medicina, com médias a rondar os 18, mas também em Arquitectura, Bioengenharia ou Medicina Dentária. Já para os do 3.º ciclo do ensino básico, a realidade é diferente.
Este ano são mais de 96 mil os inscritos que vão fazer provas de Língua Portuguesa e de Matemática para terminar o 9.º ano. Só que, apesar de o peso dos exames ser igual aos do secundário, não têm que enfrentar as vagas de acesso às faculdades. Todos os exames contam 30 por cento da nota final da disciplina. Porém, no secundário existem as específicas, que têm um peso maior e contam para ingressar nos cursos.
Para o professor de Psicologia da Universidade de Coimbra José Manuel Canavarro, os alunos do básico sentem muito menos ansiedade, porque os exames têm um impacte "mais reduzido". No secundário, são as expectativas dos jovens e dos pais quanto ao futuro que estão em causa.
Só na primeira fase, que se estende até 23 de Junho, o número de inscritos nos exames nacionais do secundário supera os 161 mil. Quanto aos resultados da primeira fase, os do 3.º ciclo são publicados a 13 de Julho e os do ensino secundário a 8 de Julho; os da segunda fase, que começa a 14 de Julho e termina a 19, saem a 30 de Julho.
Em época de exames, não há uma fórmula de sucesso que permita a todos os alunos serem avaliados sem stress. O que é preciso, dizem os psicólogos, é criar estratégias para lidar com essa pressão. Mas, ressalva José Manuel Canavarro, "não é possível sermos exigentes sem pressionar".
A docente de Psicologia da Universidade de Aveiro Anabela Pereira, também presidente nacional da rede de serviços de apoio psicológico no ensino superior, deixa algumas dicas de estudo e de redução do stress e sublinha que "os adolescentes sofrem muito com a pressão dos pais, mas sobretudo do grupo de pares": "Entre os bons alunos há muita competição por décimas", alerta.
Altas expectativas
E os pais também pressionam: "Colocamos altas expectativas nos nossos filhos, o que pode ser prejudicial", diz a docente, defendendo que também é preciso preparar os jovens para "lidar com o fracasso". Em vez de "tomarem ansiolíticos, calmantes para dormir e vitaminas para o cérebro", devem aprender a encarar as dificuldades.
Uma opinião partilhada pela docente da Faculdade de Psicologia da Universidade de Lisboa Dulce Gonçalves, que lecciona a disciplina de Dificuldades na Aprendizagem e é coordenadora do Centro de Psicologia Clínica e Educacional de Lisboa. "Os pais são educadores de pessoas, não de alunos. Podem ajudá-los a descobrir que quando uma porta se fecha se abre uma janela", defende a psicóloga, que indica a pais e professores acções concretas e simples que, se realizadas com frequência, estimulam as competências dos jovens.
Há uma questão na qual os psicólogos parecem estar de acordo: o foco não pode estar apenas nos resultados: "Quando os pais pressionam muito e põem mais o foco nos fins, nas notas, do que nos meios, no esforço, podem tornar-se inadvertidamente "agentes" patológicos", alerta a docente da Faculdade de Motricidade Humana da Universidade de Lisboa Margarida Gaspar de Matos.
Também o director da Escola Secundária do Restelo, em Lisboa, defende que se deve colocar a tónica na felicidade dos alunos: "Um jovem pode atingir os resultados, mas falta-lhe muito para ser feliz".
Em geral, diz Margarida Gaspar de Matos, "todos os alunos sofrem alguma ansiedade", embora nalguns casos possa ser "paralisante". Os níveis são variáveis: alguns alunos são mais ansiosos em "geral", outros "apenas na altura dos testes", outros porque sentem "dificuldade nas matérias" ou têm "uma grande vontade de se exceder na sua performance".
A docente, também psicoterapeuta, enumera sinais de alerta como isolamento social e desregulação nos hábitos de sono e de alimentação. Por vezes, em alturas de exames, também se "exacerbam patologias preexistentes" como fobias, perturbações obsessivo-compulsivas, do humor, alimentares e ainda tiques e gaguez.
Que reacções pode ter um aluno que se esforçou e mesmo assim não consegue? "A frustração é grande" e pode originar depressões, problemas alimentares ou de sono, ou ainda abuso de álcool, tabaco, drogas e aumento da violência interpessoal: "Mas nada que não consigamos ajudar a auto-regular", desdramatiza Margarida Gaspar de Matos.
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