Entrar no hospital, fazer a triagem de Manchester e não precisar de ajuda para saber qual o serviço a que tem de ir é agora uma realidade para os daltónicos. As cores dos serviços vão passar a ser acompanhadas por símbolos que permitem a sua identificação. O sistema, destinado a auxiliar os daltónicos a orientarem-se, já está a ser utilizado no Hospital de São João, no Porto, e irá chegar a todo o Serviço Nacional de Saúde.
O facto de o sistema de triagem usado nos serviços de Urgências ser feito através de cores e de haver pessoas que não as conseguem distinguir esteve na base da investigação. A solução chegou com o projecto do designer e professor da Universidade do Minho Miguel Neiva. O catedrático inventou um código de cores universal para os daltónicos.
"Pensei em algo que pudesse dar independência aos daltónicos", explica Miguel Neiva. A ideia surgiu em 2000 e destinava-se a uma tese de mestrado. A pouca informação que havia sobre esta perturbação e o objectivo de criar algo que fosse útil aos daltónicos levaram o designer a dedicar sete anos da sua vida à investigação.
Pegou no conceito das cores primárias e criou um símbolo simples que as representasse. Combinando esses três símbolos, obteve os símbolos de todas as outras cores.
O código de cores estava criado mas Miguel Neiva ainda esperou um ano e meio para garantir o reconhecimento e a acreditação da comunidade científica e académica mundial. Em Maio de 2010, o sistema foi finalmente aplicado. Em Dezembro, foi implementado na área da Saúde através do Hospital de São João.
Para já, o código ColorAdd está nas linhas existentes no chão dos corredores do hospital que orientam os utentes para os diversos serviços. Posteriormente, será implementado nas pulseiras de triagem.
No futuro, todos os hospitais públicos com triagem de Manchester irão adoptar este sistema.
O código também já está a fazer sucesso além-fronteiras. Exemplo disso é o interesse demonstrado por um hospital novo de Inglaterra.
Já neste mês, um dos hospitais de Lisboa irá incluir o ColorAdd nos fármacos administrados no seu bloco operatório.
PERFIL
Miguel Neiva criou o sistema de identificação de cores para daltónicos, registado com a marca ColorAdd. É designer e professor na Universidade do Minho. O projecto surgiu da sua tese de mestrado sobre a indústria têxtil. A investigação demorou sete anos, mas já começou a ser aplicada.
DISCURSO DIRECTO
"O CÓDIGO É A SIMULAÇÃO DOS TRÊS CONES DO OLHO": Falcão Reis, Director de Oftalmologia do Hosp. S. João
Correio da Manhã – O que é o daltonismo?
Falcão Reis – É uma anomalia ocular. A discromatopsia, que é o termo científico, é adquirida ou congénita. Esta divide-se em três tipos: confusão entre vermelho e verde, outras tonalidades de vermelho e verde e as várias tonalidades de azul e amarelo.
– Como vê este código de cores?
– O código é muito bem pensado porque se baseia em três símbolos básicos. No olho há três cones: azul, verde e vermelho. O código é a simulação dos três cones.
– Qual a utilidade do código?
– Acho muito útil porque o daltonismo é uma situação muito vulgar e este é o único projecto que existe a nível mundial para ajudar estas pessoas.
TINTAS E LÁPIS COM COLORADD
O código de cores ColorAdd já está a ser utilizado pela empresa de tintas CIN e pela fábrica de lápis Viarco. Os dois exemplos mostram a abrangência da aplicação deste sistema. Tanto pela diversidade de códigos para expressar as diferentes cores e suas tonalidades, como pelo facto de crianças e adultos começarem a assimilar este sistema.
PÚBLICO REJEITA COR DE BOLA
Quando a Adidas criou a bola de futebol Jabulani em tons de laranja, estava longe de imaginar a rejeição por parte do público masculino. Um grupo de pessoas daltónicas queixou-se de que não via as bolas, tanto nos jogos ao vivo como nas transmissões televisivas. Resultado: a bola teve de mudar de cor.
As bolas iriam ser utilizadas nas competições organizadas pela Liga Portuguesa de Futebol Profissional nesta época mas nem chegaram a sobreviver à pré-época desportiva. Para os espectadores daltónicos, o esférico laranja – muito parecido com o vermelho – era confundido com o campo verde.
Após as queixas recebidas na Liga durante o mês de Julho, o organismo contactou o fabricante, que se comprometeu a alterar a cor das bolas. A mudança foi feita a partir de Novembro. As Jabulanis deixaram de ser laranjas para adoptar uma cor bem mais clara: o branco.
O MEU CASO: CARLOS DO CARMO
"VEJO CINZENTO NAS CORES INTERMEDIÁRIAS"
Carlos do Carmo foi um dos primeiros a conhecer o sistema de identificação de cores e a saber da sua aplicação no sistema hospitalar. Isto porque o fadista também é daltónico. "Cores fortes, como o verde, o branco, o preto, o vermelho, o amarelo, o azul, eu distingo. Mas depois há umas cores intermédias em que para mim é tudo cinzento", explicou.
Apesar de enaltecer a implementação do código ColorADD no sistema hospitalar, reconhece que a sua utilização noutras áreas será muito útil. Principalmente no seu caso pessoal, em que precisa de ajuda para combinar as peças de roupa. "Ao longo da vida fui ajudado pela minha mulher em termos de combinação de roupa, uma vez que a minha actividade é pública e tenho que ir para cima de um palco. Imagine o que é eu pôr uma gravata verde com uma camisa cor-de--rosa, vou estragar tudo", contou.
Carlos do Carmo faz parte dos 8% de homens que sofrem de daltonismo. Tal como quase todos os daltónicos, nunca pensou que esta perturbação fosse motivo para investimento. Foi com surpresa e, sobretudo, alegria que soube do código universal criado por um designer português. "Parece-me uma coisa do maior interesse, que está a ser aceite um pouco por todo o Mundo", defendeu. Agora, o essencial, diz, é aplicar o projecto com crianças em idade escolar.
PERFIL
Carlos do Carmo nasceu em Lisboa há 70 anos. É filho de Lucília do Carmo, uma das maiores fadistas do século XX, e de Alfredo de Almeida, livreiro. Começou a sua carreira no fado em 1963. Sofre de daltonismo.
O facto de o sistema de triagem usado nos serviços de Urgências ser feito através de cores e de haver pessoas que não as conseguem distinguir esteve na base da investigação. A solução chegou com o projecto do designer e professor da Universidade do Minho Miguel Neiva. O catedrático inventou um código de cores universal para os daltónicos.
"Pensei em algo que pudesse dar independência aos daltónicos", explica Miguel Neiva. A ideia surgiu em 2000 e destinava-se a uma tese de mestrado. A pouca informação que havia sobre esta perturbação e o objectivo de criar algo que fosse útil aos daltónicos levaram o designer a dedicar sete anos da sua vida à investigação.
Pegou no conceito das cores primárias e criou um símbolo simples que as representasse. Combinando esses três símbolos, obteve os símbolos de todas as outras cores.
O código de cores estava criado mas Miguel Neiva ainda esperou um ano e meio para garantir o reconhecimento e a acreditação da comunidade científica e académica mundial. Em Maio de 2010, o sistema foi finalmente aplicado. Em Dezembro, foi implementado na área da Saúde através do Hospital de São João.
Para já, o código ColorAdd está nas linhas existentes no chão dos corredores do hospital que orientam os utentes para os diversos serviços. Posteriormente, será implementado nas pulseiras de triagem.
No futuro, todos os hospitais públicos com triagem de Manchester irão adoptar este sistema.
O código também já está a fazer sucesso além-fronteiras. Exemplo disso é o interesse demonstrado por um hospital novo de Inglaterra.
Já neste mês, um dos hospitais de Lisboa irá incluir o ColorAdd nos fármacos administrados no seu bloco operatório.
PERFIL
Miguel Neiva criou o sistema de identificação de cores para daltónicos, registado com a marca ColorAdd. É designer e professor na Universidade do Minho. O projecto surgiu da sua tese de mestrado sobre a indústria têxtil. A investigação demorou sete anos, mas já começou a ser aplicada.
DISCURSO DIRECTO
"O CÓDIGO É A SIMULAÇÃO DOS TRÊS CONES DO OLHO": Falcão Reis, Director de Oftalmologia do Hosp. S. João
Correio da Manhã – O que é o daltonismo?
Falcão Reis – É uma anomalia ocular. A discromatopsia, que é o termo científico, é adquirida ou congénita. Esta divide-se em três tipos: confusão entre vermelho e verde, outras tonalidades de vermelho e verde e as várias tonalidades de azul e amarelo.
– Como vê este código de cores?
– O código é muito bem pensado porque se baseia em três símbolos básicos. No olho há três cones: azul, verde e vermelho. O código é a simulação dos três cones.
– Qual a utilidade do código?
– Acho muito útil porque o daltonismo é uma situação muito vulgar e este é o único projecto que existe a nível mundial para ajudar estas pessoas.
TINTAS E LÁPIS COM COLORADD
O código de cores ColorAdd já está a ser utilizado pela empresa de tintas CIN e pela fábrica de lápis Viarco. Os dois exemplos mostram a abrangência da aplicação deste sistema. Tanto pela diversidade de códigos para expressar as diferentes cores e suas tonalidades, como pelo facto de crianças e adultos começarem a assimilar este sistema.
PÚBLICO REJEITA COR DE BOLA
Quando a Adidas criou a bola de futebol Jabulani em tons de laranja, estava longe de imaginar a rejeição por parte do público masculino. Um grupo de pessoas daltónicas queixou-se de que não via as bolas, tanto nos jogos ao vivo como nas transmissões televisivas. Resultado: a bola teve de mudar de cor.
As bolas iriam ser utilizadas nas competições organizadas pela Liga Portuguesa de Futebol Profissional nesta época mas nem chegaram a sobreviver à pré-época desportiva. Para os espectadores daltónicos, o esférico laranja – muito parecido com o vermelho – era confundido com o campo verde.
Após as queixas recebidas na Liga durante o mês de Julho, o organismo contactou o fabricante, que se comprometeu a alterar a cor das bolas. A mudança foi feita a partir de Novembro. As Jabulanis deixaram de ser laranjas para adoptar uma cor bem mais clara: o branco.
O MEU CASO: CARLOS DO CARMO
"VEJO CINZENTO NAS CORES INTERMEDIÁRIAS"
Carlos do Carmo foi um dos primeiros a conhecer o sistema de identificação de cores e a saber da sua aplicação no sistema hospitalar. Isto porque o fadista também é daltónico. "Cores fortes, como o verde, o branco, o preto, o vermelho, o amarelo, o azul, eu distingo. Mas depois há umas cores intermédias em que para mim é tudo cinzento", explicou.
Apesar de enaltecer a implementação do código ColorADD no sistema hospitalar, reconhece que a sua utilização noutras áreas será muito útil. Principalmente no seu caso pessoal, em que precisa de ajuda para combinar as peças de roupa. "Ao longo da vida fui ajudado pela minha mulher em termos de combinação de roupa, uma vez que a minha actividade é pública e tenho que ir para cima de um palco. Imagine o que é eu pôr uma gravata verde com uma camisa cor-de--rosa, vou estragar tudo", contou.
Carlos do Carmo faz parte dos 8% de homens que sofrem de daltonismo. Tal como quase todos os daltónicos, nunca pensou que esta perturbação fosse motivo para investimento. Foi com surpresa e, sobretudo, alegria que soube do código universal criado por um designer português. "Parece-me uma coisa do maior interesse, que está a ser aceite um pouco por todo o Mundo", defendeu. Agora, o essencial, diz, é aplicar o projecto com crianças em idade escolar.
PERFIL
Carlos do Carmo nasceu em Lisboa há 70 anos. É filho de Lucília do Carmo, uma das maiores fadistas do século XX, e de Alfredo de Almeida, livreiro. Começou a sua carreira no fado em 1963. Sofre de daltonismo.
In: Correio da Manhã
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