segunda-feira, 22 de março de 2010

Escolas: cinco exemplos de boas práticas

Arcos de Valdevez - Primeiro compromisso, não aceitar

Há dois anos, o bullying foi tema de uma actividade desenvolvida na disciplina de Área de Projecto na escola EB 2,3 de Arcos de Valdevez.
 
Foi o ponto de partida para a constituição do Clube Mediador, um projecto lançado por dois professores e cuja actividade contribuiu, segundo conta um dos dois docentes responsáveis, Francisco Carvalho, para que o agrupamento de escolas de Valdevez (26 escolas) esteja hoje "muito sensível e atento ao fenómeno". Primeiro compromisso: "Entender o bullying não como um fenómeno natural de qualquer processo de crescimento, mas como um comportamento não aceitável, de discriminação e violento, com consequências gravíssimas para todos os envolvidos." Os alunos foram convidados a fazer trabalhos e cartazes sobre o fenómeno, que foram afixados nas "zona mais problemáticas da escola". Procedeu-se a um diagnóstico, através de inquéritos, disponibilizaram-se documentos, filmes e sites, para os directores de turma usarem nas aulas de Formação Cívica.
 
Criou-se a figura do "padrinho" para os alunos mais novos, do 5º ano, considerado como "o grupo mais susceptível de sofrer com este tipo de violência/agressão".

Desenvolveram-se também actividade lúdicas e desportivas com alunos do 4º ao 12º ano, onde se procurou integrar, "de forma controlada", tanto agressores, como vítimas. Foi ainda criado um blogue e um site (www.bullyingescola.com). (C.V.)

Vagos - Contra a política da avestruz

Quando assumiu funções, em 2007/08, Júlio Castro, director do agrupamento de Vagos, distrito de Aveiro (42 escolas), recusou a política de avestruz. Ao contrário do que ainda é norma, assumiu-se que o bullying existia no agrupamento, ainda que não com muitos casos.

Mas antes de intervir é preciso perceber o fenómeno, estudá-lo, diz. O agrupamento estabeleceu uma parceria com o então professor da Universidade de Aveiro e actual secretário de Estado da Educação, Alexandre Ventura, que delineou as acções de formação desenvolvidas para professores, auxiliares, alunos e pais. Foram adoptados dois planos de intervenção autónomos: um contra o bullying, outro contra a indisciplina. São fenómenos distintos, que exigem soluções diferentes, alerta.

Alunos do 9º ano foram chamados a acompanhar outros mais novos. Foi constituída uma equipa pluridisciplinar que integra docentes e duas psicólogas. A triagem dos casos sinalizados é feita por esta equipa, que propõe também as estratégias para cada situação. Não é só a vítima, mas também o agressor que precisa de ser acompanhado, defende Castro. Em vez da suspensão com proibição de frequência da escola, privilegia-se a realização obrigatória de trabalhos no espaço escolar. Júlio Castro assegura que, no geral, têm conseguido envolver os pais. (C.V.)

Damaia - "Um ninho"

Com 800 alunos, a Escola Dr. Azevedo Neves, na Damaia, situada numa zona problemática, aprendeu a ser "um ninho" para toda a comunidade. "Nem sempre foi assim, mas agora os alunos e as famílias estão conscientes de que a escola os protege e aprenderam os limites da indisciplina", explicou José Biscaia, professor neste estabelecimento de ensino há 16 anos, 13 dos quais como director.

Para isso, a escola repensou a sua organização e adaptou-se à realidade. "Percebemos que o caminho é a profissionalização e cruzámos a escola com empresas onde, desde o 9.º ano, os alunos podem estagiar com um subsídio de 100 a 150 euros. Parece pouco mas representa um terço do rendimento de muitas das famílias." Rita Peixeiro, subdirectora, reconhece que "impor regras exige um trabalho diário com todos" . Os mais velhos, do 11.º e 12.º ano, são responsáveis por apadrinhar os que se estreiam no 5.º ano. "São uma espécie de protectores, de irmãos mais velhos", disse. A escola dispõe de um Gabinete de Apoio Pedagógico que quando um aluno falta muito vai a casa do jovem com uma assistente social. "Temos uma muito boa relação com a junta, a câmara e com a polícia, no sentido de saber o que é que os alunos fazem lá fora para podermos ajudar e prevenir. O nosso lema é agir, o que implica antecipar os problemas, mas se for preciso vamos vê-los à prisão", acrescentou José Biscaia, para quem "o mais difícil é trazê-los para a escola e tirá-los do bairro". (R. B. S.)

Beja - A escola que soube dar a volta

Em Outubro de 2008, o então conselho executivo da Escola Básica 2, 3 de Santa Maria, em Beja, demitia-se em bloco, cansado de gerir situações de conflito marcadas por casos de violência, com agressões de pais a alunos, a professores e outros funcionários.

Domingas Velez, então presidente do conselho executivo e actual directora, considerou a situação insustentável e reclamou o reforço da vigilância e uma outra atitude pedagógica. A primeira decisão, a entrega da segurança da escola a uma empresa privada, revelou-se acertada. A escola contratou um mediador de etnia cigana para facilitar o contacto com as famílias desta comunidade. O segredo está na disciplina, que passou a norma no interior da escola; e no acesso a melhores condições e recursos aplicados tanto no funcionamento do estabelecimento, como na valorização dos conteúdos curriculares. Um aluno do 5ºano da escola, Nuno Figueira, recebeu ontem no Centro Cultural de Lisboa, o primeiro prémio do concurso nacional Faça lá Um Poema promovido pelo Plano Nacional de Leitura. (C. D.)

Algarve - O bullying enquanto peça de teatro

O bullying é como uma peça de teatro: há quem assuma o papel de agressor e há quem seja a vítima. Depois, há a plateia que assiste sem nada fazer para inverter o guião. A Companhia de Teatro do Algarve (ACTA) pegou nesta ideia e baralhou os personagens. Pelo segundo ano lectivo está a visitar escolas algarvias com uma peça interactiva onde os alunos são chamados a experimentar diferentes papéis e a arranjar soluções para a violência.

"Há alguns anos que temos o projecto Teatro para a Educação, através do qual fazemos várias peças sobre sexualidade, toxicodependência... Agora percebemos que o bullying é a nova realidade. Os alunos estão mais indisciplinados e a violência é a única linguagem que conhecem. Mas no fundo só querem que alguém os oiça e se interesse por eles", explicou ao PÚBLICO Elisabete Martins, 31 anos, actriz e vice-presidente da ACTA.

A peça - escrita por docentes e encenada por um professor - pretende que durante hora e meia os alunos imaginem o que é estar na pele do outro. Os actores dão um empurrão e desde a entrada que os maltratam e que lhes respondem à letra. "Os jovens são cada vez mais individualistas e não se preocupam com o outro. É importante perceber que ninguém é uma ilha e que a responsabilidade destes casos é também de quem fica a ver", acrescentou Elisabete.

O grupo de quatro actores (entre os 26 e os 43 anos) que integram o elenco de Bullying apresenta, inicialmente, um episódio com um agressor, uma vítima e dois amigos. Em geral, a peça é vista por cerca de 65 alunos com mais de 14 anos divididos em grupos. Cada grupo escolhe as pessoas que devem ser chamadas a intervir no conflito. Depois, devem representar as figuras seleccionadas que, "normalmente, são o professor, o director da escola, o pai ou a mãe", contou Elisabete.

Por fim, os alunos ficam com a tarefa de imaginar um final positivo e outro negativo para a história. "E o curioso é que o desfecho é semelhante em várias escolas, o que mostra que as crianças sabem o que está certo." (R. B. S.)

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