segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Transitar de ciclo aos 8 anos

Anteriormente era possível completar o 1.º ciclo do Ensino Básico em três anos, menos um do que o habitual, neste momento uma criança com oito anos pode transitar para o 2.º ciclo. Em 2005, a lei estipulava que um aluno só podia deixar o 1.º ciclo com 9 anos, mas, mesmo assim, havia escolas que aceitavam os sobredotados de 8 anos. A mudança mais recente já está publicada em Diário da República. O que permite que os mais pequenos com capacidades de aprendizagem excepcionais e os que entraram na escola com 5 anos possam passar para o 2.º ciclo com apenas 8 anos.

"Cada caso é um caso e mesmo os sobredotados são todos diferentes", avisa a psicóloga Paula Monteiro, que acompanha famílias na resolução de várias problemáticas. Em seu entender, é preciso ter em conta vários factores antes de transitar um aluno de 8 anos para o 2.º ciclo ou retê-lo no 1.º. A maturidade e a estabilidade emocional da criança são duas variáveis que, na sua opinião, têm de ser bem ponderadas antes de se tomar uma decisão.

É necessário, portanto, perceber quais as vantagens e desvantagens para o aluno ao acelerar a sua mudança de ciclo. Segundo Paula Monteiro, mesmo nos casos das crianças com capacidades de aprendizagem excepcionais é preciso analisar bem se é preferível continuar a motivá-las ou se a transição será mais benéfica.

Para a investigadora Maria José Araújo, do Centro de Investigação e Intervenção Educativas da Universidade do Porto, a questão não se pode resumir à idade da criança. A cultura escolar e as experiências dos mais pequenos, o meio onde crescem, o que assimilam, são também importantes neste assunto. "Se as crianças fossem avaliadas pela sua capacidade de brincar, a questão da idade não se colocava", constata. "As crianças não se definem pela sua idade biológica", acrescenta.

Transitar de nível de ensino mais cedo do que o habitual? Para Maria José Araújo esta pergunta não deve ser colocada. "A questão tem essencialmente a ver com o tipo de cultura escolar que temos, com as oportunidades que as crianças têm antes de entrar para a escola e dentro do contexto escolar." Os factores culturais falam mais alto do que os biológicos quando o assunto é concluir o 1.º ciclo em três anos. "Como as crianças são todas diferentes e têm diferentes ambientes e experiências de vida, o que está aqui em causa é a possibilidade de a instituição escolar estar atenta a todas as crianças e às suas especificidades e possibilidades. Se as competências exigidas pela escola para passar de ano ou de ciclo estiverem cumpridas, é bom que isso aconteça", refere.

Os mais pequenos sabem muitas coisas, mas tudo depende das oportunidades que lhes são dadas para evidenciarem o que sabem. "O discurso do 'sucesso' ou do 'insucesso', dos sobredotados ou dos incapazes, enfatiza a natureza das crianças, individualiza as aprendizagens e esquece as questões culturais. Esquece as exigências da cultura escolar e os percursos e conhecimentos das crianças", afirma. A transição de ano ou de ciclo deve, na sua opinião, acontecer quando as crianças estão preparadas para o desafio seguinte.

Amélia Josefina, professora primária há mais de 30 anos, teve dois casos de sucesso. Dois alunos que entraram na escola com 5 anos e que transitaram para o 2.º ciclo antes de fazerem 9 anos. Mesmo assim, a docente considera que normalmente as crianças que entram com 5 anos, e que completam os 6 até Dezembro, são imaturas, notando-se um grau de dificuldade nomeadamente na apreensão de noções de Matemática mais abstractas e que se repercute na interpretação de textos, no Português. Por isso, há algumas reservas nessa passagem antecipada.

No caso dos alunos que sobressaem, que revelem capacidades de aprender acima da média, Amélia Josefina defende que a transição deve ser feita caso os professores considerem que o percurso do aluno assim o justifique. Mas aqui é importante não esquecer apenas os níveis de aprendizagem, mas também ter em consideração a parte emocional. "Os processos devem ser muito bem feitos e analisados", afirma. 
 
In: EDUCARE

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