terça-feira, 26 de janeiro de 2010

O autismo não existe! - a busca pela cura como barreira para inclusão

Não existe cura para autismo. Nem nos EUA, nem em lugar nenhum do mundo. Autistas, não precisam ser curados, precisam ser respeitados. O que precisamos é oferecer dignidade, habilitação e reabilitação para uma vida independente, com o máximo de autonomia possível.
Na verdade, o autismo não existe. O que se faz, na tentativa de se negar o autista que é real e que está lá, é caçar um fantasma que supostamente tomou conta das nossas crianças “normais”, o tal do autismo.

Quem existe são autistas que sofrem pela negação por parte de pais e profissionais, que não são aceitos nas escolas e que não têm instituições que os apoiem na inclusão, que pagam caro por não cumprir as expectativas de uma sociedade, ou de uma família que esperava um filho "padrão", ou “normal”.

Neste sentido, a busca da cura do autismo é vã, deletéria e, muitas vezes, prejudicial quando colabora para aumentar o preconceito que afasta mais ainda o autista da aceitação por parte da sua família e da sociedade, dos seus direitos fundamentais e da sua dignidade inerente.

Precisamos sim, de mais profissionais especializados em incluir o autista na comunidade, na escola, na sociedade. Precisamos de mais centros preparados para o diagnóstico, a habilitação e reabilitação do autista - isto não deve significar centros de segregação de autistas, ou residências fora da comunidade, mas centros que apoiem os autistas para uma vida independente. Precisamos de pesquisas para entender melhor o autista, para construir e oferecer técnicas de comunicação alternativa e para ajudá-los a regular melhor o seu comportamento.

Nada do que é necessário é justificativa para se coisificar o autista, para se tratar o autista como um ser humano menor, alguém doente que precisa de tratamento pelo simples facto de ser o que é.

Autistas precisam de tratamento para a gripe, para a depressão, para as convulsões, para o bicho-de-pé, para uma série de coisas, igual a toda a gente, inclusive compulsões nocivas como bater demais, jogar demais, beber demais, comprar demais, falar palavrões demais, partir coisas demais.

O autismo em si não se trata, já que não existe, e o autista não pode ser tratado dele mesmo. Quem vai sobrar depois desse tratamento? A pessoa que deveria existir e que também nunca existiu por conta do fantasma do autismo?

Tratar o autismo significa tornar o autista mais "sociável"? Então, sugiro que se mude esse ponto de vista.

O que deve ser oferecido para o autista é a oportunidade de uma maior participação, contacto social, de construção da sua vida com maior independência possível, com o apoio da família e dos seus pares. Isto não significa tratar o autista ou autismo, nem buscar a cura. Isto é habilitação e reabilitação.

Durante muitos anos, e até hoje em dia, o discurso que se aplica é que o autismo é uma bomba que destrói famílias. É fácil dizer que o autista não se coloca no lugar do outro, difícil é se colocar no lugar do autista.

Nós, autistas e familiares, precisamos pensar em respeito às diferenças, dignidade e acolhimento. Promover o respeito, a inclusão e fazer mudar o que se pensa e o que se diz sobre o autismo e os autistas.

De: Alexandre Mapurunga (Irmão do Pablo e Giordano e, também, do Biel, Tetê, Gustavo e da Natália, Pai da Allana e, também, da Júlia, Mariana e da Larissa).

inclusaoediversidade.blogspot.com

 

5 comentários:

  1. Olá Nelson,

    Sou Isabel Barbosa, mãe da Cecília, menina de 8 anos de idade e com Perturbações do Espectro do Autismo.
    Vejo que este texto não foi escrito por si, mas muito apreciei que o tivesse colocado no seu "nosso"(de todos) blog, pois a visão do autismo aqui descrita, vai de encontro à minha visão pessoal de autismo. Logo, acho que estas palavras do Alexandre Mapurunga, deveriam constar numa "Carta dos Direitos das Pessoas Com Perturbações do Espectro do Autismo e com Deficiências na Transversalidade".

    Como mãe de uma menina com Autismo, não tenho palavras a acrescentar ao que foi escrito pelo Alexandre e publicado por si. Apenas me resta parabenizar-vos pelo vosso respeito pela diferença que é a igualdade.

    Um abraço sentido
    Isabel Barbosa

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  2. Olá Isabel!
    Pode dizer apenas no "nosso" blogue, porque a ideia deste blogue é mesmo essa.
    É que seja um espaço de e para Todos!
    Gostaria de agradecer também os elogios e fico contente que tenha gostado do relato que aqui deixei.
    Realmente muito pouco se pode acrescentar quando se escreve e descreve tão bem.

    Cumprimentos
    Nelson Santos

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  3. "É fácil dizer que o autista não se coloca no lugar do outro, difícil é se colocar no lugar do autista" - Esta frase é genial!

    Parabéns pelo Blog e pela iniciativa

    Priscila Felix

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  4. Muito Obrigado Priscila pelos seus elogios.
    O artigo é bestial...mas tenho de concordar consigo quando cita esta frase dizendo que é genial...Foi realmente o que mais me marcou ao ler este texto.
    Espero que o "nosso" blog continue a responder às suas expectactivas.

    Cumprimentos
    Nelson Santos

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  5. Olá,
    Grata surpresa ao ver meu artigo por aqui.
    Na época que escrevi esse texto inicialmente como uma "reposta" a alarmante declaração de uma representante de entidade de que se não investíssemos pesado para curar os autistas não importava muito "que mundo deixaríamos para nossas crianças, mas sim que crianças deixaríamos para o mundo".
    É o tipo de pensamento que faz com que não se enxergue a pessoa inteira por trás do autismo...
    Daí de uma resposta direcionada o artigo passou mais para um chamado à reflexão.
    Fico feliz que ele tenha repercutido tão bem por aqui...
    Um forte abraço!
    Alexandre Mapurunga

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